O cantor, compositor e multi-instrumentista Erasmo Carlos é um dos maiores nomes da nossa música de todos os tempos. Pioneiro do rock no nosso país, ele deixou um legado imensurável para a música popular brasileira.
E, se não tivesse nos deixado em novembro passado – durante o tratamento de uma síndrome edemigênica, doença que ocorre quando há um desequilíbrio bioquímico, dificultando a manutenção dos líquidos dentro dos vasos sanguíneos – Erasmo estaria completando 82 anos neste dia 05 de junho de 2023.
Nesta matéria, preparamos uma lista com cinco perguntas que respondem por que Erasmo Carlos é uma das maiores lendas da nossa música.
Além do horizonte deve ter
Algum lugar bonito pra viver em paz
Onde eu possa encontrar a natureza
Alegria e felicidade com certeza
Além do Horizonte – Erasmo Carlos e Roberto Carlos
Erasmo Carlos
Nascido Erasmo Esteves, no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, em 1941, o Tremendão – como foi apelidado depois do imenso sucesso que conquistou nos tempos de Jovem Guarda – fez história com uma carreira de mais de 60 anos e mais de 30 álbuns lançados, além de DVDs, coletâneas, turnês nacionais e internacionais e de ter suas composições gravadas por quase todos os maiores nomes da MPB.
Em homenagem ao dia de hoje, preparamos uma trend com cinco perguntas que respondem por quais motivos Erasmo Carlos é uma das maiores lendas da nossa música.
Como Erasmo Carlos conheceu seu maior parceiro na música, Roberto Carlos?
Erasmo era amigo de infância de Tim Maia, lá do bairro da Tijuca, mas os dois se aproximaram mesmo na adolescência, por conta da paixão pelo rock’n roll. Foi Tim quem ensinou Erasmo a tocar violão.
Em meados dos anos 50 – o capixaba Roberto Carlos – havia se mudado para o Rio de Janeiro e entrou em contato com o rock’n roll e o rockabilly, passando a ouvir artistas como:
- Elvis Presley;
- Bill Haley;
- Little Richard;
- Gene Vincent;
- e Chuck Berry.
Seu primeiro conjunto musical chamava-se The Sputniks e tinha Tim Maia em sua formação. O grupo passou a se apresentar no programa Clube do Rock, de Carlos Imperial. Foi nessa época que Erasmo Carlos conheceu o seu maior parceiro musical de toda a vida.
Quando os Sputniks se separaram, por conta de um desentendimento entre Roberto Carlos e Tim Maia, um dos integrantes – Arlênio Lívio – juntou-se a Erasmo e outros amigos da Tijuca, para formar o conjunto The Snakes, que também se apresentou no programa de Imperial.
Todos eles: Tim, Roberto, Erasmo, além de Jorge Ben Jor e outros nomes – fãs de rock´n´roll e bossa nova – frequentavam o famoso Bar do Divino, na Tijuca.
Em 1958, Roberto Carlos precisava da letra de uma canção interpretada por Elvis Presley e Arlênio Lívio disse que Erasmo seria a pessoa perfeita para ajudá-lo, pois era um grande fã de Elvis. Foi assim que eles se aproximaram.
Erasmo também contou em seu site oficial que eles foram juntos em um concerto de Bill Haley no ginásio do Maracanãzinho. Além de Elvis, ambos gostavam de:
- Bob Nelson;
- James Dean;
- Marlon Brando;
- Marilyn Monroe;
- e torciam para o Vasco da Gama.
Como foi o início da carreira de Erasmo Carlos?
O grupo vocal de Erasmo – The Snakes – estrelou algumas aventuras no underground do mercado musical, até ser contratado pela gravadora pernambucana Mocambo, onde gravaram um 78 RPM e também um compacto duplo em 1960, antes de chegarem, por fim, a um único LP, Só Twist, pela CBS, em 1961.
O The Snakes não alcançou o sucesso desejado e encerrou as atividades.
Sem seu conjunto e sem a perspectiva de gravação como artista solo, Erasmo foi trabalhar como assistente do apresentador Carlos Imperial, por intermédio de quem viria a tornar-se crooner do grupo Renato & Seus Blue Caps, em 1962. Com Erasmo dividindo os vocais com o baixista Paulo César, Renato & Seus Blue Caps publicaram um LP, em 1963.
Erasmo só passou a utilizar o sobrenome “Carlos” depois da parceria com o amigo Roberto Carlos, e também para homenagear Carlos Imperial.
Como começou a parceria de Erasmo com Roberto?
Depois de apresentados, Erasmo Carlos e Roberto Carlos criaram uma relação de amizade e parceria e resolveram investir na música jovem da época, passando a compor muito juntos e mudando para sempre a história da música pop brasileira: mesclando elementos da MPB, do rock’n roll, da soul music e das grandes baladas.
A primeira parceria da dupla foi a canção Splish Splash, lançada em 1963, no segundo álbum de Roberto, que levou o nome da canção. Este disco mostra uma sensível diferença no repertório de Roberto Carlos, da bossa nova e da música romântica (que constavam em seu primeiro disco, de 1961) para o rock and roll, o que impulsionou a carreira do cantor, fazendo-o atingir o topo das paradas brasileiras.
A faixa-título – uma versão de Erasmo Carlos para a composição dos norte-americanos Bobby Darin e Jean Murray – conta com a participação de Renato e Seus Blue Caps, e virou uma grande hit na época, junto com outra composição de Erasmo em parceria com Roberto desse mesmo disco: Parei Na Contramão.
Em 1964, Roberto Carlos foi novamente para as paradas de sucesso, com o álbum É Proibido Fumar, que – além da faixa-título, parceria de Roberto e Erasmo, traz outro grande hit: O Calhambeque, versão de Erasmo para a canção Road Hog, de John e Gwen Loudermilk.
https://open.spotify.com/track/5fI3VyojzKwYROh9b7cgRQ?si=5f83220af58b43a0
Em 1965, Erasmo Carlos finalmente lança seu primeiro LP solo: A Pescaria com Erasmo Carlos, produzido pelo próprio cantor e que dá início a introdução do órgão eletrônico no lugar do piano em músicas no Brasil, inovação que depois passou a ser utilizada por todos os artistas da Jovem Guarda.
O álbum também explode nas paradas, principalmente por conta dos grandes hits:
- Festa de Arromba;
- A Minha Fama de Mau;
- e Terror dos Namorados.
Todas são parcerias entre Erasmo e Roberto.
Como Erasmo virou o ídolo de uma geração com a Jovem Guarda?
Ainda em 1965, por conta do estrondoso sucesso de Erasmo Carlos, Roberto Carlos e de Wanderléa – cantora e compositora mineira que vivia no Rio de Janeiro desde a infância, e passou a ser parceira de gravadora de Roberto em 1963 – os três foram convidados para apresentar o programa de televisão Jovem Guarda, na TV Record, nas tardes de domingo (daí vem a canção Jovens Tardes de Domingo, de Erasmo e Roberto, lançada em 1977).
A partir daí, os três artistas e amigos tornam-se os grandes responsáveis pelo primeiro movimento musical do rock brasileiro – um dos maiores movimentos musicais e culturais de massa do país, que revolucionou o comportamento jovem brasileiro.
O nome Jovem Guarda foi inspirado em uma frase do revolucionário russo Vladimir Lênin, onde dizia:
“O futuro pertence à jovem guarda porque a velha está ultrapassada”.
As gravações do programa aconteciam no Teatro Record, em São Paulo – com plateia – e ele era transmitido ao vivo. Ao longo de uma hora, o trio cantava seus sucessos e recebia convidados.
O alcance era impressionante para a época: conseguia ter uma audiência de três milhões de telespectadores em São Paulo, e era transmitido em videotape para cidades como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre e Recife.
O programa Jovem Guarda tornou-se um fenômeno de audiência e mídia, assim como o movimento – que unia música, moda e comportamento, dando origem a uma nova linguagem musical e comportamental no país e arrastando multidões.
A principal influência da Jovem Guarda era o rock’n roll do final da década de 50, principalmente Elvis e The Beatles, e o soul da Motown, famosa gravadora norte-americana.
As músicas – em um primeiro momento – eram as versões em português de hits do rock estrangeiro e – mais tarde – os astros da Jovem Guarda passaram a lançar suas próprias canções, encabeçados pelos principais compositores do movimento: Erasmo e Roberto. As letras tinham temática amorosa e do universo jovem.
A estética da Jovem Guarda
Todo o comportamento da juventude daquele período tinha referência na Jovem Guarda e seus astros:
- além da música, o modo de se vestir (calças colantes de duas cores em formato boca-de-sino, cintos e botas coloridas, mini saia com botas de cano alto);
- as gírias e as expressões como: “broto”, “carango”, “legal”, “coroa”, “barra limpa”, “lelé da cuca”, “mancada”, “pão”, “papo firme”, “maninha”, “pinta”, “pra frente” e “é uma brasa, mora?”.
A estética da Jovem Guarda – que foi também responsável por introduzir a guitarra elétrica em canções brasileiras, assim como a Tropicália – teve grande influência em uma nova geração de artistas da música popular brasileira que veio depois.
Alguns outros nomes de destaque do movimento foram:
- Ronnie Von;
- Eduardo Araújo;
- Sylvinha Araújo;
- Jerry Adriani;
- Martinha;
- Leno e Lílian;
- Deny e Dino;
- Paulo Sérgio;
- Golden Boys;
- Renato e Seus Blue Caps;
- Os Incríveis;
- e The Fevers.
Depois de estrondoso sucesso durante três anos, o programa dominical chegou ao fim em 1968. O movimento da Jovem Guarda foi perdendo a força aos poucos com o fim do programa, mas mudou para sempre o rumo da história da música popular brasileira.
Muitos dos grandes artistas que surgiram depois na nossa música foram influenciados pela Jovem Guarda, principalmente as bandas de rock e pop rock que surgiram com força a partir dos anos 80 e 90, como:
- Titãs;
- Legião Urbana;
- Barão Vermelho;
- Kid Abelha;
- Os Paralamas do Sucesso;
- Skank;
- e Pato Fu.
Como se deu a continuidade do sucesso de Erasmo pós Jovem Guarda?
Juntos, Wanderléa e Erasmo Carlos ainda apresentaram um programa chamado A Ternurinha e o Tremendão, na TV Record, em 1968.
Erasmo ainda participou como ator de filmes como:
- Roberto Carlos e o Diamante Cor-de-rosa (1970);
- Roberto Carlos a 300 Quilômetros Por Hora (1971), ambos dirigidos por Roberto Farias;
- e Os Machões, de Reginaldo Farias, em 1972, entre outros.
Os artistas da Jovem Guarda tomaram rumos distintos no início da década de 70 e Erasmo Carlos seguiu com o rock’n roll pulsante de sempre, e também com influências da bossa nova e da soul music.
Lançou mais dezenas de discos, influenciando gerações de músicos pelo Brasil afora e marcando nossas vidas para sempre com suas composições icônicas.
A parceria com Roberto se manteve e – das quase 700 composições de Erasmo registradas no ECAD – Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – a grande maioria é em parceria com o amigo.
São muitos os exemplos de grandes hits da dupla, como, além das já citadas:
- Gatinha Manhosa;
- Sentado à Beira do Caminho;
- Coqueiro Verde; Além do Horizonte;
- Do Fundo do Meu Coração;
- Olha;
- Que Tudo Vá Pro Inferno;
- Eu Te Darei o Céu;
- Eu Sou Terrível;
- Se Você Pensa;
- As Canções Que Você Fez Pra Mim;
- Eu Te Amo, Te Amo, Te Amo;
- Sua Estupidez;
- As Curvas da Estrada de Santos;
- Jesus Cristo;
- Detalhes;
- Todos Estão Surdos;
- De Tanto Amor;
- O Portão;
- É Preciso Saber Viver;
- Emoções;
- Não Se Esqueça de Mim;
- Café da Manhã;
- Costumes;
- Cama e Mesa;
- Fera Ferida;
- Ilegal, Imoral ou Engorda;
- Debaixo do Caracóis dos seus Cabelos;
- Filho Único;
- e Pega na Mentira.
Em 1977, o Rei também escreveu a letra da canção Amigo, em homenagem ao Tremendão, em cima de uma música composta por Erasmo.
Outros sucessos da carreira de Erasmo Carlos, sem ser em parceria com Roberto, são:
- Você Me Acende (versão dele para a canção You Turn Me On, de Ian Whitcomb);
- A Carta (composição de Raul Sampaio e Benil Santos);
- Vem Quente Que Eu Estou Fervendo (de Carlos Imperial e Eduardo Araújo);
- O Carango (de Carlos Imperial e Nonato Buzar);
- O Caderninho (de Olmir Stocker ”Alemão”);
- De Noite na Cama (de Caetano Veloso);
- Sou uma Criança, Não Entendo Nada (parceria de Erasmo com Ghiaroni);
- Mais um na Multidão (dueto com Marisa Monte e de autoria de Erasmo, Marisa e Carlinhos Brown)
- e Mulher (Sexo Frágil) (escrita com sua esposa na época, Narinha);
- e Prova de Fogo (composição de Erasmo, sucesso na voz de Wanderléa).
Muitos outros grandes artistas gravaram as composições de Erasmo Carlos ao longo da história, como é o caso de: Gal Costa, Maria Bethânia, Nana Caymmi, Alcione, Adriana Calcanhotto e Fernanda Takai.
O legado
Em 2018, Erasmo Carlos foi indicado ao Grammy Latino: Prêmio Excelência Musical da Academia Latina de Gravação, que homenageou toda a sua obra e a importância do Tremendão para a música Latina.
Em 2019, foi lançado o filme Minha Fama de Mal, dirigido por Lui Farias e baseado na vida de Erasmo, com Chay Suede interpretando o cantor e compositor.
O último disco lançado pelo Tremendão foi ainda em 2022 – O Futuro Pertence à… Jovem Guarda – que acabou rendendo a Erasmo o Grammy Latino de Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa, cinco dias antes de sua morte.
Para saber mais sobre a história de vida e a obra do Tremendão, acesse o Acervo MPB especial Jovem Guarda.
Viva o eterno Tremendão, Erasmo Carlos!