STF rejeita outra denúncia que havia aceitado contra Lira

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta terça-feira (6) rejeitar uma denúncia que a corte já havia aceitado contra o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).

Apesar de ser incomum o Supremo reverter uma denúncia já aceita, o tribunal também fez isso em 2021 em outro caso que envolvia Lira, o do chamado “Quadrilhão do PP”.

Nesta terça, o entendimento foi unânime, com os votos dos ministros André Mendonça, Dias Toffoli, Luiz Fux Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes. Moraes e Barroso modificaram os seus votos anteriores.

A ação que o Supremo julgou era uma das principais pendências judiciais de Lira, que havia completado mais de dois anos e meio de tramitação paralisada após pedido de vista (mais tempo para análise) do ministro Dias Toffoli.

O Supremo já tinha maioria contra Lira, mas os ministros permitiram que André Mendonça apresentasse um novo voto em substituição ao do seu antecessor, o ministro aposentado Marco Aurélio Mello, o que beneficiou o presidente da Câmara.

O argumento da corte é que mudanças legislativas influenciam na ação contra o presidente da Câmara e que a própria PGR (Procuradoria-Geral da República) desistiu da denúncia. Por isso, Mendonça poderia votar no caso.

Em seu voto, Mendonça afirmou que as provas nesse caso eram fracas. Segundo ele, mesmo as delações premiadas “foram menos esclarecedoras do que em geral se verifica em casos semelhantes” e “apontaram com vagueza a real relação entre corrupto e corruptor”.

Em nota após o julgamento, o advogado de Lira, Pierpaolo Cruz Bottini, disse que “o arquivamento da quarta denúncia contra o deputado Arthur Lira revela a fragilidade das delações de Alberto Youssef e os riscos de fundamentar acusações apenas nas declarações de colaboradores, sem outras provas que corroborem as narrativas”.

Nas redes sociais, Lira disse que recebeu a decisão “com serenidade”. “Tenho a consciência tranquila de que nos 24 anos de atividade política jamais cometi qualquer tipo de transgressão. Fez-se Justiça!”, publicou.

Lira foi acusado de corrupção pela PGR após um ex-assessor ter sido flagrado transportando R$ 106,4 mil em dinheiro vivo. O processo recebeu aval do Supremo em 2019, mas pouco andou desde então.

O caso é oriundo da Operação Lava Jato e voltou à corte em meio a uma crise entre o presidente da Câmara e o Palácio do Planalto.

A denúncia contra Lira foi aceita pelos ministros do STF em 2019, mas a defesa apresentou um recurso contra a medida chamado de embargos declaratórios. Houve maioria em 2020 para a rejeição desses embargos, mas Toffoli, então, fez o pedido de vista antes do encerramento formal dessa fase.

Em abril passado, a PGR, já sob o comando de Augusto Aras, voltou atrás e pediu ao STF a rejeição da denúncia que ela mesma havia apresentado contra o presidente da Câmara.

A vice-procuradora geral da República Lindôra Araújo citou a ausência de justa causa, com ressalva em hipótese de surgimento de novas provas.

Lindôra usou como argumento a nova legislação do pacote anticrime, sancionada em 2019, e o novo entendimento do STF sobre a insuficiência, para sustentar a abertura de ação penal, de depoimentos de delatores os quais não estejam acompanhados de elementos de comprovação.

A defesa de Lira também afirmou ao Supremo que a denúncia tinha por base apenas a palavra de um delator e apresentava inconsistências e fragilidades.

“Após o recebimento da denúncia, a lei foi alterada, e o processo não pode mais ser aberto com base apenas na narrativa do delator. Esse é um dos fundamentos do recurso apresentado”, disse a defesa do presidente da Câmara.

O voto de Mendonça, em substituição ao de Marco Aurélio, e a mudança de entendimento de Moraes e de Barroso, que haviam votado contra o recurso, modificaram o placar.

Moraes afirmou que mudou o voto porque a denúncia recebida antes do pacote anticrime tinha a narrativa inicial embasada em relato de delatores.

“Se tirarmos a delação e tirarmos a rejeição da denúncia [pela PGR], não vislumbro justa causa para o prosseguimento [da ação]”, disse o ministro. “[Além disso] A própria Procuradoria já afirmou que permanecerá inerte numa eventual produção probatória.”

Barroso seguiu o entendimento. “Penso que seria um formalismo excessivo nós não admitirmos a manifestação do ministro André Mendonça e a mudança de posição da Procuradoria-Geral da República à vista de uma mudança legislativa”, disse.

Na denúncia contra Lira, a então procuradora-geral da República Raquel Dodge pediu a condenação de Lira por corrupção passiva, delito com pena prevista de até 12 anos de prisão. A peça também incluía o crime de lavagem de dinheiro, mas os ministros tinham rejeitaram esse enquadramento.

A apreensão do dinheiro com o então assessor parlamentar Jaymerson Gomes de Amorim ocorreu em fevereiro de 2012, quando ele tentou embarcar em um voo no aeroporto de Congonhas transportando a quantia nas roupas e junto ao corpo.

A passagem aérea tinha sido comprada com o cartão de crédito de Lira e, de acordo com a investigação, os dois trocaram mensagens e telefonemas no dia do episódio.

A PGR concluiu que o dinheiro transportado pelo assessor consistia em um pagamento feito a Lira por Francisco Colombo, então presidente da estatal CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos), para se manter no cargo.

À época, a companhia integrava a hierarquia do Ministério das Cidades, comandado pelo PP no governo Dilma Rousseff (PT).

O Ministério Público usa na acusação, entre outros indícios, depoimentos de delação do doleiro Alberto Youssef, pivô da Lava Jato, para estabelecer o elo do dirigente da CBTU com Lira. Francisco Colombo morreu em 2014.

Um dos elementos da acusação eram registros de dezenas de visitas do então presidente da estatal ao escritório de Youssef em São Paulo. Lira também frequentava a sede das empresas do doleiro.

A denúncia também afirmava que há registro de chamadas frequentes entre o deputado e o então dirigente da CBTU na época da apreensão do dinheiro.

O Ministério Público disse ainda que o assessor, ao ser flagrado, “titubeou e não apresentou justa causa para a expressiva quantidade de dinheiro” que levava. Ele retornaria a Brasília em voo menos de duas horas depois da chegada a São Paulo.

De acordo com a denúncia, o então funcionário da Câmara deu explicações contraditórias, primeiro dizendo desconhecer Lira e a compra por meio do cartão de crédito e posteriormente afirmando que adquiriu as passagens sem o conhecimento do deputado.

JOSÉ MARQUES / Folhapress

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