RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Na rotina do delegado Alesandro Barreto, 49, há momentos de vibração por ter ajudado a “salvar vidas” após ações que desarticularam possíveis ataques e de tensão com o monitoramento constante nas redes sociais, em busca de ameaças às escolas.
Barreto, que é delegado há 23 anos, coordena o Ciberlab (Laboratório de Operações Cibernéticas) dentro do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O laboratório apoia as polícias estaduais na investigação de crimes cibernéticos, de extorsão à exploração sexual.
O trabalho da equipe se ampliou devido à onda de violência nas escolas, com as redes sociais sendo usadas para incitar discurso de ódio. Como parte da Operação Escola Segura, de combate aos atentados, o Ciberlab monitora publicações na internet e repassa os achados às polícias civis estaduais para prevenir novas ocorrências.
Nas últimas duas semanas, a operação ajudou a prender ou apreender 357 envolvidos em ameaças ou ataques às instituições de ensino, o que leva algum alívio a Barreto e sua equipe.
Com a rotina de trabalho intensa, o delegado não guarda elogios ao falar sobre o grupo, a quem chama de “heróis anônimos”. Ele diz que os policiais precisam estar atentos a uma enxurrada de conteúdos online, o que, muitas vezes, exige turnos extra.
“Uma postagem extremista, carregada de conteúdo de ódio, não ocorre em momentos predeterminados, mas, sim, a qualquer hora. A maioria dos policiais trabalha mesmo em momentos de descanso.”
O delegado dedicou a carreira à tecnologia e segurança pública. Por 11 anos, foi diretor de inteligência da Secretaria de Segurança do Piauí e, depois, trabalhou com inteligência de dados na Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos durante os Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio, em 2016.
A experiência o levou à coordenação do Ciberlab em 2017, ano de fundação do laboratório. O delegado, que é também professor de inteligência de segurança pública na Academia de Polícia Civil, diz que a equipe está sempre aprendendo sobre diferentes contextos da internet, em que mudanças são frequentes.
Segundo Barreto, detalhes como a metodologia de monitoramento e os envolvidos nos atentados não devem ser divulgados para garantir a segurança da investigação.
“As técnicas jamais podem ser expostas, porque os criminosos também acompanham as notícias. Alguns deles querem aparecer, e não podemos dar notoriedade.”
Ele afirma que a parte mais difícil do trabalho é lidar com o material gráfico de violência, particularmente nas investigações sobre abuso sexual. Nesses casos, mesmo os profissionais mais experientes atuam por tempo limitado por estarem expostos a um conteúdo que o delegado descreve como perturbador.
“Os policiais, que também são pais e mães, veem coisas horríveis, das piores que já vi na vida. Mas, quando identificam os criminosos, crianças são protegidas.”
O laboratório conta com uma equipe de profissionais especializados no universo virtual, que entendem desde o funcionamento de aplicativos até as políticas de privacidade e termos de uso das redes sociais.
Durante a operação nas escolas, a relação do governo com essas plataformas ficou estremecida. Segundo Barreto, a cooperação das big techs melhorou ao longo do mês, mas ainda pode crescer. A maior preocupação é com a moderação de conteúdo, já que algumas das redes alegam estar obedecendo às suas políticas de uso ao permitir que o usuário reproduza a violência.
“A pessoa não pode ter a foto de perfil de um criminoso e achar que isso é liberdade de expressão. Há empresas que dizem que o termo de uso é mais importante do que qualquer coisa, mas não é. As vidas precisam ser protegidas”, afirma.
Em reunião realizada pelo Ministério da Justiça no início de abril, o Twitter se recusou a excluir conteúdo com apologia da violência nas escolas, mas passou a colaborar com o governo pouco depois, de acordo com o ministro Flávio Dino.
Na última quarta-feira (26), a Justiça Federal suspendeu o uso do Telegram no Brasil. A decisão foi motivada pela falta de colaboração da empresa com as investigações sobre ataques às escolas, uma vez que o Telegram não atendeu aos pedidos da Polícia Federal de entregar informações sobre conteúdo de apologia da violência.
Além do trabalho de entidades federais e empresas, o delegado Alesandro Barreto defende o papel da educação familiar em conscientizar sobre os perigos da internet. Isso porque crianças e adolescentes têm sido alvo de grupos extremistas, provocando violência nas escolas.
“Em alguns casos, os pais só descobrem o que os filhos estavam fazendo na internet depois do cumprimento de um mandato de busca e apreensão. Conversar com as crianças sobre o que elas fazem na internet pode ajudar a antecipar sinais e entender que é um problema”, declara.
Mesmo fora do laboratório, o delegado dedica parte do tempo para alertar sobre crimes cibernéticos. Nas redes sociais, ele auxilia usuários que foram hackeados a recuperarem a conta e dá dicas sobre como se proteger contra golpes online.
“Quando for bom demais para ser verdade, desconfie. Infelizmente, as pessoas são enganadas porque acreditam muito [no que recebem]. Mas o melhor remédio é a informação.”
LUANY GALDEANO / Folhapress