SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Voar de São Paulo a Dubai, da Austrália aos Estados Unidos e do Canadá à Argentina sem se desconectar da internet pode ser realidade em breve.
A empresa americana Viasat lança na noite desta quarta-feira (26) o satélite ViaSat-3 Americas, voltado para internet banda larga via satélite. O lançamento acontece no Kennedy Space Center, na costa leste da Flórida.
Este será o primeiro dos três satélites de produção própria que a empresa lançará nos próximos meses. A constelação terá uma cobertura quase global, com o objetivo de conectar parte dos 2,7 bilhões de pessoas desconectadas ou com má conexão à internet no mundo, segundo a empresa.
O primeiro ViaSat-3 está previsto para ser enviado a uma órbita geoestacionária em uma janela de lançamento de 1h, que abre às 20h29 (horário de Brasília). O satélite cobrirá todo o continente americano e deve entrar em operação no mercado brasileiro no segundo semestre.
A internet via satélite é uma forma de conexão que beneficia regiões distantes de grandes centros ou com pouca infraestrutura de telecomunicações. Nessas áreas, internet móvel e fibra óptica ou não existem ou são de qualidade inferior.
Na internet a cabo, mais comum em grandes centros, as trocas de dados entre provedor e usuário são feitas por terra e mar. Nos satélites, a conexão é feita pelo ar, com antenas e receptores, como internet móvel e TV, mas a frequências maiores. A banda Ka, na qual o ViaSat-3 opera, compreende as frequências de 27 GHz a 40 GHz.
Leandro Gaunszer, diretor-geral da Viasat Brasil, afirma que um dos principais avanços dessa nova geração de satélites é a possibilidade de realocação do sinal. Isso significa que, se uma área tiver uma melhoria na conectividade, o satélite pode se concentrar em uma outra região, de demanda maior.
O artefato vai suceder o ViaSat-1 e o ViaSat-2, lançados em 2011 e 2017. O primeiro cobre apenas os EUA, enquanto o segundo chega até a linha do Equador. Juntos, têm capacidade de cerca de 500 Gbps.
Agora, cada ViaSat-3 tem capacidade de banda de 1 Tbps cerca de 1.000 Gbps, o maior do mundo nesse quesito. O investimento, não divulgado, está na casa das centenas de milhões de dólares.
No Brasil, 70% da capacidade do satélite voltada para o país vai ser destinada às regiões Norte e Centro-Oeste. A Viasat, contudo, não divulgou qual será a fatia brasileira do 1 Tbps do ViaSat-3 Americas.
“A maioria dos outros satélites priorizam a região costeira do Brasil, que é a mais populosa. No nosso caso, focamos na região que tem menor penetração de banda larga”, disse Gaunszer.
“É onde tem uma demanda reprimida grande e onde poucas ou quase nenhuma empresa oferece conectividade. Existe uma dificuldade muito grande de instalar internet para o cliente dessa região”.
A empresa está presente no Brasil desde 2018, quando firmou um contrato de dez anos com a Telebras para usar parte do satélite SGDC-1, lançado um ano antes. Sua capacidade é de 58 Gbps, cerca de 5% do ViaSat-3, e opera em 22,4 mil pontos no país sob o programa WiFi Brasil, voltado para áreas remotas.
Enquanto o WiFi Brasil oferece pontos de acesso de até 20 Mbps, a conexão pelo ViaSat-3 atingirá até 100 Mbps. A taxa é similar à velocidade média de banda larga no país, de 106 Mbps, segundo o Speedtest Global Index.
Com essa velocidade, por exemplo, é possível baixar um filme em FullHD em menos de cinco minutos. A 20 Mbps, fazer o download do mesmo tipo de arquivo leva cerca de 20 minutos.
“Muitas vezes a gente pensa na velocidade, mas para a maioria dos serviços que o cliente utiliza, velocidades de dez, 15 Mbps são suficientes. Estamos acostumados com 200, 500 Mbps, mas metade desse público que a gente atende hoje nunca teve uma banda larga em casa. É uma mudança substancial”, disse Leandro Gaunszer.
No campo, uma das regiões mais visadas pela empresa, conexões por fibra óptica ou cabo mais estáveis e com maior velocidade, estão presentes em 39% dos domicílios, ante patamar de 64% nas cidades, segundo pesquisa do Cetic.br divulgada em 2022.
O cliente brasileiro que assinar o serviço da Viasat a partir do segundo semestre não saberá se estará conectado ao SGDC ou ao ViaSat-3. Ele será alocado a um dos satélites de acordo com sua localização e necessidades de velocidade e tamanho da franquia.
Com o lançamento dos outros dois ViaSat-3 e o alcance global da internet via satélite, voos internacionais com conexão estável serão mais frequentes. Além disso, a Viasat trabalha com a aplicação do conceito “always-on” (sempre ativo, em inglês) para dispositivos móveis: mesmo onde não houver sinal, haverá internet.
SATÉLITE SERÁ LANÇADO POR FOGUETE DE ELON MUSK
O satélite da Viasat dividirá os holofotes da noite com o foguete que lhe dará carona para o espaço. Curiosamente, o portador será o Falcon Heavy, da SpaceX, empresa que possui sua própria divisão de internet via satélite, o Starlink.
O lançamento ocorre pouco mais de cinco anos depois de sua estreia, em fevereiro de 2018. Na ocasião, o fundador da SpaceX, Elon Musk, era visto mais como um visionário do mercado espacial do que como o bilionário que não sabe como lidar com uma rede social de US$ 44 bilhões.
Este será o sexto lançamento do Falcon Heavy desde então, e o primeiro em que os três propulsores não serão recuperados, um dos principais chamarizes da empresa. O custo de voos do tipo (expendable) é estimado em US$ 150 milhões.
Diferente dos satélites geoestacionários da Viasat, os satélites da Starlink são de baixa altitude. São posicionados a cerca de 550 km e têm cobertura menor, exigindo milhares de unidades para cobrir o planeta.
Apesar da complexidade da operação, a baixa altitude permite que a velocidade de troca de dados entre usuário e satélite (latência) seja menor quando comparada ao serviço da concorrente.
“Existe mercado para ambos, com prós e contras em cada tecnologia”, disse Leandro Gaunszer, diretor-geral da Viasat Brasil.
O Starlink está no Brasil desde o ano passado, quando Elon Musk veio ao Brasil para promover seu lançamento. Na ocasião, o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro e o bilionário anunciam uma parceria para um programa já em funcionamento, o mesmo WiFi Brasil operado pela ViaSat e Telebras.
“A entrada de um concorrente de peso como a Starlink não faz a gente render menos, faz o mercado crescer. Pelos dados que temos, são mais de 13 milhões de casas no Brasil sem conexão, então tem espaço para todo mundo. Não vemos problemas com a concorrência, desde que ela siga as mesmas regras e normas que nós temos que cumprir”, afirma Gaunszer.
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O jornalista viaja a convite da Viasat
GUSTAVO SOARES / Folhapress