Tarcísio enfrenta crises e aliados insatisfeitos com atuação política em 2º plano

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Enquanto relega sua atuação política a segundo plano e busca escapar de polêmicas, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), acabou cercado por crises, aliados insatisfeitos e problemas de articulação que transpareceram nos últimos dias.

Tido como uma opção da direita em 2026, caso seu padrinho Jair Bolsonaro (PL) esteja inelegível, Tarcísio evita se colocar no palanque antecipadamente, como fez seu antecessor João Doria, e planeja a princípio concorrer à reeleição.

Embora esteja engajado em uma manobra política delicada, a de acenar ao mesmo tempo para o bolsonarismo e para o centro, o governador se dedica mais a temas de gestão, como obras e concessões, do que à articulação com partidos e parlamentares –algo terceirizado para o experiente Gilberto Kassab (PSD), secretário de Governo e Relações Institucionais.

Segundo seus auxiliares, o foco do governador deve ser a entrega de promessas, o que acaba fomentando a carreira política de toda forma. Sempre que pode, Tarcísio exalta o caráter técnico de seu secretariado.

A tática, no entanto, é criticada por deputados e dirigentes partidários, que cobram cargos e influência no governo, além de postura mais incisiva de Tarcísio na militância da direita e nas disputas políticas —afinal sua cadeira tem peso nacional.

Não passou despercebido entre a bancada bolsonarista que o governador se colocou no campo da centro-direita na convenção do Republicanos, no fim de abril. Em entrevista à GloboNews no último dia 2, afirmou novamente estar na centro-direita, mas se identificou também como bolsonarista.

Interlocutores do governador já preveem que a eleição na capital paulista, no ano que vem, vai obrigá-lo a descer do muro e escolher entre Ricardo Salles (PL) e Ricardo Nunes (MDB). Partidários de Salles apontam que Tarcísio sinalizou que apoiará o deputado, seguindo Bolsonaro, mas o Republicanos apoia Nunes —o que deve criar uma saia justa para o governador.

Na Assembleia Legislativa de São Paulo, que Tarcísio visitou institucionalmente pela primeira vez em 2 de maio (Doria fez sua primeira visita à Casa em fevereiro), deputados dizem que falta diálogo, informações sobre projetos e liderança de governo.

Até agora, Tarcísio não enviou projetos de difícil aprovação, que exijam uma base robusta.

Mesmo insatisfeitos com Tarcísio nos bastidores, membros do PL e do Republicanos afirmam que irão defender o governo paulista em público atendendo à orientação de Bolsonaro, que quer proteger seu ex-ministro de fogo amigo.

Na semana passada, a queixa foi em relação ao projeto do governo para aumentar o salário de policiais –um aceno de Tarcísio a sua base eleitoral. Antes da atuação de deputados da bancada da bala, a ideia do governo era enviar um só texto para todas as categorias.

Além disso, deputados aliados não tiveram acesso à proposta e acabaram surpreendidos com o artigo que aumenta o valor de contribuição de aposentados. A bancada da bala teve que dar explicação a seus eleitores e se reuniu com o governador, que prometeu alterar a medida.

Ainda na visão de bolsonaristas, Tarcísio tem sido tímido ao atacar o governo Lula (PT) e defender Bolsonaro. Mas, mesmo hesitando em adentrar no ringue político, o governador acaba contratando embaraços, como o da última quarta (3).

No dia em que Bolsonaro era alvo de uma ação da Polícia Federal por suspeitas de adulteração no cartão de vacina, Tarcísio lançava um programa de combate à corrupção. No fim do evento, o governador saiu sem falar com a imprensa —nem defendeu o ex-presidente nas redes.

Tampouco quis responder, no dia 2, sobre a eventual demissão do secretário Lucas Ferraz, cuja pasta afirmou em nota que a empresa ucraniana Antonov teria desistido de um investimento de US$ 50 bilhões no Brasil após falas de Lula sobre a guerra.

Dias antes, na segunda-feira (1º), Tarcísio esteve ao lado de Bolsonaro na Agrishow. O ex-presidente criticou as demarcações de terras feitas por Lula, e Tarcísio afirmou que invasores de terras irão para a cadeia.

A expectativa de parlamentares bolsonaristas era a de que Tarcísio viajasse a Ribeirão Preto (SP) um dia antes, no domingo (30), para recepcionar o ex-presidente no aeroporto e participar da aglomeração de apoiadores, mas o governador compareceu apenas ao compromisso de governo na feira agrícola.

No sábado (6), Tarcísio também faltou ao evento do PL Mulher, com Bolsonaro e Michelle.

Em entrevistas à imprensa, quando provocado, Tarcísio distribui críticas a Lula. À revista Veja o governador disse que o petista não tem plano para o Brasil. Na GloboNews, disse considerar mais grave a viagem de João Pedro Stedile, líder do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), à China na comitiva de Lula do que a ida de Bolsonaro à Agrishow.

Já nos bastidores, Tarcísio trabalha para manter uma boa relação com o governo federal. Quando Lula lhe telefonou no fim de abril, o governador buscou esclarecer as duas crises recentes que colocaram em lados opostos o governo paulista e os ministros do petista.

Eles falaram sobre o caso Antonov, que levou ministros a acusarem Ferraz, secretário de Negócios Internacionais, de fabricar fake news. E, segundo afirmou à GloboNews, Tarcísio também disse a Lula que o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, deveria ir à Agrishow apesar da presença de Bolsonaro.

Ainda na entrevista, Tarcísio afirmou não estar “preocupado em derrotar a esquerda”, mas em “fazer a diferença”.

O estilo moderado em relação a Bolsonaro, que usou o mandato como palanque para promover a agenda da extrema direita, envolve cálculo eleitoral e jurídico. Enquanto o cerco do ex-presidente se fecha em investigações que vão de fraude na vacina a incentivo golpista, Tarcísio busca manter distância segura de seu padrinho e admite erros.

“As pessoas ficaram magoadas com o [ex-]presidente por algumas declarações, questões que envolveram pandemia, debate de urnas”, disse à GloboNews.

Por outro lado, políticos que convivem com Tarcísio dizem que ele compartilha da visão de mundo de Bolsonaro e permanece fiel ao ex-presidente. Aliados do governador afirmam ser natural que ele busque expandir seu eleitorado rumo ao centro.

Mesmo deputados bolsonaristas admitem que, mais importante do que seguir uma cartilha, é que Tarcísio mantenha o apoio da população e de Bolsonaro.

Auxiliares do governador afirmam que os papéis de ora encampar o bolsonarismo e ora acenar a Lula não são incompatíveis e que Tarcísio sabe se mover nesse terreno. Parlamentares lembram que ele não teria trabalhado em três governos distintos, Dilma Rousseff (PT), Michel Temer (MDB) e Bolsonaro, se não tivesse traquejo político.

CAROLINA LINHARES / Folhapress

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