BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Americanas prepara a quebra dos sigilos bancários, fiscais e telemáticos dos ex-diretores da empresa envolvidos na fraude dos balanços da companhia. Os requerimentos serão votados já na próxima terça (20).
A decisão foi tomada em reunião administrativa nesta quarta-feira (14). Os parlamentares também devem ouvir o BC (Banco Central) e a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) sobre o assunto.
As acusações feitas pelo atual diretor da Americanas na comissão nesta terça (13) também aumentaram a pressão para a convocação do trio de acionistas de referência da empresa os empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira e representantes das auditorias.
O objetivo da CPI é reunir elementos suficientes para depois ouvir ex-diretores e as auditorias que avalizaram os balanços da Americanas. A ideia é tentar convocar os primeiros ex-executivos da companhia no início de julho, antes do recesso parlamentar.
“Vamos convocar diretores e auditorias quando tivermos elementos”, resumiu o presidente da CPI, o deputado Gustinho Ribeiro (Republicanos-SE).
Ele diz que a comissão irá se debruçar sobre os pontos levantados pelo CEO da empresa e que se tornou “inevitável” e “necessária” a convocação dos agentes citados por ele em sua participação na CPI. “A partir de agora as investigações se concentrarão nessas afirmações.”
“A CPI vai buscar realmente os culpados para que a gente garanta a imagem e a credibilidade do nosso país junto ao mercado financeiro e ao mercado de capitais”, afirma o parlamentar.
Ribeiro diz ainda que, caso comprovada o envolvimento dos ex-diretores, a CPI deverá pedir em seu relatório final o indiciamento deles.
O atual CEO da Americanas, Leonardo Coelho Pereira, depôs nessa terça na CPI e indicou uma suposta participação ativa da diretoria na fraude dos resultados da empresa.
Outros documentos também apontam para uma possível conivência das auditorias PwC e KPMG, que discutiam com a então diretoria como suavizar os termos utilizados nos seus documentos.
Pereira ponderou entretanto que seria necessário aprofundar mais a investigação em relação às duas auditorias para entender se houve um conluio ou não entre elas e a Americanas. Ele classificou os diálogos como um “ponto de atenção”.
Procurada na terça (13) pela Folha de S.Paulo, a KPMG no Brasil disse que, “por motivos de cláusulas de sigilo e regras da profissão, está impedida de se manifestar sobre casos envolvendo clientes ou ex-clientes da firma”.
A PwC afirmou em nota que “não comenta temas de clientes por questões de confidencialidade e regras de sigilo profissional”.
A CPI também pretende aprovar um requerimento pedindo a íntegra dos documentos que embasaram o relatório apresentado na terça.
O CEO da Americanas, contratado depois do escândalo vir à tona e com a empresa já em recuperação judicial, apresentou à CPI supostos emails e conversas de WhatsApp na qual os ex-diretores falavam abertamente sobre a fraude.
Em um email enviado pelo ex-executivo Marcelo Nunes, antigo diretor financeiro da Americanas, para toda a então diretoria da companhia, um balanço chamado “visão interna”, mostra um prejuízo antes de juros, impostos, depreciação e amortização para 2021 de R$ 733 milhões.
Um outro documento na mesma troca de mensagens intitulado “visão conselho” traz um lucro para a mesma rubrica de quase R$ 2,9 bilhões. Esse foi o número apresentado ao mercado.
Em relação ao trio de acionistas de referência, o CEO da empresa disse que nada indica até o momento que eles tinham conhecimento do que ocorria nas Americanas.
Para o deputado Tarcisio Motta (PSOL-RJ), integrante da CPI, o ideal no momento seria requerer a íntegra dos documentos apresentados na terça pelo CEO das Americanas e a presença de especialistas.
“Entre a visão interna e a visão conselho criou-se R$ 3,5 bilhões de resultados. A fraude da Americanas é uma fraude de resultado”, resumiu Pereira.
“Não adianta trazer os diretores sem quebrar sigilos, quero acessar as conversas de WhatsApp entre eles” afirmou.
“Chamar os maiores suspeitos sem ter documentos informando [os parlamentares], isso só facilita a vida dos acusados”, acrescentou.
O escândalo da Americanas começou em janeiro deste ano, quando o então CEO Sergio Rial emitiu um fato relevante indicando a existência de inconsistências contábeis de cerca de R$ 20 bilhões nos balanços da empresa, se demitindo em seguida. Ele estava há menos de duas semanas no cargo.
O termo “inconsistências contábeis” foi utilizado até essa terça, quando as Americanas emitiram um novo fato relevante tratando o caso como uma fraude.
LUCAS MARCHESINI E VICTORIA AZEVEDO / Folhapress