SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Duas das maiores frentes parlamentares setoriais do Congresso Nacional vão atuar em conjunto para demandar tratamento diferenciado para os setores do agronegócio, comércio e serviços na reforma tributária.
As frentes são grupos que reúnem pelo menos um terço dos membros do Poder Legislativo (mínimo de 198 parlamentares, entre deputados e senadores) de vários partidos em torno de um tema. É comum que um mesmo parlamentar faça parte de mais de um grupo. Por isso, os membros das frentes podem representar os interesses de mais de um setor da economia.
Com mais de 300 representantes no Congresso, a FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária) afirma que uma alíquota diferenciada no novo tributo sobre o consumo é só uma das várias demandas do grupo. Esse é também um dos pontos defendidos pela FCS (Frente Parlamentar em Defesa do Comércio e Serviços), que reúne mais de 200 congressistas.
A Frente Parlamentar Mista da Indústria, setor que tem apoiado mais ostensivamente a reforma, deve ser instalada nos próximos dias. Ela será presidida pelo deputado José Rocha (União-BA), que também é vice-presidente da FPA.
Até 2022, havia uma frente parlamentar dedicada à reforma tributária. Seu presidente, o ex-deputado Luis Miranda (Republicanos-DF), não se reelegeu e, até o momento, não foi formado um grupo em defesa dessa pauta.
As frentes dos setores agro e de serviços avaliam que, neste momento, não é possível apoiar a reforma no formato das duas propostas apresentadas nos últimos quatros anos, embora concordem que é necessário simplificar o sistema.
Um novo texto está sendo elaborado pela Câmara para ser apresentado neste semestre, prevendo alíquotas diferenciadas, conforme indicação do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), relator da proposta.
Os dois grupos já preparam sugestões para alterar esse relatório e, caso não sejam atendidas, prometem tentar mudar o texto no plenário de votação.
“Estamos com o propósito de fazer em breve um grande encontro promovido pela FPA e pela FCS simultaneamente, em que vamos buscar unificar as nossas pautas, em relação principalmente à reforma tributária. Estamos falando de uma força bem expressiva que representa ampla maioria do Congresso Nacional”, diz o deputado Domingos Sávio (PL-MG), presidente da FCS e um dos vice-presidentes da FPA.
“Como ainda não temos um novo texto, continuamos trabalhando com a posição de que não temos condições de nos manifestar favoráveis [à reforma].”
Entre os entraves apontados pelas frentes está o receio de que haverá aumento de carga tributária para esses setores em benefício da desoneração da indústria.
“A gente entende que precisa melhorar o sistema tributário, precisa simplificar. Agora, da maneira que está, os números que nos apresentaram são assustadores. Comércio, serviços e agro seriam extremamente prejudicados. Precisamos entender se estamos ou não equivocados”, afirma Pedro Lupion (PP-PR), presidente da FPA, citando estudos encomendados pelo setor.
“Não queremos ser do contra. Queremos achar um caminho em que seja possível avançarmos juntos. Hoje, pelo que tem apresentado, não é possível.”
O governo federal ainda não divulgou dados sobre o impacto da reforma tributária. O que há até o momento é uma guerra de números apresentados por vários setores e especialistas, com resultados divergentes.
O deputado José Rocha (União-BA), presidente da frente da indústria e vice-presidente da FPA, também afirma que há muitas arestas para serem aparadas nas discussões sobre a reforma. “Ainda não está muito bem alinhado com os diversos segmentos da economia. Então fica difícil colocar para votar”, afirma o parlamentar, que destaca que o grupo ainda não se reuniu para fechar uma posição em torno do tema.
Os parlamentares lembram que os membros de uma frente não têm a obrigação de seguir a orientação do grupo e que, na hora do voto, pesam mais a orientação partidária e os acordos com o governo.
O presidente da FPA afirma, no entanto, que há muitas preocupações comuns a todos os membros do grupo. Uma delas é a possibilidade de a devolução do imposto (cashback) da cesta básica não alcançar todos os que necessitam. A manutenção da isenção para cooperativas e a necessidade de pejotização dos produtores rurais são outras questões em aberto, mas não as únicas.
“No caso do integrador de frango, por exemplo. Quem vai pagar o imposto? Quem entrega a ração ou quem engorda o frango? Isso ninguém conseguiu responder ainda. São particularidades que estão presentes na nossa cadeia que é diferente de você tratar de uma indústria”, afirma o deputado.
“A gente está falando do Brasil real, do pequeno produtor que não tem a mínima condição nem conhecimento para fazer uma nota fiscal, um CNPJ, buscar uma profissionalização ou transformação em MEI.”
Há também a desconfiança entre os parlamentares de que o governo quer promover um aumento da carga tributária sobre o consumo. Para o presidente da FCS, isso pode gerar dividendos políticos ao Executivo, que terá mais recursos para gastar em políticas públicas, mas representa um desgaste que não será absorvido pelo Parlamento.
“No geral, o deputado representa um conjunto da sociedade em que você tem todos esses setores produtivos presentes. Se um estiver sendo prejudicado, a cobrança vai vir em cima do deputado. Aquele que votar a favor de aumento de imposto vai ter muita dificuldade de se explicar na sua base”, afirma o deputado Domingos Sávio.
EDUARDO CUCOLO / Folhapress