A Rússia recebeu ordens para interromper sua invasão da Ucrânia pela Corte Internacional de Justiça (CIJ), o mais alto tribunal da Organização das Nações Unidas (ONU), nesta quarta-feira, 16, em uma decisão preliminar cujo significado é muito mais simbólico.
A Ucrânia iniciou o caso na Corte em Haia para contestar a explicação oficial do presidente russo, Vladimir Putin, de entrar no país como um esforço para acabar com um “genocídio” de separatistas pró-Rússia.
O tribunal votou por 13 a 2 a favor de ordenar que a Rússia “suspenda” as operações militares na Ucrânia e impeça que forças armadas comandadas ou apoiadas por Moscou tomem medidas adicionais. Dos dois juízes da oposição, um era da Rússia e o outro da China.
“A Federação Russa deve suspender imediatamente as operações militares iniciadas em 24 de fevereiro de 2022 em território ucraniano”, declarou o juiz-presidente da CIJ, Joan Donoghue. “A Corte está bem ciente da magnitude da tragédia humana na Ucrânia e está profundamente preocupada com o uso da força russa, que levanta problemas muito sérios de direito internacional”.
O presidente ucraniano, Volodmir Zelenski , comemorou no Twitter o que chamou de uma “vitória completa neste caso contra a Rússia” e que “ignorar a ordem isolará ainda mais a Rússia”.
Limitações da Corte
Mas, embora a ordem preliminar do tribunal seja, em teoria, obrigatória sob a lei internacional, não havia sinais de que Moscou cumpriria. Nenhum representante russo apareceu quando a Ucrânia discutiu seu caso na semana passada. Posteriormente, eles apresentaram um documento afirmando que o tribunal não tinha competência para decidir o caso.
“O governo da Federação da Rússia respeitosamente solicita à Corte que se abstenha de indicar medidas conservatórias e retire o caso de sua pauta”, declarou Moscou. O pedido foi rejeitado.
A Rússia acrescentou que não compareceu perante os magistrados porque não teve tempo suficiente para se preparar. E que a invasão na Ucrânia era um ato de “legítima defesa”.
A CIJ não parece ter um caminho viável para fazer cumprir a decisão. Sanções só poderiam ser impostas pelo Conselho de Segurança da ONU, do qual a Rússia é membro permanente e onde tem poder de veto.
A missão do tribunal é resolver disputas entre nações soberanas, e não pode acusar presidentes ou líderes militares de crimes de guerra, por exemplo. Diferentemente do Tribunal Penal Internacional (TPI) que julga pessoas e líderes de nações.
“Se uma das partes do conflito está ignorando os princípios básicos da lei, há uma questão sobre a utilidade de invocar tal lei em relação a essa parte quando você não tem um forte poder de aplicação”, disse Yuval Shany, especialista em direito internacional da Universidade Hebraica de Jerusalém.
Atendendo ao pedido de Kiev, a CIJ, criada em 1946 para resolver disputas entre Estados, decidiu decretar medidas de emergência, conhecidas como conservatórias, para ordenar à Rússia a suspensão imediata das operações militares.
Mas Shany acrescentou que uma decisão ainda pode ter “algum valor”, por exemplo, desmascarando a explicação russa para a invasão.
‘Pretexto de ‘genocídio’
Os procedimentos se concentram na explicação oficial da Rússia para a invasão da Ucrânia, que Putin, disse ter como objetivo alcançar a “desnazificação” da Ucrânia e acabar com um “genocídio” no leste do país. Não há evidências que suportem as alegações russas.
Representantes da Ucrânia argumentaram na semana passada que as acusações russas representavam um pretexto para uma invasão ilegal.
Em sua ordem desta quarta, o tribunal não se pronunciou diretamente sobre os fatos do caso e tampouco se comprometeu a dizer se um genocídio estava ocorrendo, mas afirmou que a Ucrânia estava “recorrendo a um direito que é plausível sob a Convenção de Genocídio”. Não impor medidas preliminares agora causaria “danos irreparáveis” às pessoas, disse o tribunal.
Há precedente para tal julgamento provisório, mesmo que o réu não compareça. Em 1984, a Nicarágua ganhou uma decisão semelhante perante a CIJ contra os Estados Unidos por seu financiamento e apoio aos rebeldes que buscavam derrubar o governo nicaraguense.
Os Estados Unidos se recusaram a participar do processo, argumentando que a CIJ, um dos componentes fundadores do sistema das Nações Unidas, não tinha jurisdição. Mas depois bloqueou a aplicação do Conselho de Segurança da ONU, recusando-se a pagar a compensação ordenada à Nicarágua.
No caso atual, a Ucrânia argumentou que o tribunal tem jurisdição porque tanto a Rússia quanto a Ucrânia assinaram o tratado de 1948 sobre a prevenção de genocídio.
Antes do início do processo, o presidente da Corte pediu ao ministro das Relações Exteriores da Rússia, há duas semanas, que “agisse de tal maneira” que uma ordem judicial – incluindo uma que pudesse ordenar que a Rússia suspendesse as hostilidades – possa “ter seus efeitos apropriados.”
Em quase três semanas de conflito, mais de três milhões de pessoas fugiram da Ucrânia. Vladimir Putin, garantiu nesta quarta-feira que a invasão russa foi “um sucesso”, enquanto Zelenski lançou um novo apelo por ajuda perante o Congresso dos EUA, em plenas negociações sobre uma possível neutralidade ucraniana.
(COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
Agência Estado