BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Após pressão, invasão de reunião e protestos por sua instalação, a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) mista do 8 de janeiro sofreu um esfriamento mesmo antes do início e, dez dias após a sua criação, ainda não tem uma data definida para ser instalada de fato.
De um lado, partidos mais alinhados ao governo vão ocupar a maioria das cadeiras e argumentam haver temas bem mais relevantes a se tratar do que um acontecimento que é objeto de extensa apuração da Polícia Federal, Ministério Público e Judiciário.
De outro, oposicionistas, que serão minoria na comissão, já afirmam considerar a CPI do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) como potencial foco mais promissor de desgaste do governo.
Nesta sexta-feira (5), o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), deu o aval para o andamento da CPI mista ao responder às questões de ordem apresentadas pela oposição que, em tese, vinham adiando sua abertura.
Na decisão, Pacheco confirmou duas manobras que ajudam Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a ter maioria a seu favor no grupo.
Atualmente, a base de Lula espera ter 21 dentre as 36 vagas na comissão as indicações partidárias oficialmente ainda não foram feitas.
Foi a oposição quem, majoritariamente, brigou pela instalação da CPI mista no Congresso.
No dia 18 de abril, quando a base governista conseguiu uma manobra para adiar, pela segunda vez, a leitura do requerimento da comissão, deputados como Nikolas Ferreira (PL-MG) e Bia Kicis (PL-DF) chegaram a invadir uma reunião de líderes do Senado para protestar.
O cenário mudou um dia depois, com a revelação das imagens das câmeras internas do Palácio do Planalto pela CNN, o que resultou no pedido de demissão do então ministro do Gabinete de Segurança institucional, general Gonçalves Dias.
O governo, então, não só passou a apoiar a CPI, mas manobrou para garantir maioria no grupo.
Sob reserva, parlamentares avaliam que, com uma oposição sem força e um governo preocupado com outras batalhas no Congresso, a CPI perde importância e pode demorar para ser instalada oficialmente, além de ter chance de se tornar inócua.
A expectativa é que os membros da CPI sejam indicados na próxima semana e sua instalação aconteça na outra, mas já há quem admita que o grupo nasce sem importância ou que pode, até, não nascer.
Reflexo disso, a escolha dos postos de relator e presidente não tem gerado muita disputa no momento.
Como mostrou a coluna Painel, do jornal Folha de S.Paulo, mesmo Renan Calheiros (MDB-AL), um dos poucos nomes da base do governo que, desde o início do ano, defendia a criação da comissão, vem dando sinais de que não tem mais interesse na relatoria, cargo que chegou a postular.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), está em viagem ao exterior até a próxima quinta-feira (11), o que também contribui para que nenhuma decisão aconteça até lá.
Líderes da Casa defendem ainda que a instalação da comissão ocorra após o debate sobre o novo arcabouço fiscal, matéria considerada prioritária pelo governo e por parlamentares evitando que ele seja contaminado pela disputa política da CPI.
Na Câmara, deputados de oposição começam a focar seus esforços na CPI do MST.
“Para mim ela [a CPI do 8/1] vai ser midiática mais do que ter resultado prático. Acho que a do MST vai ter mais destaque, porque CPI é um instrumento de oposição. E lá [na do 8/1] é governo. Então esquece, isso não é CPI. Ali [na do MST] o pau vai cantar. Ali vai ser CPI”, afirma o deputado Sóstenes Cavalcanti (PL-RJ), um dos principais líderes da oposição e da bancada evangélica na Câmara.
Já no Senado, Rogério Marinho (PL-RN) indica que irá apostar em parlamentares declarados independentes para tentar dar maior tração à comissão mista.
“As assinaturas foram recolhidas, o fato comprovado é público e notório, há uma disposição da nossa parte, da oposição, desde o início [para que ela aconteça] e uma resistência exacerbada do governo federal para que ela não ocorresse”, afirmou Marinho.
“Vamos fazer a nossa parte para que não haja desculpa para que ela não seja instalada”, completou, dizendo que seria uma “catástrofe do ponto de vista legal” sua não realização.
O senador Otto Alencar (PSD-BA) entende que, enquanto a CPI da Covid era necessária em razão da falta de ação de outras instâncias do Estado, no caso dos atos golpistas a polícia e o Judiciário já estão atuando efetivamente.
“Minha opinião é que ela perdeu espaço e tempo para ser instalada. Estamos aguardando os principais defensores da CPI, os lideres da oposição, e me parece me houve um arrefecimento”, afirmou.
Já o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), que foi contra a instalação da CPI em um primeiro momento, mantém o discurso de que a investigação tem potencial de afetar justamente a oposição, e não o governo.
“Muita gente que estava muito afoita para fazer a CPI não está tão afoita quanto estava antes”, disse o petista.
JOÃO GABRIEL, RANIER BRAGON E VICTORIA AZEVEDO / Folhapress