Entenda como funciona o trabalho perigoso de dublês de ação em Hollywood

LOS ANGELES, EUA (FOLHAPRESS) – Alguns fãs fariam de tudo por seus ídolos. Correr pulando em cima dos carros numa avenida congestionada, cair de um tubo de ventilação numa sala lotada ou ainda se jogar numa tirolesa segurando apenas na mão de alguém, comendo areia na chegada.

Vanessa Vander Pluym fez tudo isso por Jennifer Lopez. E, com frequência, muitas e muitas vezes seguidas. Mas longe de ser fã, a californiana é uma dublê de ação profissional e vive, literalmente, atrás do perigo.

“Amo trabalhar nas alturas, qualquer coisa que me faça sentir voando, nem que por alguns milissegundos”, disse Pluym numa entrevista em Los Angeles. “Gosto de acrobacias com carros também: já capotei, pulei de rampa, adoro.”

Ex-ginasta da seleção americana e faixa preta em taekwondo, Pluym entrou para o mundo do entretenimento aos 20 e pouco anos com trabalhos de atriz e dublê para videogame e seriados, como “Charmed”, “The King of Queens” e “ER”.

Em 2003, conheceu Lopez ao dançar num vídeo promocional da cantora. De cara, notou como eram fisicamente parecidas. Desde então, foi atrás de todas as oportunidades para dublá-la e acabou virando uma de suas dublês oficiais –afinal, é preciso um time de sósias para algumas das acrobacias hollywoodianas.

O primeiro trabalho, dez anos atrás, foi numa série de comerciais para uma loja de departamentos, incluindo um no qual Lopez atravessa o trânsito pulando em cima dos carros de salto alto. “Fiz minha lição de casa. Vi todos seus filmes para ver como ela se movimenta, mexe as mãos, a cabeça, como faz comédia com o corpo”, disse Pluym.

Em “A Mãe” (2023), filme mais visto da Netflix por duas semanas, Pluym lidera a lista de seis dublês de Lopez, no papel de uma assassina profissional que precisa proteger sua filha.

Quando a protagonista dirige uma moto loucamente pelas ruas apinhadas de Havava (em cenas gravadas nas Ihas Canárias) até bater num carro, é uma colega dublê que dirige a moto, enquanto Pluym é quem sai voando pela capota e atinge o chão com tudo. No final, é Lopez que vemos nas telas, caída, desorientada e bela: ela se levanta e ainda rouba o veículo.

“Fiz essa cena várias e várias vezes. Era sábado, tinha gente nas ruas vendo, e o povo vibrava. A diretora achou legal ficar repetindo”, lembra com uma risada. “Só usei uma pequena proteção nos joelhos e nada mais. A blusa voava demais, qualquer coisa iria aparecer.”

“As pessoas acham que é tudo divertido e falso, mas a dor é real”, diz, sem risada. “Com o tempo, você aprende a mitigar o perigo tanto quanto for possível.”

Em “Casamento Explosivo” (2022), da Amazon, apenas duas dublês ajudaram Lopez no papel de uma noiva cujo casamento numa ilha das Filipinas (rodado na República Dominicana) é invadido por piratas. Ao fugir dos ladrões, ela e o noivo pulam de uma tirolesa sem proteção.

A cena de um minuto foi filmada em três meses, contando ensaios e gravações em quatro locações diferentes. Quando a personagem chega ao final da corda e larga a mão do noivo, ela cai de peito e cara na areia da praia.

Foram mais de 20 tomadas para captar as imagens perfeitas da queda. Plym repetiu todas, sempre paramentada com o vestido de casamento igual ao de Lopez. Ela também a dublou na série “Shades of Blue”, além de fazer zumbis e dublar a atriz Samantha Morton, a Alpha de “Walking Dead”.

“Nas acrobacias mais críveis, você precisa perder o controle por um momento e depois recuperá-lo antes de se machucar”, explica, admitindo que, às vezes, é impossível. “Como cair de escadas… Você pode planejar o quanto quiser, mas no segundo que te empurram, chutam ou jogam escada abaixo, nunca será como planejado.”

A profissão tem um lado obscuro que poucos gostam de falar. Plym diz que nunca se machucou em filmagens, só nos ensaios. Ela admite, no entanto, que às vezes é difícil dizer não para uma cena de ação que não parece muito segura. Afinal, ninguém quer desagradar o coordenador de dublês e perder trabalhos futuros.

Coordenador de dublês é o próximo passo na carreira, responsável por orquestrar os detalhes das cenas de ação. Porém, não existe uma qualificação formal para ser coordenador nos Estados Unidos e qualquer dublê registrado no sindicado dos atores, o SAG-AFTRA, pode ganhar a função.

Para Andy Armstrong, um dos coordenadores mais respeitados de Hollywood, isso é “absolutamente ridículo e ingrediente para desastre”. “A profissão deveria ser mais segura hoje por causa das novas tecnologias e métodos, mas infelizmente muitas vezes as acrobacias não são bem preparadas por pessoas experientes”, disse Armstrong, que trabalhou em três filmes do James Bond, dois do Homem-Aranha e muitos outros de super-heróis.

Acidentes são bem conhecidos do público. Só em 2017, um dublê morreu numa queda filmando “The Walking Dead”, dias após uma dublê morrer numa cena de moto de “Deadpool 2”. Na mesma época, Tom Cruise quebrou o tornozelo em “Missão Impossível 6”.

Enquanto muitos dublês temem o uso de CGI (imagens criadas por computador) e inteligência artificial, Armstrong diz que as tecnologias aprimoram e trazem mais segurança. “Você precisa se adaptar e aprender como elas trabalham para você”, disse.

Armstrong é um dos fundadores do principal prêmio da categoria, o Taurus World Stunt Awards, e tem sua própria teoria por que os dublês não estão no Oscar, cerimônia cuja organização ele também faz parte. Ele culpa a fama de imprudentes dos dublês.

“Ainda existe um sentimento de macho man entre os dublês que eu acho deplorável” e a ignorância da maioria dos membros da Academia de como cenas de ação são criadas. “Sofremos da nossa própria reputação”, disse.

FERNANDA EZABELLA / Folhapress

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