Juíza Gabriela Hardt fica sem remoção e permanece na Vara da Lava Jato em Curitiba

CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) – A juíza federal substituta Gabriela Hardt não conseguiu a remoção para uma Vara em Florianópolis e, com isso, permanecerá na 13ª Vara de Curitiba, onde estão abrigados os processos remanescentes da Operação Lava Jato.

Ela tinha feito inscrição em maio para um concurso de remoção, que é organizado pelo Conselho de Administração do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região).

Hardt tem substituído o juiz titular da 13ª Vara de Curitiba, Eduardo Appio, desde 22 de maio, devido ao afastamento temporário dele sob suspeita de ter praticado infrações disciplinares.

A negativa de transferência de Hardt ocorreu, de acordo com o TRF-4, porque outros juízes tiveram prioridade, em função do critério de antiguidade. No total, 28 juízes substitutos ligados ao tribunal (que abriga a Justiça Federal do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul) conseguiram a remoção e passarão a atuar em novas unidades a partir de 19 de junho.

Na Vara responsável pela Lava Jato, a juíza é substituta, termo que se refere não à condição de suplente ou “reserva”, mas ao estágio na carreira de magistrado. Os casos da operação estavam sob responsabilidade de Appio, que é juiz titular.

Hardt atua nos processos da operação em situações de férias ou ausência. Ela chegou a conduzir os casos da Lava Jato temporariamente entre 2018 e 2019, após Sergio Moro abandonar a magistratura, e se mostrou alinhada com as teses do hoje senador.

A juíza, por exemplo, expediu a sentença que condenou Lula à prisão na ação penal do sítio de Atibaia (SP), decisão que dois anos mais tarde foi anulada pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

O pedido de remoção feito pela juíza se deu em um contexto de conflito com Appio, que havia assumido em fevereiro e que manteve o tom crítico contra autoridades que já tinham passado pela mesma cadeira, como Moro e a própria Hardt.

Durante os quase quatro meses em que permaneceu no comando dos processos da Lava Jato, Appio fez constantes críticas à atuação da dupla em seus despachos e, em uma das suas decisões, apontou “parcialidade” de Hardt para justificar o desbloqueio de bens e valores ao empresário Márcio Pinto de Magalhães em um processo derivado da operação.

Em despacho assinado em 26 de março, Appio iniciou dizendo que a defesa do acusado pedia novamente a revogação das medidas restritivas sob o argumento de que a juíza Hardt já teria demonstrado “animosidade para com os acusados nos processos, bem como suposta associação com membros do Ministério Público Federal que atuavam neste processo”.

Na sequência, Appio afirmou que os diálogos juntados ao processo –obtidos no bojo da Operação Spoofing, que apura o hackeamento de mensagens trocadas entre autoridades da Lava Jato no Telegram – eram suficientes para identificar que a defesa tinha razão no seu pedido.

“Através da transcrição destes diálogos, percebe-se que pode ter existido, de fato, uma associação entre a douta juíza substituta do feito e os integrantes da chamada força tarefa do MPF, de maneira a colocar a acusação em condições mais favoráveis do que a defesa”, escreveu Appio.

Em um longo despacho, ele falou que a imparcialidade do juízo da causa é “a pedra angular das garantias fundamentais dos cidadãos previstas na Constituição de 1988” e que, sem isso, “todos os cidadãos poderiam estar sob o jugo de um Estado policialesco”.

Mesmo após o afastamento de Appio, Hardt se manteve inscrita no concurso de remoção.

No dia 23 de maio, ao assumir os casos, a juíza começou a movimentar um processo relacionado à colaboração premiada do doleiro Alberto Youssef e que pode trazer consequências para toda a Lava Jato.

Trata-se de um requerimento da defesa de Youssef, protocolado em abril, no qual se pede acesso integral às investigações sobre o caso do aparelho de escuta ambiental encontrado em 2014 na cela do doleiro na Polícia Federal, em Curitiba.

Antes do afastamento, Appio já havia acolhido o pedido da defesa do Youssef, e parte das investigações da PF sobre a escuta ilegal já está com os advogados do doleiro. Mas a defesa ainda aguarda material, como os próprios áudios captados da cela.

Conforme revelado pela Folha de S.Paulo no mês passado, o objetivo da defesa de Youssef é obter prova “para avaliação da voluntariedade e espontaneidade da colaboração com eventuais reflexos na validade do acordo de colaboração” do doleiro.

O doleiro foi o principal alvo da etapa inicial da Lava Jato, em 2014, e meses depois firmou um dos primeiros acordos de colaboração da operação, no qual acusou políticos e empreiteiras. Eventual quebra do acordo pode ter desdobramentos para toda a investigação.

CASO TONY GARCIA

No início deste mês, Hardt também entrou com uma representação criminal contra o empresário e ex-deputado estadual Tony Garcia por crime contra a honra.

Garcia disse que, em depoimento à juíza em 2021, contou que foi obrigado a gravar pessoas de forma ilegal a pedido de procuradores da República e do ex-juiz Sergio Moro após firmar acordo de colaboração premiada em 2004. Mas, segundo Garcia, a magistrada não teria tomado providências.

As supostas ilegalidades teriam sido narradas por Garcia durante uma audiência na qual ele tentava convencer a juíza de que a rescisão do seu acordo de delação era injusta.

O conteúdo do seu relato foi enviado ao STF somente em abril deste ano, por decisão de Appio.

O acordo de delação foi rescindido pela juíza no final do ano passado, mas Garcia ainda recorre.

Ao entrar com a representação criminal contra ele, Hardt também se afastou dos casos, justificando sua suspeição para seguir com os julgamentos envolvendo o empresário.

CATARINA SCORTECCI / Folhapress

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