SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Desde o nome, a banda britânica Black Country, New Road carrega camadas de autoironia que são a cara da geração Z. O título do grupo veio de uma página randômica da Wikipédia, obtida a partir de um gerador de artigos aleatórios.
O som -um rock temperado com saxofones, violinos e flautas- feito por por seis integrantes de vinte e poucos anos segue na mesma toada, com uma pilha de referências mais ou menos obscuras como Slint, Billie Eilish, Arcade Fire, Joanna Newsom e Brahms.
Mas o real mérito do grupo é que, com pouco tempo de existência e já liderando um burburinho na cena londrina, ele foi obrigado a se reinventar, resultado da saída repentina do vocalista e principal letrista Isaac Wood. Na véspera do lançamento do segundo álbum de estúdio da banda, “Ants From Up There”, de 2022, ele deixou a banda, alegando estar sob excessiva pressão pela fama.
Segundo o baterista Charlie Wayne, a saída de Wood foi um sinal vermelho para a banda. “Ser músico é um trabalho incrível, mas pode ser muito estressante. Quando você está na estrada, em turnê, por seis semanas e fazendo shows todo dia enquanto viaja em uma van, pode ser difícil e as pessoas quebram. Vale a pena ter consciência disso”, diz, em entrevista por Zoom.
A solução encontrada foi delegar o fardo de ser o “front man”. Logo depois do lançamento do segundo álbum de estúdio, o Black Country, New Road abandonou todas as músicas feitas com o antigo vocalista e começou a compor, às pressas, novidades que segurassem o repertório das turnês que estavam agendadas. A partir dali, o vocal não estava mais centralizado em uma figura única.
“Gostaríamos de fazer um show em que alguém possa falar que não quer cantar dez minutos antes de subirmos no palco e que, mesmo assim, tenha um set com músicas interessantes e boas.”
Os dois álbuns da banda foram abandonados nas performances ao vivo do grupo -fãs brasileiros que esperam ouvir algo de “For the First Time” ou “Ants From Up There” no domingo de C6 Fest podem se preparar para algo diferente. “A última coisa que queríamos era tentar emular o estilo do Isaac [Wood], seria uma perda de tempo”, afirma Wayne.
A preocupação é válida. O vocal de Wood é profundo e rasgado quando ele canta, mas ele passa boa parte do tempo falando -característica de algumas bandas da nova cena de Londres como Black Midi e Dry Cleaning, que também vem para o C6.
Com essa voz de quem recita um poema, Wood entoava letras que viraram quase piadas internas entre a banda e os fãs, caso de “Science Fair”, em que Wood canta que o grupo é o segundo melhor tributo ao Slint, banda de pós-rock dos anos 1980 fonte de onde o Black Country, New Road bebeu a goladas no primeiro álbum, “For the First Time”. Chovem referências contemporâneas, caso de “Good Will Hunting”, em que se canta uma paquera que “tinha o estilo da Billie Eilish”.
Mas a saída de Wood não deixa um buraco no grupo -muito pelo contrário. A reinvenção rápida rendeu uma gravação ao vivo “Live at Bush Hall”, gravado em três dias só com inéditas. A canção de abertura “Up Song”, com saxofone bem-humorado e pianinho festivo, parece o encerramento de um -ótimo- musical adolescente.
“Veja só o que fizemos juntos, BCNR amigos para sempre”, cantam, vestidos com roupas de baile de formatura. Era, segundo Wayne, inicialmente uma piada, mas, com um fundo de verdade, traduziu o sentimento da banda de encerrar um capítulo.
BÁRBARA BLUM / Folhapress