BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Aliado do presidente da Câmara dos Deputados, o presidente da CPI do 8 de janeiro, deputado federal Arthur Maia (União Brasil-BA), diz que só não participam de cargos de comando no Congresso aqueles que “não estão vinculados a lugar nenhum”, mas nega que vá “empenar” as investigações.
“Negar que eu tenho relação política com o presidente Arthur Lira é um absurdo. Da mesma forma que, por exemplo, a relatora [Eliziane Gama] é vinculada ao governo. Ela é ligada ao [ministro da Justiça, Flávio] Dino. O Magno Malta [2º vice-presidente] é ligado à oposição”, diz em entrevista.
Maia é também relator do marco temporal na Câmara e afirma que a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), têm posições “xiitas”, cobra a aprovação do texto no Senado e condena o veto do Ibama à exploração de petróleo em Foz do Amazonas. O parlamentar fez críticas ainda ao grupo político do ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), seu adversário na Bahia.
PERGUNTA – Qual foi o acordo político que o colocou na presidência da CPI?
ARTHUR MAIA – Eu acho que decorre muito do fato de que a CPMI é um colegiado que tem duas posições muito radicalizadas e que, para ter credibilidade, precisaria ter um presidente que tivesse uma posição mais neutra, nem um bolsonarista nem um petista. Eu sou isso. Eu não tenho nenhuma vinculação para que alguém possa me chamar de bolsonarista nem de petista.
O sr. falou que não é nem de um lado nem de outro, mas apoiou Bolsonaro na eleição.
A. M . – Eu sou um político que está aqui no Congresso Nacional há quatro mandatos. É absolutamente natural que eu me posicione na eleição presidencial. O meu partido no primeiro turno teve uma candidata a presidente [Soraya Thronicke]. Eu votei nela. As pessoas que me elegeram na eleição de outubro majoritariamente apoiavam o Bolsonaro e, portanto, eu apoiei o Bolsonaro no segundo turno.
Isso pode ter algum efeito na condução da CPI?
A. M . – Pelo amor de Deus. Claro que não.
Senadores da base apontam que o sr. é um homem do presidente da Câmara na comissão e veem ingerência indevida por parte dele, não só nesta CPI.
A. M . – Não há nenhum cargo que seja ocupado na Câmara dos Deputados, no Congresso Nacional, sem que isso tenha representação partidária. Eu faço parte do União Brasil e o partido está no mesmo bloco que o presidente Arthur Lira. Negar que eu tenho relação política com o presidente Arthur Lira é um absurdo. Da mesma forma que, por exemplo, a relatora é vinculada ao governo. Ela é ligada ao [ministro da Justiça, Flávio] Dino. O [senador] Magno Malta [2º vice-presidente] é ligado à oposição. Aqui só não participa de cargos de comando aqueles que não estão vinculados a lugar nenhum.
Dizer que eu tenho aqui uma vinculação política ao presidente Lira é algo absolutamente verdadeiro. Eu tenho uma relação política aqui, o meu partido está no bloco do Arthur Lira. Dizer, entretanto, que nós vamos empenar a condução da CPI em função dessa vinculação política ou qualquer outra, absolutamente [não].
A relatora é próxima do ministro Flávio Dino. Isso pode gerar críticas ou algum prejuízo?
A. M . – Já está gerando críticas. Agora, eu confio no trabalho dela, sei que ela é uma mulher experiente, madura e séria. Quem é que está nessa CPI que não tem vinculação política? Eu tenho as minhas, ela tem as delas. É absolutamente normal. Agora, eu não acredito de maneira nenhuma que, colhidas as provas, a senadora vai construir uma narrativa contrariando o que for demonstrado.
Como os senhores vão evitar suspeitas de que estão blindando alguém?
A. M . – Agindo. Essas coisas não se blindam. Já disse e repito: eu não tenho nenhum investigado de estimação; nem Flávio Dino, nem Bolsonaro, nem quem quer que seja. Não vou colocar em votação requerimentos que tenham um viés político, eleitoral, que queiram, ao invés de esclarecer, fazer da CPI um palco político. Por que vamos convocar o Bolsonaro? Se tiver aí, no decorrer das investigações, motivos para convocar Bolsonaro ou quem quer que seja, tudo bem. Mas começando a CPI, eu não conheço nenhuma razão para convocar o ex-presidente da República. Se surgir adiante, vai ser ouvido.
O sr. acha que o governador do DF, Ibaneis Rocha, deve ser convocado?
A. M . – A CPI não tem poder para convocar um governador de estado, nem governador do Distrito Federal. Mas convites podem ser feitos. Feito um convite, eu espero que o governador atenda a esse convite para poder vir aqui fazer seu depoimento. O governador é uma peça importante para esclarecer esses fatos.
O sr. disse que o governo fingiu que não participou do esvaziamento do ministério da Marina Silva. Qual foi a participação do governo?
A. M . – O deputado Isnaldo [Bulhões Jr., relator da MP dos Ministérios] fez esse relatório com uma permanente conversa com o governo. O governo não tem como conviver em uma agenda desenvolvimentista com o xiitismo que existe hoje no Ibama e no ministério da Marina. Então a gente vê que o governo começa a se posicionar de maneira contrária àquilo que a Marina e o presidente do Ibama defendem, inclusive na exploração de petróleo na foz do rio Amazonas [que o Ibama vetou, mas Lula está mediando]. Eu não tenho dúvida nenhuma que o governo não aceitará esse laudo do Ibama.
O governo diz que a União Brasil tem três ministérios e é a sigla que tem dado menos votos nas pautas de interesse do presidente.
A. M . – Então tira [os ministérios]. Simples assim. Então tira. Por que ele não tirou até agora se nós não estamos dando os votos? Esse papo de que o partido tem três ministérios, com todo respeito aos ministros que estão lá, eu discordo.
O ministro Rui Costa (Casa Civil) tem sido criticado por parlamentares e chegou a dizer que, para muitos em Brasília, fazer o errado é o certo.
A. M . – Todo mundo sabe aqui em Brasília que essa turma do PT da Bahia é responsável em grande medida por esse afastamento da União Brasil, porque eles trouxeram o problema paroquial do nosso estado para aqui, para Brasília, e vetaram o nome natural para o ministério que era o do líder, Elmar Nascimento [também da Bahia]. O Rui Costa está vivendo aqui uma situação delicada. Eu não quero agora fazer crítica ao ex-governador Rui Costa, ex-governador do meu estado, até para não parecer que eu estou retribuindo na mesma moeda.
Governistas apontavam que Elmar falou mal de Lula durante a campanha e não faria nem sentido ele assumir algum ministério.
A. M . – Eu vou lhe responder com uma pergunta: então faz sentido Geraldo Alckmin ser o vice-presidente da República na chapa de Lula? Elmar não falou mal de Lula na campanha, eles se referem a coisas passadas. Elmar não falou contra Lula nem 1% do que Alckmin já falou. É preciso perguntar também se eles querem governar olhando pelo retrovisor ou olhando para frente.
O sr. foi relator do projeto do marco temporal. Por que defende essa tese?
A. M . – Há uma desonestidade intelectual que permeia esse debate. Alguns dizem que significa acabar com as reservas indígenas existentes. Isso é má-fé ou ignorância. A lei não tem efeito retroativo. É preciso que a gente valorize a segurança jurídica. Do jeito que vai, não tem como no Brasil daqui a 100 anos não virar tudo área indígena. Porque nós estamos em um crescendo de criação de áreas indígenas que tem um viés profundamente ideológico. Eles querem implantar o socialismo no Brasil e um dos instrumentos é essa transformação de áreas em reservas indígenas para combater a propriedade privada, para promover a socialização das terras e para combater o agronegócio. O projeto não é contra os índios verdadeiros, é contra pseudo índios que querem utilizar desse instrumento absurdo que existe na Funai de expropriar propriedade alheia.
Quando o sr. fala que eles querem implantar o socialismo, quem seriam eles?
A. M . – Todos que estão nessa luta pela ampliação de reservas indígenas no Brasil, dessa forma desenfreada, que são contra o marco temporal.
Isso inclui quem?
A. M . – Você não está vendo? É só abrir o jornal e ver quem está defendendo essa tese. Essa luta não é uma luta a favor do índio. Essa luta é uma luta ideológica.
O sr. atribui essa visão ao presidente Lula e ao PT também?
A. M . – Não, não. Se eles pensam assim? Eu acho que o governo que se colocou contra o projeto pensa assim, infelizmente. Agora, claro que o que vivemos hoje em relação aos índios não pode ser atribuído só a esse governo. O importante é a gente definir quem é o sujeito que faz jus a esse direito, porque o que existe aí são aproveitadores.
O governo tentou adiar a votação na Câmara ao propor um grupo com os três Poderes para solucionar o impasse sobre o marco.
A. M . – Toda vez que não querem votar uma lei há essa ideia de se criar um grupo. Esse projeto está há 16 anos no Congresso. Tínhamos que votar. Eu acho que o Senado tem que votar. Se vai aprovar, se não vai, eu não me meto nisso. Mas eu acho que é temerário que um tema tão importante para o Brasil seja colocado na gaveta do esquecimento.
O Senado, na avaliação do sr., tem que votar o PL mesmo após eventual decisão do Supremo?
A. M . – Principalmente se o Supremo tomar uma decisão, porque o Supremo não é legislador, nós somos legisladores. O Supremo tem o direito de julgar no caso em concreto, no conflito constitucional, mas nós fomos eleitos para legislar.
O PL fala que os povos indígenas podem perder seus territórios em razão da alteração dos traços culturais. Por que insistir nesse ponto tão criticado?
A. M . – Imagine uma reserva que aos poucos os índios foram abandonando e, de repente, não tem mais nenhum índio. É justo que alguém que não é índio chegue ali e se aproprie daquilo? Não. Aquilo deve voltar para o Estado brasileiro.
Mas o texto fala em perder traços culturais.
A. M . – Perder o traço cultural daquela reserva significa ausência desse povo. Não significa que por terem mudado de hábitos eles vão perder aquela terra. Acho até que isso poderia ter uma redação melhor [ajustar essa parte do texto], mas tem que ficar claro que se não existem mais indígenas daquela etnia vivendo ali, não há porque existir a reserva. Se tem descendente ali, a gente vai manter com aquele povo.
RAIO-X | ARTHUR MAIA, 58
Deputado federal da Bahia pela União Brasil, é presidente da CPI do 8 de janeiro. Foi relator do projeto do marco temporal e da reforma da Previdência, no governo Temer. Advogado e mestre em direito econômico pela Universidade Federal da Bahia.
THAÍSA OLIVEIRA E THIAGO RESENDE / Folhapress