Relator fortalece ministérios do centrão e desidrata política ambiental de Lula

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O relator da medida provisória da reorganização da Esplanada dos Ministérios e líder do MDB na Câmara dos Deputados, Isnaldo Bulhões Jr. (AL), empoderou em seu parecer pastas comandadas por partidos do centrão, desidratando a política ambiental do presidente Lula (PT).

Competências de órgãos que atualmente estão na estrutura dos ministérios do Meio Ambiente, do Desenvolvimento Agrário e dos Povos Indígenas serão transferidas para outras pastas.

As mudanças ocorrem em meio a uma queda de braço entre os próprios ministros de Lula após veto à exploração de petróleo na foz do rio Amazonas, com apoio da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede).

O relatório foi apresentado nesta terça-feira (23) em sessão da comissão mista que analisa a MP (medida provisória). Houve pedido de vista coletivo, e o texto voltará a ser discutido e votado na quarta (24). Há uma pressão pela celeridade da apreciação da matéria, uma vez que ela perderá a validade no próximo dia 1º e ainda precisa passar por votações na Câmara e no Senado.

Segundo o texto, o Ministério das Cidades, comandado por Jader Filho (MDB-PA), passará a ficar responsável por sistemas de informações que, pela MP de Lula, estavam na alçada de Marina. São eles: Sinisa (Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico), Sinir (Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos) e Singreh (Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos).

Também está prevista a transferência da gestão da ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico), hoje com o Meio Ambiente, para o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional. A pasta é comandada por Waldez Góes —apesar de ser do PDT, ele foi uma indicação de parlamentares da União Brasil.

O relatório de Isnaldo ainda transfere o CAR (Cadastro Ambiental Rural), instrumento para controlar terras privadas e conflitos em áreas de preservação, do ministério chefiado por Marina para o da Gestão e Inovação em Serviços Públicos.

O órgão é considerado importante por gerenciar a fiscalização de crimes ambientais em propriedades rurais, como grilagem e desmatamento.

Parlamentares ligados à pauta ruralista defendiam a transferência do CAR para o Ministério da Agricultura —retomando a estrutura do governo Jair Bolsonaro (PL). O relator nega ter considerado essa hipótese, apesar de emendas apresentadas por parlamentares nesse sentido.

Alvo de disputa entre ruralistas, a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) também deverá ter suas competências desmembradas.

Sob o governo Bolsonaro, o órgão estava vinculado à pasta da Agricultura, atualmente comandada por Carlos Fávaro (PSD). Com a MP original, editada por Lula no início do governo, ela foi transferida para o Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, chefiado por Paulo Teixeira (PT).

Segundo a reportagem apurou, o deputado não retirou a Conab do Desenvolvimento Agrário, mas transferiu parte de suas competências de volta à Agricultura.

O relatório deve passar para a pasta de Fávaro as seguintes funções: produção e divulgação de informações dos sistemas agrícolas e pecuários; e comercialização, abastecimento, armazenagem e garantia de preços mínimos.

Na alçada de Teixeira, deverão permanecer competências como os sistemas locais de abastecimento alimentar, compras públicas de produtos e alimentos da agricultura familiar.

Em outra frente, o texto de Isnaldo deve esvaziar atribuição da pasta dos Povos Indígenas ao transferir a demarcação de terras indígenas para o Ministério da Justiça. Com isso, ele atende em partes a um pleito da bancada ruralista, que queria essa responsabilidade fora do ministério chefiado por Sônia Guajajara (PSOL-SP).

Pelo texto do emedebista, caberá à pasta dos Povos Indígenas a defesa e a gestão das terras e territórios já demarcados.

À Folha de S.Paulo Isnaldo reiterou que não irá incorporar em seu relatório o texto da MP que extingue a Funasa (Fundação Nacional de Saúde) e transfere suas atribuições para os ministérios das Cidades e da Saúde. Ele incluiu no texto um dispositivo que autoriza a extinção do órgão, e que caberá ao governo a palavra final sobre o assunto.

A extinção da Funasa é um ponto que enfrenta resistências entre parlamentares, uma vez que órgão é cobiçado por partidos políticos por executar obras de saneamento em pequenos municípios.

O texto também incorporou o conteúdo da MP que trata do Conselho do PPI (Programa de Parceria de Investimentos), estabelecendo que sua composição será definida em ato do Executivo.

Por outro lado, Isnaldo não incluiu no seu relatório o conteúdo da medida provisória que transfere o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) do Banco Central para o Ministério da Fazenda, possibilidade que era ventilada nos bastidores. Congressistas já dão como certa que essa matéria irá perder a validade e, portanto, o conselho deverá voltar para a alçada do BC.

O deputado Danilo Forte (União Brasil-CE) criticou decisão de Isnaldo de incluir no texto um dispositivo que autoriza a extinção da Funasa, classificando a atitude como uma “agressão com a instituição”. O parlamentar, que já presidiu o órgão, afirmou que poderá apresentar um destaque para tratar desse trecho do texto.

Na sessão, o senador Espiridião Amin (PP-SC) sugeriu ao relator que ele também transfira a competência de demarcação de terras de comunidades quilombolas à pasta da Justiça —esvaziando mais uma atribuição do Desenvolvimento Agrário.

À imprensa Isnaldo sinalizou que poderá acatar a sugestão, mas afirmou que irá tratar disso com o governo.

Após a sessão, o líder do MDB negou que o texto enfraquece um ministério em detrimento de outro por causa de seus ministros.

No Palácio do Planalto, a avaliação é que o relatório preserva a essência do texto do governo. Interlocutores do presidente ressaltam a autorização para extinção da Funasa, o que permitiu a estruturação da Esplanada.

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que o texto mantém o “espírito inicial” da proposta do governo e que é um relatório “equilibrado”. O responsável pela articulação política do governo ainda acrescenta que o relatório foi negociado com o governo do presidente Lula.

“O relator, líder do MDB, um partido que inclusive compõe o governo, fez um relatório inclusive dialogando com o conjunto do governo. É natural que o Congresso Nacional, sobretudo uma comissão mista, que debate Câmara e Senado, queira fazer contribuições. São contribuições que mantêm o espírito inicial da reestruturação do governo, ou seja, aquelas questões centrais estão mantidas”, afirmou o ministro, ao deixar uma reunião com Lula, no Palácio da Alvorada.

Padilha ainda acrescentou que pode haver ainda negociação antes da votação do texto, que deveria ter sido votado nesta terça-feira, mas houve pedido de vista de parlamentares.

“Vamos analisar amanhã, para poder estar na votação, mas eu considero que o relatório é positivo, ele mantém questões centrais que o governo queria estabelecer, inclusive incorpora elementos muito importantes e faz equilíbrios”, completou.

Questionado se o governo então estava satisfeito com o texto, o ministro evitou dar uma resposta mais direta e disse que o “Brasil está satisfeito”.

Segundo interlocutores do ministro Paulo Teixeira, ele tentará, junto ao governo, reverter o esvaziamento de atribuições da Conab que estavam no guarda-chuva da pasta que comanda.

VICTORIA AZEVEDO E CATIA SEABRA / Folhapress

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