BARCELONA, ESPANHA (FOLHAPRESS) – A postura de roqueiro marrento não cabe mais a Noel Gallagher. Aquele homem que cansou de lavar roupa suja em público com os conterrâneos do Blur ou no seu longo embate com o irmão Liam parece, hoje, sereno.
“Eu acho que meu estilo de música traz otimismo nas letras e nas palavras. Mas não é algo que eu penso, é algo que vem a mim naturalmente”, diz ele, por chamada telefônica da sua fazenda em Dorset, no Reino Unido.
A crença no amanhã melhor embala o novo disco do antigo líder do Oasis. Em “Council Skies”, Gallagher e a banda High Flying Birds tecem um rock noventista para a década pós-pandemia. As baladas com arranjos de fácil digestão, ainda que eloquentes –característica da obra do britânico- dão a tônica do disco.
Mas desta vez Gallagher quer apontar para um futuro -não só melhor, mas um futuro que não dependa da sua obra pregressa.
“Escrevi todas as músicas durante o confinamento da pandemia”, afirma Gallagher. “Não diria que é um álbum para sonhar, mas é um álbum reflexivo. A pandemia no Reino Unido foi horrível, então ficava refletindo sobre o que poderia acontecer depois.”
Um dos singles do novo disco, “Open the Door, See What You Find” convida à reflexão sobre a calmaria após a tormenta –neste caso, a dos meses assolados pela pandemia. Acompanhado de sinos, orquestrações de violinos redentores e coral à moda antiga do rock, Gallagher canta “abra a porta e veja o que você encontra, não desvie o olhar”.
“Eu sou uma pessoa otimista, não gosto muito de ouvir desespero nas músicas”, diz Gallagher. “Fazer esse tipo de música é o que me parece certo porque faço músicas para mim, esse é meu estilo, não faço música para os outros.”
Em dez faixas e um álbum com remixes e versões alternativas, o músico oferece alternativa ao rock de arena pasteurizado de bandas como Coldplay enquanto se mantém na tradição do rock contemplativo. Em “Pretty Boy”, Gallagher e banda soam até indie. Arriscam nas batidas eletrônicas e riffs dançantes. É indie na forma, não na feitura.
“Meus álbuns só saem quando estão prontos e é isso”, diz o músico. “Não estou sob pressão de gravadoras e faço o que quero, no meu ritmo.” Foram dois anos e meio de trabalho, entre rascunhos de letras e sessões de estúdio. É uma eternidade se considerado o tempo frenético do pop hoje –e também um privilégio que apenas medalhões como um Gallagher podem ter.
Outro privilégio é escolher estrelas para embarcar nos seus projetos. Em “Council Skies”, Gallagher dividiu o estúdio com Johnny Marr. O antigo guitarrista dos Smiths era um dos ídolos do então pequeno Gallagher vivendo na Manchester dos anos 1980. “Foi como se estivéssemos fazendo música juntos, e não colaborando”, diz Gallagher, pouco afeito a parcerias e convites que sobram no pop atual.
O ritmo particular de produção do artista ajuda a entender por que a banda fez poucas turnês desde 2011, quando lançou seu primeiro álbum solo. O novo disco, quase dez anos depois da estreia, é promessa de novos palcos. “Minha música hoje não é mais a música dos anos 1990, mas, quando saio em turnê, eu toco minhas músicas antigas”, diz ele. “Acho que vou para a América do Sul com essa turnê, talvez ano que vem.”
O novo disco do Gallagher mais prolífico -agora são quatro discos de Gallagher ante três do irmão- joga mais uma pá de cal nos sonhos dos antigos fãs do Oasis acerca de um retorno do grupo. Quem acompanhou essa era do rock britânico renovou a esperança na reunião do Blur -o grupo faz uma turnê global após o lançamento de um novo disco.
Em conversa em que mencionar o Oasis era proibido, o músico é perspicaz ao ser questionado sobre britpop, termo que cunhou a última grande geração do rock britânico. “O Blur está em turnê, então acho que o britpop está voltando,” diz o torcedor fanático do Manchester City, que parece não se enquadrar em nenhum time que não seja o seu.
COUNCIL SKIES
Onde Nas plataformas digitais
Autoria Noel Gallaghers High Flying Birds
Gravadora Sour Mash Records
FELIPE MAIA / Folhapress