A Câmara Municipal de São Paulo deve votar nesta semana a revisão do Plano Diretor, conjunto de regras que orienta o crescimento da cidade, com novas mudanças em relação ao projeto apresentado pela prefeitura. O vereador Rodrigo Goulart (PSD) encaminhou um texto substitutivo nesta terça-feira (23), e a previsão é que ele seja votado na quinta (26) em primeiro turno no plenário.
O novo projeto propõe que a prefeitura possa revisar o desenho de áreas onde é possível construir prédios mais altos e beneficia proprietários de imóveis tombados. Ao mesmo tempo, mantém a proposta da prefeitura que pode aumentar o número de vagas de garagens no entorno de corredores de ônibus e estações de metrô, segundo a análise de especialistas, que foi alvo de críticas.
Novos limites de altura para os edifícios em algumas áreas poderiam ser revistas “a qualquer momento” pela prefeitura, segundo a proposta. Essa revisão seria feita no entorno de corredores de ônibus e estações de metrô, os chamados EETUs (Eixos de Estruturação da Transformação Urbana).
Hoje, a construção de prédios mais altos é permitida em faixas fixas de 150 metros para cada lado de corredores de ônibus e um raio de 600 metros ao redor das estações de metrô.
O projeto propõe que a prefeitura possa expandir essa área para até um quilômetro no entorno de estações de metrô, trem, monotrilho, VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) e VLP (Veículo Leve sobre Pneus). No entorno dos corredores de ônibus, a faixa da verticalização pode crescer de 150 metros para 225 metros em cada lado. A prefeitura deve apresentar estudos para cada área onde quiser fazer essa expansão, que deve ser aprovada caso a caso.
O projeto também prevê que proprietários de imóveis tombados renovem seu direito de vender o potencial construtivo a que tem direito. Hoje, a legislação permite que essa negociação seja feita apenas uma vez: sempre que o potencial construtivo de um imóvel não é aproveitado, o proprietário pode vender esse direito para que sejam feitas construções em outras áreas da cidade. Agora, os vereadores propõem que, a cada dez anos, o proprietário do imóvel tombado possa vender novamente 70% do valor do potencial construtivo transferível.
Na avaliação do pesquisador Fernando Túlio, professor de urbanismo social do Insper, a minuta prevê mais verticalização da malha urbana em áreas já consolidadas. “Ao invés de ampliar a terra urbanizada, levando infraestrutura para regiões periféricas, a minuta amplia a concentração da indústria imobiliária em locais já saturados”, afirma.
Outro ponto que gerou controvérsia entre urbanistas é a criação das Zonas de Concessão, que não existem hoje na legislação. Segundo Fernando Túlio, na prática as concessionárias não precisariam apresentar projetos urbanísticos ou contar com a participação da sociedade no uso do solo dessas áreas. “É como se a concessionária do Ibirapuera levantasse alguns prédios para tornar a zona mais rentável, sem apresentar projeto ou consultar a população”, exemplifica o professor.
PRAZO CURTO
O tempo para a discussão do substitutivo, de dois dias, é criticado pela oposição na Câmara Municipal e por especialistas. Como o tema é complexo, eles pedem mais tempo para avaliar a proposta.
“O mais grave é fazer uma modificação dessas e querer votar sem ninguém ter lido o texto”, reclama o arquiteto e urbanista Nabil Bonduki, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, que foi relator dos últimos dois planos diretores da cidade.
O vereador Celso Giannazi (PSOL) diz que as audiências públicas sobre o tema foram esvaziadas e não há discussão real sobre as mudanças. Além disso, alerta que as reivindicações da população raramente são transformadas em propostas de mudança no projeto.
“O prefeito Ricardo Nunes ligou o botão de comando com o presidente [da Câmara] Milton Leite para acelerar o processo de encaminhamento da revisão desse Plano Diretor Estratégico”, disse Giannazi.
“Pouquíssimas pessoas conseguem participar, dado o horário e os dias em que são marcadas essas audiências, e elas são condensadas em um tempo muito curto para ouvir a demanda da população, que são muitas. Não há tempo hábil para implementar, para ter um estudo técnico e acomodar as demandas nas emendas ao projeto que vai ser apresentado.”
O relator do projeto, Rodrigo Goulart, discorda. Ele diz que todas as alterações feitas no projeto saíram das discussões nas audiências públicas. Ele diz que a legislação torna mais moderna a principal lei urbanística da cidade.
Ele destaca, entre outros pontos, a obrigação para que se fiscalize o destino da moradia popular na cidade. A Folha de S.Paulo já mostrou que unidades de HIS (Habitação de Interesse Popular) e HMP (Habitação de Moradia Popular) acabam destinadas a proprietários que não se encaixam nos critérios de programas habitacionais.
A gestão Nunes já havia proposta que a condição de HIS ou HMP, com a obrigação de destinar o imóvel para o perfil correto de renda, ficará gravada na matrícula do imóvel. É com base nesse mecanismo que a prefeitura poderá fiscalizar e aplicar punições a empreendedores que não cumprirem a regra.
Goulart disse que os vereadores melhoraram esse mecanismo. Instituições financeiras vão fiscalizar o perfil de renda dos proprietários e passar essas informações para as empreiteiras, e a prefeitura poderá consultar esses dados a qualquer momento, segundo o relator.
Ele também diz que o processo de discussão não está sendo feita de maneira atropelada. Foram feitas 46 audiências públicas desde a apresentação do projeto pela prefeitura, em março. Uma nova audiência será feita na noite desta terça. Outras duas estão previstas entre as votações em primeiro e segundo turno.
“Estamos dando um prazo de 48 horas do conhecimento do texto até a votação em primeiro turno, e após essa etapa teremos audiências públicas devolutivas, em que vamos apresentar o projeto para todos”, disse Goulart. “Há publicidade e há transparência.”
TULIO KRUSE E PEDRO MADEIRA / Folhapress