Maior fabricante de óculos escuros do mundo quer ser a número um em smart glasses

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ao mesmo tempo em que apertava a mão de Mark Zuckerberg em Milão, Leonardo Del Vecchio tinha outros planos. Em maio de 2022, o fundador do Facebook foi à Itália para negociar com o presidente da EssilorLuxottica uma nova geração de smart glasses.

“É ótimo estar de volta a Milão para discutir planos de smart glasses com Leonardo Del Vecchio e a equipe da EssilorLuxottica”, publicou o dono da Meta, empresa que tem a propriedade também do WhatsApp e Instagram.

A ambição de Del Vecchio era outra. O homem deixado pela mãe em um orfanato aos sete anos, que depois construiria uma empresa bilionária, achava que o mercado de óculos inteligentes teria de ser seu. Ele morreu pouco mais de um mês depois, aos 87 anos. Mas a ideia continuou viva.

Se a EssilorLuxottica é a maior fabricante de óculos de grau e de sol do mundo, por que não pode também ser a número 1 em smart glasses?

“Pode ser um caso interessante. Uma empresa com a experiência que tem, com o tamanho de mercado que domina, com a base de clientes que possui, pode, com tais atributos, conquistar mercados ainda não explorados com o atual desenvolvimento de tecnologia tanto no hardware quanto no software”, afirma José Carlos Cavalcanti, professor e fundador do Grupo de Finanças Digitais da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).

Com essa ideia na cabeça, a EssilorLuxottica criou, em parceria com a Escola Politécnica de Milão, ainda em 2022, um laboratório para desenvolver novas tecnologias para smart glasses. O acordo, válido até 2027, conta com 100 pesquisadores. O objetivo é combinar tecnologia digital com bioengenharia, física e inteligência artificial.

A empresa de origem italiana possui parceria com a Meta desde 2021 para fabricação de óculos inteligentes vendidos na loja da Ray-Ban, uma das marcas que pertencem à EssilorLuxottica. Mas ela quer, como projetou Del Vecchio, andar com as próprias pernas. Todo o resto já tem: desenvolve, distribui e vende seus produtos por meio de subsidiárias.

Fundada em 1961, em Agordo, na região italiana do Vêneto, a Luxottica tem propriedade de 14 marcas de óculos. Também os fabrica para Chanel, Prada, Armani, Versace, Dolce & Gabbana, Burberry, Michael Kros, Bulgary, Ralph Lauren, Tiffany & Co e Valentino, entre outros.

Quando a Luxottica se fundiu com a francesa Essilor, em janeiro de 2017, foi criada a maior empresa do setor no planeta. O faturamento no ano passado foi de 25,4 bilhões de euros (R$ 138,8 bilhões pela cotação atual). Abriu 30 centros de pesquisa com cerca de mil pesquisadores. Tem a seu dispor uma rede global de distribuição.

“Entendo como um objetivo estratégico da empresa. É uma afirmação [a ideia de ser a líder em smart glasses] também com um componente de divulgação e marketing, visando impacto. Uma das incertezas é a aceitação pelo consumidor. No passado, o Google Glass enfrentou dificuldades também por causa da privacidade. Gravar áudio e vídeo sem a anuência das pessoas pode ser um problema”, afirma José Mario De Martino, professor doutor da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Unicamp.

Ele cita iniciativa mal sucedida da Google que também teve participação da EssilorLuxottica. Mas o fracasso não fez a fabricante de óculos desistir porque, assim como Google e Meta, ela também quer ser uma gigante de tecnologia.

As big techs carregam grandes ambições para os óculos de realidade aumentada, na crença de que um dia eles possam substituir os telefones celulares e tirar fotos, gravar vídeos, atender e fazer chamadas e utilizar aplicativos dos mais diversos.

Todas tentam, por caminhos e tecnologias diferentes, desenvolver e analisar componentes eletrônicos, algoritmos que recolham, processem dados e os ofereçam utilizando realidade aumentada. A EssilorLuxottica também almeja isso. Mesmo que, por enquanto, não seja para todos.

O próprio Leonardo Del Vecchio disse, ao firmar a fracassada parceria com a Google, em 2014, que não conseguia se imaginar usando smart glasses.

“Somos mais de 8 bilhões de habitantes neste planeta. Mais de 5 bilhões já têm dispositivos móveis, mais de 5 bilhões já acessam a Internet, e mais de 4 bilhões são usuários ativos de mídias sociais. O mercado para dispositivos tecnológicos que acessem tais redes de conectividade e de informação é muito grande. Este experimento da Luxottica é um ‘cabelinho de sapo’ neste vasto mundo digital/tecnológico”, completa Cavalcanti,

A EssilorLuxottica quer se dedicar especialmente à tecnologia em que os óculos tenham aparelhos para pessoas com moderada perda de audição. Estima-se que sejam 1,5 bilhões pessoas no mundo com esse problema. O dispositivo, imperceptível, eliminaria o estigma do aparelho visível colocado na orelha.

“As informações disponíveis indicam uma forte preocupação das empresas com a qualidade do áudio, tanto na reprodução quando na captura. Nesses óculos, além da captura de imagem, vídeo e áudio temos também a apresentação de imagens e vídeos na própria lente dos óculos, permitindo a fusão de imagens reais com imagens sintéticas. Ainda há desafios técnicos a serem vencido para a melhoria da qualidade do produto final, mas o potencial é claro. Este será o futuro”, finaliza De Martino.

RAIO – X

EssilorLuxottica

Fundação: 1961 (Luxottica) e 1972 (Essilor)

Fusão: 2018

Arrecadação em 2023: 25,4 bilhões de euros

Lucro líquido em 2023: 2,3 bilhões de euros

Funcionários: cerca de 145 mil

Principais marcas próprias: RayBan, Oakley, Varilux, Sunglass Hut, Persol

Marcas que possui licença para fabricar óculos: Versace, Prada, Ralph Lauren, Michael Kors, Armani, Dolce & Gabbana, Coach New York e Tory Burch

ALEX SABINO / Folhapress

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