BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central voltou a ignorar a pressão do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de empresários pela redução dos juros e manteve nesta quarta-feira (21) a taxa básica (Selic) em 13,75% ao ano.
O colegiado do BC suavizou levemente o comunicado ao descartar a mensagem que falava sobre a possibilidade de voltar a elevar a Selic se o processo de desinflação não transcorresse como esperado. No encontro anterior, já havia baixado o tom nesse ponto ao afirmar que um eventual aperto monetário seria um cenário menos provável.
Ainda assim, o comitê não sinalizou queda de juros à frente e disse que a conjuntura atual é caracterizada por um processo desinflacionário “que tende a ser mais lento e por expectativas de inflação desancoradas”. O comunicado defende que o cenário demanda “cautela e parcimônia” e reitera a necessidade de “paciência e serenidade”.
Além disso, a autoridade monetária defendeu seu plano de voo ao dizer que “a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado tem se mostrado adequada para assegurar a convergência da inflação”.
Apesar de mencionar a perspectiva de desaceleração da economia nos próximos trimestres e o recente arrefecimento da inflação cheia ao consumidor, o Copom antevê “uma elevação da inflação acumulada em doze meses ao longo do segundo semestre”.
Ao falar sobre os próximos movimentos, o Copom se limitou a dizer que as decisões dependem de diferentes variáveis. “Os passos futuros da política monetária dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos”, disse a instituição em seu comunicado.
A sustentação da Selic no atual patamar veio em linha com a projeção consensual do mercado financeiro de que os juros ficariam estáveis pela sétima vez consecutiva -a quarta desde o início da gestão petista. Levantamento feito pela Bloomberg mostrou que essa era a expectativa unânime entre os analistas consultados.
Antes da reunião, o BC voltou a ser alvo de críticas. Além da pressão de Lula e de seus ministros, um grupo de 51 integrantes do Conselhão (Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável da Presidência da República), dentre eles a empresária Luiza Heleno Trajano, escreveu uma carta aberta pedindo corte de juros. Houve ainda um protesto em frente ao prédio do BC em São Paulo, na terça-feira (20), promovido por centrais sindicais.
Os apelos levaram em conta que o cenário econômico doméstico apresentou melhora desde o encontro anterior do Copom, em maio, com desaceleração da inflação corrente e apreciação do câmbio -influenciada pela revisão da perspectiva do Brasil para “positiva” pela agência de classificação de risco S&P Global Ratings.
Em maio, o índice oficial de inflação do Brasil desacelerou para 0,23%, segundo dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). No acumulado em 12 meses, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) recuou para 3,94% a menor variação para o mês desde 2020.
No cenário de referência do Copom, as projeções de inflação para este ano melhoraram, caindo de 5,8% para 5% e, para 2024, recuaram de 3,6% para 3,4%.
Em seu balanço de riscos para a inflação, entretanto, o BC continuou com a avaliação de que permanecem fatores em ambas as direções. Entre os motivos que puxariam os preços para cima, destacou “alguma incerteza residual sobre o desenho final do arcabouço fiscal a ser aprovado pelo Congresso Nacional e, de forma mais relevante para a condução da política monetária, seus impactos sobre as expectativas para as trajetórias da dívida pública e da inflação, e sobre os ativos de risco”.
O colegiado também incluiu uma maior persistência das pressões inflacionárias globais e uma deterioração maior, ou mais duradoura, das expectativas de inflação para prazos mais longos.
Na direção contrária, o BC mencionou novamente a queda adicional dos preços das commodities, acrescentando que parte importante desse movimento já foi verificada. Falou também a possibilidade de uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada, puxada pelas condições adversas no sistema financeiro global, e uma desaceleração na concessão doméstica de crédito maior do que seria compatível com o atual estágio do ciclo de política monetária.
O ambiente mais favorável se traduziu em viés de queda nas expectativas de inflação nas últimas semanas. Segundo o boletim Focus, divulgado na segunda-feira (19), a projeção dos analistas para o IPCA deste ano foi revisada de 5,42% para 5,12%. Para o ano que vem, a expectativa caiu para 4%. Para 2025, a estimativa dos economistas está em 3,8% -acima do centro da meta.
A decisão do colegiado do BC foi tomada uma semana antes da reunião do CMN (Conselho Monetário Nacional), agendada para o dia 29, quando os ministros da Fazenda (Fernando Haddad) e do Planejamento e Orçamento (Simone Tebet), além do presidente do BC (Roberto Campos Neto), devem debater as metas de inflação.
O presidente Lula sinalizou anteriormente o desejo de mudar os alvos da autoridade monetária, enquanto Haddad defendeu um ajuste no horizonte da meta de inflação. Atualmente, os objetivos perseguidos pelo BC são 3,25% neste ano e 3% em 2024 e 2025, com intervalos de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.
No âmbito fiscal, o desenho definitivo da nova regra para controle das contas públicas ainda é dúvida. Com as mudanças promovidas pelo Senado, o texto voltará para a Câmara dos Deputados, que terá a palavra final sobre o arcabouço. Segundo o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), a votação ocorrerá na semana de 3 a 7 de julho.
Com 2024 na mira, o colegiado do BC volta a se reunir nos dias 1º e 2 de agosto para recalibrar o patamar da taxa básica.
O ciclo de alta de juros foi interrompido pelo Copom em setembro de 2022 depois de o BC promover o mais agressivo aperto da política monetária desde a adoção do sistema de metas para inflação, em 1999.
Foram 12 aumentos consecutivos entre março de 2021 e agosto do ano passado, com elevação de 11,75 pontos percentuais. A taxa básica saiu de seu piso histórico (2%) até atingir o nível atual de juros -o mais alto desde o fim de 2016.
NATHALIA GARCIA / Folhapress