BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – As Forças Armadas da China iniciaram exercícios militares que simularam um cerco à ilha de Taiwan, neste domingo (13, manhã de segunda-feira no horário local), dias após o presidente do território, Lai Ching-te, falar em discurso anual que não há relação de subordinação entre Pequim e Taipé.
Foram mobilizadas a Marinha, a Força Aérea e a Força de Foguetes, além de outros setores do Exército de Libertação Popular, para movimentos no Norte, Sul e Leste da ilha, além do estreito de Taiwan, com simulações de bloqueio de portos e ataques ao território.
Navios e aeronaves chinesas aproximam-se de Taiwan “de diferentes direções”, com foco em patrulhas para combate no mar e bloqueios de portos e áreas chave, disse o comando do Leste das forças chinesas.
O Ministério da Defesa de Taiwan afirmou que foram envolvidos 17 navios de guerra chineses e 125 aeronaves de Pequim -o maior número de aviões que a pasta detectou operando ao redor da ilha em um único dia.
A administração de Taiwan condenou o que chamou de “ato irracional e claramente provocativo” de Pequim, acrescentando que deixou suas forças de segurança em prontidão.
De acordo com a guarda costeira chinesa, quatro frotas de suas embarcações estavam realizando exercícios de patrulha nas águas ao redor da ilha.
“As ações do Exército de Libertação Popular serão intensificadas a cada provocação de ‘independência de Taiwan’, até que a questão de Taiwan seja completamente resolvida”, afirmou o Ministério da Defesa da China, em comunicado. Pequim declarou que a ação desta segunda já foi completada.
Não foram realizados exercícios com munição real ou áreas de exclusão aérea. Em 2022, pouco depois da visita da então presidente da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, a Taiwan, a China disparou mísseis sobre a ilha.
A ação recente foi condenada pelos governos dos Estados Unidos e de Taiwan, além de aliados ocidentais como o Reino Unido e a União Europeia.
“Pedimos à RPC [República Popular da China] que atue com moderação e evite quaisquer ações adicionais que possam minar a paz e a estabilidade no estreito de Taiwan e na região”, disse o porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller.
Outra autoridade do governo em Washington disse que não há justificativas para pressões do tipo por conta de um discurso de rotina e instou Pequim a evitar novas ações que coloquem em risco a estabilidade no estreito de Taiwan.
O presidente taiwanês prometeu proteger a ilha. “Diante das ameaças externas, gostaria de assegurar aos meus compatriotas que o governo continuará protegendo o sistema constitucional democrático e livre, resguardando a segurança nacional”, declarou ele no Facebook.
A União Europeia, por sua vez, afirmou em um comunicado que as atividades militares aumentam ainda mais as “tensões entre os dois lados do estreito”. O bloco também pediu às partes que se abstenham de ações que possam aumentar ainda mais as tensões.
O discurso de Lai, seu primeiro do chamado “duplo dez”, o dia nacional de Taiwan e referência à data, 10 de outubro, é um dos mais importantes de um presidente da ilha além de seu discurso de posse -esta ocorrida em maio deste ano.
Um mapa foi divulgado pela imprensa estatal chinesa mostrando área de ação no entorno da ilha e dentro do território neste domingo. A operação é chamada de Joint Sword 2024B -a de maio tinha mesmo nome, mas com a letra A no fim, e mapa com zonas semelhantes delimitadas.
Naquela ocasião, Pequim promoveu exercícios parecidos em torno da ilha e usou linguagem parecida à deste ano para se referir a Taipé. Lai e seu partido são vistos como uma força política anti-China, em comparação com outras colorações partidárias da ilha vistas externamente como mais abertas ao diálogo com Pequim.
Segundo um porta-voz do Exército chinês, os exercícios naquela ocasião, que duraram dois dias, eram “uma forte punição pelos atos separatistas das forças de ‘independência de Taiwan’ e um severo aviso contra interferências e provocações de forças externas”.
Desta vez, declaração divulgada fala que “o exercício serve como um severo aviso aos atos separatistas das forças de independência de Taiwan. É uma operação legítima e necessária para salvaguardar a soberania do Estado e a unidade nacional”.
Pequim considera a China continental e Taiwan duas partes de uma única China, motivo pelo qual declarações públicas dos presidentes da ilha são analisadas em cada vírgula e nas entrelinhas pela comunidade internacional.
Análises contam, inclusive, o número de vezes que a declaração menciona o nome República da China, expressão usada pela ilha para se referir a si mesma. (Lai usou o termo 11 vezes, acima das 10 ditas durante sua posse e acima das 7 usadas por Tsai Ing-wen, a ex-presidente, em seu último discurso “duplo dez”.)
Análise do think tank americano Council on Foreign Relations (CFR) indica que o discurso não trouxe qualquer inovação retórica, mantendo a linha discursiva do discurso de posse de Lai e pouco avançando no que a legenda do presidente, o Partido Democrático Progressista (PDP), tem dito sobre a questão.
Trechos do discurso, aliás, pedem cooperação com Pequim em assuntos como a crise climática, o combate a novas epidemias e na própria segurança na região do estreito de Taiwan.
O ponto mais agudo sobre o tema, a negação da subordinação entre Pequim e Taipé, foi repetido por Lai, que já havia usado conceito semelhante em seu discurso de posse; Tsai, a ex-presidente, também já havia mencionado os termos. Lai afirmou ainda que a China não tem direito de representar a ilha.
GUILHERME BOTACINI / Folhapress