SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Pacientes de mais de 16 anos de todo o país terão acesso, pelo SUS (Sistema Único de Saúde), à droga tafenoquina, utilizada contra malária, especificamente no combate à forma causada pelo Plasmodium vivax. A grande vantagem é o uso em dose única.
A portaria da Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Complexo da Saúde do Ministério da Saúde sobre o tema foi publicada nesta terça (6) no Diário Oficial da União. A incorporação ao SUS deve acontecer em até 180 dias.
A droga comumente utilizada é a primaquina, administrada por sete dias consecutivos, período no qual há melhora dos sintomas (tais quais dor e febre) e, por causa disso, frequentemente abandono do tratamento, apesar de os parasitas permanecerem no organismo.
Assim, tratamentos incompletos são um entrave para o controle e eventual eliminação da malária no Brasil, possibilitando recaídas e novas transmissões.
O uso da tafenoquina, porém, está condicionado à dosagem de uma enzima conhecida como G6PD (glicose-6-fosfato desidrogenase). Se os níveis de G6PD forem baixos, o tratamento com drogas da classe da tafenoquina e da primaquina pode gerar consequências como hemólise (destruição dos glóbulos vermelhos) e anemia severa. Cerca de 5% da população brasileira tem deficiência de G6PD.
O tratamento da fase aguda da malária inclui ainda a cloroquina, droga largamente utilizada, sem respaldo científico, na pandemia de Covid-19.
O P. vivax é responsável por uma manifestação relativamente mais branda da malária se comparado ao P. falciparum, principal causador de mortes pela parasitose no mundo. Ainda assim, o P. vivax é responsável por um grande sofrimento e prejuízo econômico e social à população brasileira, com concentração de casos na região amazônica, onde há maior transmissão dos parasitas por mosquitos anofelinos, os vetores da doença. Em 2021 foram diagnosticados 139 mil casos de malária no país, 80% deles causados por P. vivax.
Entre os estudos que embasaram a decisão de incorporação da droga está o Trust (de Tafenoquine Roll-oUt STudy), que busca cura radical da malária, a eliminação do parasita tanto do sangue quanto do fígado, com o uso da combinação entre tafenoquina e teste da G6PD.
O Trust foi copatrocinado pelo Ministério da Saúde e pela MMV (Medicines for Malaria Venture) e conduzido por pesquisadores, da Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado e do Centro de Pesquisa em Medicina Tropical de Rondônia (Cepem), respectivamente nos municípios de Manaus (AM) e Porto Velho (RO).
“A incorporação desse novo tratamento no SUS é resultado de um longo processo de pesquisa que gerou evidências científicas robustas, que embasaram a decisão do Ministério da Saúde. Milhares de pacientes se beneficiaram desse tratamento na fase piloto, e agora a população das áreas endêmicas vai poder ter acesso a um tratamento seguro, em dose única. Essa incorporação representa um divisor de águas para melhorar a adesão ao tratamento, especialmente entre os mais vulneráveis”, afirma à reportagem Dhelio Pereira, médico do Cepem e um dos líderes do Trust.
Foram considerados pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde), ainda, um estudo qualitativo feito com pacientes e profissionais de saúde e uma análise de custo-efetividade e de impacto orçamentário.
“O Programa Nacional de Malária do Brasil está atualmente focado na eliminação da malária, uma meta ambiciosa para a qual a inovação é fundamental. A incorporação desta inovação ao Sistema Único de Saúde possibilitará aos pacientes com malária vivax um tratamento mais seguro e de menor duração, beneficiando especialmente a população que vive em áreas remotas da região amazônica”, afirma Ethel Maciel, secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, em comunicado à imprensa.
O teste diagnóstico da G6PD é fruto de uma parceria entre a ONG Path e a empresa coreana SD Biosensor. A tafenoquina, produzida pela farmacêutica GSK, teve desenvolvimento apoiado pela MMV, que tem suporte de governos e outras entidades, como o USAid e a Fundação Bill e Melinda Gates.
GABRIEL ALVES / Folhapress