Elo de Boulos com MTST vira ponto de tensão e atiça adversários de 2024

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A ligação do deputado federal Guilherme Boulos (PSOL) com o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) se tornou um ponto de tensão para o pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, com insinuações de rivais sobre uso eleitoral e embates do grupo com Ricardo Nunes (MDB), que busca a reeleição.

Tanto o atual prefeito quanto o deputado federal Ricardo Salles (PL) elevaram as críticas ao movimento de moradia. Para desgastar o psolista, o ex-ministro do Meio Ambiente compara as invasões do grupo às praticadas pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).

Relator da CPI do MST instalada na Câmara, Salles afirmou em entrevista à Folha que “o MTST é a versão urbana do MST” e que a comissão pode investigá-lo também.

“Nada nos impede de analisar esses exemplos, que são análogos ao MST […]. Acho que é legítimo mostrar o que esse grupo [MTST] faz nas cidades. Os brasileiros querem saber qual é a coincidência de comportamento e de procedimentos entre o que se faz no campo e as invasões nas cidades”, disse.

Boulos, por sua vez, afirmou que Salles “quer fazer uso eleitoreiro da CPI, quer usar a CPI de palco para viabilizar a candidatura dele em São Paulo”.

Hoje Boulos é considerado o candidato favorito por estrategistas de Salles e de Nunes —adversários que travam uma disputa paralela para enfrentar o esquerdista no segundo turno. Além dos três postulantes, são cogitadas as candidaturas dos deputados federais Tabata Amaral (PSB) e Kim Kataguiri (União Brasil) e do apresentador José Luiz Datena (PDT).

Boulos, que tem o apoio do presidente Lula (PT), é líder do MTST desde 2002. O elo já tinha sido explorado contra o psolista na eleição de 2020, quando chegou ao segundo turno contra Bruno Covas (PSDB). Seus aliados dizem que ele jamais renegará o grupo, mas que cada um tem uma agenda própria.

Os problemas se intensificaram nas últimas semanas, primeiro com um acampamento montado na frente da prefeitura em protesto contra Nunes e depois com ações da GCM (Guarda Civil Metropolitana) em um centro de distribuição de comida do MTST na região da praça da Sé.

O grupo iniciou a manifestação diante do gabinete de Nunes em meados de março para reclamar do descumprimento de um acordo envolvendo a Vila Nova Palestina, área ocupada pelo MTST na zona sul e que é alvo de um pedido de desapropriação para a construção de moradias populares.

O prefeito, que nega ter assumido o compromisso e afirma que o terreno está em zona de proteção ambiental, reagiu dizendo existir viés político-partidário por trás do ato. “Eu não vou cair nessa”, declarou, ao falar em utilização de movimentos para pautar o debate eleitoral.

O representante do MTST devolveu o ataque, dizendo que o prefeito confunde seu papel de administrador com o pleito de 2024. Segundo Boulos, o acordo sobre a Nova Palestina foi firmado com Covas e reiterado por Nunes e setores da prefeitura. Além disso, diz que o projeto respeita a legislação ambiental.

Neste mês, o MTST apontou indícios de retaliação com a ida de guardas municipais a uma unidade do projeto Cozinha Solidária onde são preparadas marmitas para pessoas em situação de rua. As doações só foram permitidas após uma inspeção da Vigilância Sanitária, que não encontrou irregularidades.

O movimento disse que a GCM estava indo ao local nas semanas anteriores, com intervenções cada vez mais constrangedoras e agressivas, e afirmou ser uma “desumanidade atroz impedir que pessoas com fome sejam alimentadas”.

Outro tema de embate entre Boulos e Nunes é a questão dos moradores de rua. O psolista chegou a acionar o Ministério Público para impedir que a prefeitura retire barracas na região central.

O MTST afirma haver cerca de 50 mil pessoas nessa condição na capital, com base em levantamento do Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua, enquanto a prefeitura contabiliza cerca de 30 mil.

Aliados de Nunes afirmam que a ação da Vigilância Sanitária, com o acompanhamento da GCM, foi corriqueira e que o MTST cria narrativas para arranhar a prefeitura. A ordem é não cair em provocações.

Assim como Salles, o time do prefeito deve explorar a ligação entre o MTST e Boulos de forma negativa, apontando problemas ambientais e até de criminalidade em acampamentos do movimento.

Baderna e depredação também devem ser associadas às invasões em contraposição à gestão de Nunes, que será apresentada como ponderada e segura, prezando pela ordem e pelo respeito.

De toda forma, auxiliares do prefeito acreditam que o MTST não deve estimular manifestações e fechamento de vias no período eleitoral para evitar a acusação de que semeia o caos.

Salles, que deseja concorrer com o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), recorre ao MTST para tentar colar na imagem de Boulos a pecha de extremista e radical. Diz, por exemplo, que o adversário ganhou projeção política com desordem e “invasão de propriedades privadas e públicas”.

O movimento contesta mensagens do tipo, afirmando que ocupa imóveis abandonados e, em geral, sem função social. Rebate também a versão recorrente de que o grupo cobra aluguel das famílias.

Assessores que orientam Salles na pré-campanha sugeriram que o deputado, como relator da CPI do MST, aproveite o momento de visibilidade das ações dos sem-terra para fazer uma vinculação com o suposto risco representado pelo movimento coordenado por Boulos.

A estratégia é insinuar que, caso o deputado do PSOL vire prefeito, os sem-teto ficarão fortalecidos e se sentirão livres para promoverem na cidade invasões semelhantes às ocorridas no campo.

Para aliados de Boulos, a tentativa do que chamam de criminalização do movimento de moradia terminará frustrada, assim como ocorreu na eleição de 2020. A previsão é que o deputado defenda o MTST dos ataques e responda com explicações que ajudem a humanizar o grupo.

Segundo Josué Rocha, que é da coordenação do MTST e trabalha como assessor no gabinete parlamentar de Boulos, a fala de Nunes sobre o viés político do acampamento em frente à prefeitura é refutada pelo fato de que o grupo fez protestos contra governantes de diferentes posições, da direita à esquerda.

“O movimento tem uma relação de pressão com o poder público. Isso é normal. Tentam misturar as coisas como uma forma de criminalizar o movimento e atacar suas lideranças, mas são instâncias diferentes”, diz.

Rocha afirma estranhar a ação da GCM na Cozinha Solidária, pois diversas organizações também distribuem alimentos na região e não sofrem abordagens do tipo.

O coordenador diz que a tentativa de atingir Boulos por meio do MTST em 2020 foi infrutífera e que o ritmo de ocupações é dissociado do calendário eleitoral. “As ações não são feitas visando um desgaste eleitoral. O MTST se pauta unicamente pela luta por moradia.”

JOELMIR TAVARES E CAROLINA LINHARES / Folhapress

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