SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O pintor Frank Walter sentiu-se empolgado ao desembarcar no porto de La Guaira, na Venezuela. Era o início dos anos 1960 e pela primeira vez em quase uma década, ele, um homem negro, não via a si mesmo como inferior ou superior a nenhuma outra pessoa.
O artista havia passado todo esse período vivendo na Europa e no Reino Unido, onde viveu em primeira mão o racismo institucional de ambos os lugares. A intenção de Walter era estudar agricultura e tecnologia, e ele já havia acumulado experiência como administrador no serviço público agrário de Antígua e Barbuda, seu país de origem. Entretanto, os únicos trabalhos que conseguiu foram de faxineiro e outras posições relegadas à classe operária.
Por outro lado, foi durante essa fase que Walter se descobriu como artista. Morto em 2009 aos 82 anos, Walter é hoje um dos nomes mais badalados do circuito de galerias internacionais.
Além da pintura, a obra dele ainda abrange a escultura, a escrita -com textos autobiográficos, sobre política e estética e poemas, entre outros-, composições musicais e registros de voz em áudio. O acervo do antíguo-barbudês soma 5.000 pinturas, mil desenhos, 600 esculturas, 2.000 mitografias, 468 horas de gravações e 50 mil páginas de escritos.
Em meio a todo esse arquivo, a exposição Frank Walter, na galeria Fortes D’Aloia & Gabriel, em São Paulo, dedica-se às paisagens pintadas pelo artista após viver na Europa e voltar à ilha de Antígua e Barbuda -e assim o apresenta ao Brasil. Se estivesse vivo, conta o curador Tiago Mesquita, o pintor teria adorado finalmente ver o seu trabalho exposto em um país por cujo continente ele nutria tanto carinho.
“Ele idealizava a América do Sul como uma promessa, por causa da paisagem deslumbrante e da gentileza dos sul-americanos com quem ele cruzou na viagem de retorno à ilha”, diz Mesquita. O artista imaginava o nosso continente como lugar em que as relações interpessoais amistosas de Antígua e Barbuda se davam em escala bem maior.
“Isso se reflete nas percepções dele sobre a paisagem de forma geral, e sobretudo como a luz banha tudo isso. Ele tentou encontrar uma poética de pintar paisagens do ponto de vista específico afrodescendente caribenho”, diz.
O mar gigantesco que separava Walter, na ilha, de vários outros países e pessoas repercutiu nas inspirações -o que se vê nos cenários rurais, marítimos e imaginários que ele retrata, por vezes dialogando com outras formas de arte, como a gravura japonesa.
As paisagens são lindas e vastas, mas Walter as pintou em quadros minúsculos, às vezes com a tela na palma da mão ou apoiada na perna, usando pincéis de pelos milimétricos. Walter carregava as obras diminutas em um baú junto com ele em viagens. Uma das peças expostas mede 24 por 20 centímetros -e foi pintada em um pedaço de papelão como suporte. Outras paisagens foram feitas sobre papel fotográfico e embalagens.
“Esses suportes contém informações de usos anteriores, são instrumentos de lembranças, o que nos leva a fazer divagações, influencia a interpretação das obras”, afirma Mesquita.
Ele assina a curadoria com a historiadora da arte Barbara Paca, da Universidade Maryland, nos Estados Unidos. Ela é uma espécie de embaixadora da obra de Walter -foi Paca que o apresentou ao mundo na Bienal de Veneza de 2017, com uma retrospectiva.
Desde então, Walter tem causado frisson por onde passa. A obra dele já passou por cidades como Londres, Nova York, Edimburgo, Frankfurt e Bruxelas. Walter, hoje, é um “artist’s artist”, isto é, um artista influente admirado por outros, diz Mesquita.
FRANK WALTER
Quando Até 20 de abril. Ter. a sex., das 10h às 19h; sáb. 10h às 18h
Onde Fortes D’Aloia & Gabriel – r. James Holland, 71
Telefone 11 33923942
Preço Grátis
Classificação Livre
Link: https://fdag.com.br/
CAIO DELCOLLI / Folhapress