Como Vânia Mignone traz o universo da publicidade e das HQs para suas pinturas

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma figura feminina se repete em diversas pinturas de Vânia Mignone expostas agora no Instituto Tomie Ohtake. Numa das telas, a mulher aparece dormindo sobre uma cama roxa; em outra, assume o papel de Iraci, “a maior acrobata do mundo”, enquanto numa terceira sua presença é evocada pelos dizeres “engasgada pelo tempo que não passa”, embora sua imagem esteja ausente.

Esta personagem, que frequentemente veste preto e tem uma expressão melancólica, acompanha o espectador no decorrer do percurso da mostra “De Tudo se Faz Canção”, que revê cerca de 25 anos de produção da pintora e gravadora em 81 obras expostas no centro cultural paulistano.

A mulher que aparece nas obras da artista há muitos anos não tem uma história, um nome. “Ela funciona mais como um elemento plástico, um símbolo quando eu preciso de uma energia mais feminina. Eu procuro não pensar nada sobre ela, quem é, o que é, por que é assim ou assado, não importa”, diz Mignone, em entrevista por telefone.

A artista afirma que a mulher é derivada —assim como uma figura masculina presente em algumas telas— do universo das histórias em quadrinhos, uma paixão sua que informa diversas obra da exposição, a exemplo de uma pintura do tamanho de um mural dividida em seis quadrados, como se ali dentro se desenvolvesse uma narrativa.

Outro universo referenciado nos trabalhos é o da publicidade, a primeira formação de Mignone antes de se dedicar às artes visuais. Isto aparece na escala de outdoor de algumas obras e, mais claramente, com o uso de frases que lembram anúncios, a exemplo da tela que anuncia “a maior acrobata do mundo”. Há uma coesão entre imagem e palavra.

Mignone não pinta sobre tela, mas, sim, sobre placas de madeira, que vai juntando conforme os desenhos se desenvolvem para deixá-los maiores ou menores, de acordo com o que sua imaginação determina —não há esboço prévio, segundo a artista. Ela usa bastante tinta preta, no que diz ser uma herança da xilogravura, técnica a que mais se dedicou durante a faculdade de artes.

Na mostra pode-se ver também alguns trabalhos inspirados pelas crises do presente, embora nenhum deles seja óbvio ou panfletário. “Certezas derretidas”, diz uma obra feita durante a pandemia, enquanto o grande painel na entrada do espaço expositivo apresenta uma paisagem triste que faz referência ao sofrimento dos povos indígenas e traz uma personagem chamada Iracema, nome de origem Tupi.

Mignone tem carreira estabelecida no cenário das artes, já tendo feito diversas exposições em galerias e em espaços institucionais importantes, como o Museu de Arte Contemporânea da USP e a Bienal de São Paulo. Ela também já ilustrou livros —há no Tomie Ohtake seus desenhos para uma edição de “Dom Quixote— e fez a capa de um disco de Nando Reis.

Embora não seja óbvio para o espectador, a música é outra referência forte em seu trabalho. Nascida no final da década de 1960 numa família de musicistas, a artista passou a infância e a adolescência ouvindo LPs de Elis Regina, Milton Nascimento, Chico Buarque, Maria Betânia e Caetano Veloso. Na exposição sua paixão pelos bolachões aparece numa série de pinturas para capas de álbuns imaginários.

“O que eu gostaria que a pessoa sentisse [ao ver minhas pinturas] é uma vibração próxima do que eu sentia com a música popular brasileira”, ela afirma.

VÂNIA MIGNONE – DE TUDO SE FAZ CANÇÃO

Quando Até 4 de junho; de ter., a dom., das 11h às 20h

Onde Instituto Tomie Ohtake – r. Coropés, 88, São Paulo

Preço Grátis

JOÃO PERASSOLO / Folhapress

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