SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – No domingo (26), a modelo e apresentadora Ana Hickmann relatou que foi vítima de violência doméstica pelo marido e empresário Alexandre Correa em entrevista ao Domingo Espetacular, da Record. No dia seguinte, os advogados de Correa entraram com duas medidas judiciais contra a apresentadora, como mostrou a coluna Mônica Bergamo.
Na primeira, o empresário acusa a apresentadora de praticar alienação parental porque estaria dificultando a convivência dele com o filho do casal. Na segunda, ele pede a reversão parcial da medida protetiva.
No Brasil, a legislação caracteriza alienação parental quando há interferência na relação quando o pai ou a mãe toma atitudes para colocar o filho contra o outro genitor. O instrumento é defendido por entidades como o Ibdfam (Instituto Brasileiro de Direito de Família), que afirma que ele cumpre uma função pedagógica.
Porém, críticos afirmam que a lei se baseia em conceitos controversos e que estigmatiza mulheres. Isso porque a regra costuma ser usada principalmente por homens que respondem a processos de violência sexual, violência doméstica e falta de pagamento de pensão.
Para Maíra Recchia, advogada especialista em gênero, acusar Ana Hickmann de alienação parental pode ser entendido como uma espécie de violência processual.
“Ele parte para uma litigância abusiva, tentando acusar essa mãe, que é vítima, de uma alegação gravíssima”, diz Recchia. “Entendo que essa alegação de alienação parental é mais uma forma de violência contra ela”, opina.
Desde março deste ano, um relatório desenvolvido pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) denominado “Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero” se tornou obrigatório em todos os tribunais de Justiça do Brasil.
O objetivo é que os tribunais levem em conta, nos julgamentos, as especificidades das pessoas envolvidas, a fim de evitar preconceitos e discriminação por gênero e outras características.
A cartilha aponta que a alienação parental tem sido estratégia utilizada por parte de homens que cometeram agressões e abusos contra suas ex-companheiras e filhos, com objetivo de enfraquecer denúncias de violências e buscar a reaproximacao ou até a guarda unilateral da crianca ou do adolescente.
Para o órgão, é importante que seja desenvolvida uma análise das ações e o depoimento especial do filho menor de 18 anos. O conselho recomenda a escuta protetiva para evitar a indevida revitimização da criança ou do adolescente.
No ano passado, o CFP (Conselho Federal de Psicologia) também emitiu uma nota técnica em relação a lei de alienação parental.
Após constituir um grupo de trabalho para analisar a lei, o CFP afirma que a legislação é baseada em Richard Gardner, um psiquiatra americano, e que o termo alienação parental não está incluído no manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais da APA (Associação Americana de Psiquiatria) e nem no CID (Classificação Internacional de Doenças).
A nota do conselho conclui que a lei criou um ilícito civil com base em um psiquiatra envolvido em polêmicas e acusado, entre outras coisas, de sexismo.
Além disso, pede pela revisão total do seu teor e enumera nove recomendações aos psicólogos em relação à lei. Entre elas, o conselho orienta que o psicólogo não fundamente suas análises e conclusões sobre integrantes da família e de suas dinâmicas com base “no ilícito civil definido pela lei como alienação parental”.
O documento também orienta que, em situações nas quais o psicólogo é requisitado para se manifestar sobre a ocorrência ou não de alienação parental, o profissional deve contextualizar essa demanda e se pronunciar “a partir do campo da psicologia, evidenciando os referenciais teóricos, técnicos e éticos que fundamentam as suas análises e conclusões”.
EMPRESÁRIO NEGA AGRESSÕES
Em entrevista à Mônica Bergamo, o advogado do empresário nega que Alexandre tenha agredido Ana Hickmann e alega que não existe nenhuma prova em relação a isso. Ele ainda afirma que o empresário é a verdadeira vítima, uma vez que a apresentadora usou um canal de TV para chamar o marido de canalha e promover um “massacre contra o empresário”.
“Isso que é coação, isso que é ameaça. Ele está sendo pré-julgado pela sociedade e existe um canal de televisão que dá espaço para que uma mulher destrua uma reputação de uma pessoa. Isso não é justo.”
ISABELLA MENON / Folhapress