SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Por suspeita de “ilegalidades” e “manipulação do quorum”, o Ministério Público de Santa Catarina pede a anulação da assembleia de credores que aprovou o plano de recuperação judicial da Chapecoense.
Com data do último dia 26 de abril, a solicitação, assinada pela promotora Marta Fernanda Tumelero, aponta indícios de “aliciamento indevido” de credores como funcionários, jogadores e ex-atletas com créditos inferiores a R$ 10 mil. O Ministério Público aponta que essas pessoas não não poderiam participar da votação. Uma delas foi incluída na lista de credores com valor de R$ 0,00. Mesmo assim, teve direito a voto.
Felipe Lollato, advogado do escritório responsável pela recuperação judicial, não concorda com o Ministério Público e afirma que a visão da Chapecoense vai prevalecer.
Apesar da oposição da maioria dos familiares das vítimas da tragédia de 2016 quando o avião que levava a equipe para a Colômbia caiu, matando 71 pessoas e dos credores com mais dinheiro a receber, o plano de recuperação judicial foi aprovado no início de março deste ano.
As dívidas do clube estão em cerca de R$ 110 milhões.
Em 14 de junho de 2020, a Chapecoense assinou documento comprometendo-se a quitar 26 ações contra o clube abertas por herdeiros das vítimas. A agremiação deu como garantia de pagamento sua verba de sócio-torcedor. O acordo foi firmado na secretaria de execução do Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina.
Pelos primeiros 12 meses, seriam destinados R$ 250 mil por mês às famílias. Do 13º ao 24º mês, o valor passaria a ser de R$ 350 mil. Depois disso, voltaria a ser R$ 250 mil. O dinheiro seria repassado pela própria Chapecoense.
Com o tempo, sete casos tiveram a indenização quitada e foram encerrados. Sobraram 17. Em dezembro de 2021, uma família não recebeu a parcela. A partir de janeiro de 2022, ninguém foi pago.
No plano de recuperação, a Chapecoense pediu desconto de até 85% para pagar as dívidas que tem com as famílias das 71 vítimas da tragédia. Propôs que os depósitos sejam feitos ao longo de 13 anos. A equipe deixou de pagar as indenizações. Em resposta, os familiares pediram que imagens dos atletas fossem retiradas do site e dos imóveis da instituição.
O plano encontra oposição dos representantes das famílias e de viúvas algumas dizem estar passando por dificuldades financeiras. A Chapecoense sempre afirmou que a alternativa à recuperação judicial era o time de futebol, maior fonte de receita da agremiação, encerrar as atividades.
Pelo relatório do MP, 206 credores trabalhistas votaram a favor do plano de recuperação judicial e 68 foram contra. Os 206 a favor representam 1,43% da dívida da Chapecoense. Os 68 que se opuseram são os destinatários de 98,57% do que o clube tem a pagar.
“Dessa forma, é evidente que os credores com créditos incluídos na subclasse dos créditos trabalhistas até R$ 10 mil não poderiam ter votado na AGC [Assembleia Geral de Credores], tampouco ser computados para fins de verificação de quorum, haja vista o impedimento legal previsto no dispositivo supracitado”, diz a promotora.
À reportagem, a Chapecoense disse que não se pronunciaria sobre o processo. Felipe Lollato disse considerar normal a manifestação do Ministério Público, mas afirmou acreditar que a teoria de que os credores com menos de R$ 10 mil não podem votar “não existe”.
“Eu acho que a tese do clube é a vencedora e a mais balizada. Os credores até R$ 10 mil perderem direito a voto não existe. Eram R$ 10 mil há não sei quanto tempo. Este valor foi corrigido. O que diz a lei é que isso procede se não há alteração na condição do contrato. Não é o caso de vencimentos futuros, como acontece neste caso”, disse o advogado.
O Ministério Público também considerou “curioso” o fato de muitos credores terem sido representados pelos mesmos advogados, “alguns causídicos em aparente conflito de interesses”, já que representam também a Chapecoense em outros processos. Também questiona que vários credores não conseguiram comprovar a dívida a receber e vários deles foram incluídos na lista um dia antes da assembleia geral.
ALEX SABINO / Folhapress