SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em 2015, o professor Robert Waldinger participou de uma conferência TED Talks apresentando uma palestra chamada “O que torna uma vida boa? Lições sobre o mais longo estudo sobre felicidade”. Sete anos depois, o vídeo tem mais de 24 milhões de visualizações no YouTube, e ele se tornou autor de um livro sobre o assunto, que está na lista dos mais vendidos pelo New York Times.
Professor de psiquiatria na Universidade Harvard, Waldinger é o quarto diretor do “Estudo de Harvard sobre Desenvolvimento Adulto”, que existe desde 1938 e está em andamento até hoje. O trabalho é o maior que existe sobre o tema, e monitora questões sobre bem-estar, desenvolvimento e felicidade. Atualmente, a pesquisa está na segunda geração, composta pelos filhos dos primeiros participantes.
O segredo compartilhado por ele em entrevista à Folha de S.Paulo é o que chama a atenção: a chave para uma vida mais feliz e saudável são os relacionamentos que cultivamos.
Boas relações ajudam a reduzir os níveis de estresse e também influenciam na maneira como lidamos com dificuldades e situações desafiadoras.
Waldinger afirma que cultivar relacionamentos recíprocos, que contam com apoio mútuo e espaço para crescimento é o que traz mais felicidade. Por outro lado, passar muito tempo no trabalho é um constante arrependimento dos participantes do estudo.
Apesar disso, há também outros fatores que influenciam na saúde mental e sensação de felicidade e um deles pode ser dinheiro.
O pesquisador ressalta que ter muito dinheiro ou fama não tem relação direta com a felicidade. Contudo, a pobreza influencia na satisfação com a vida. Waldinger aponta que, enquanto alguém não tem as suas necessidades básicas garantidas, ser feliz e pleno com a sua vida é uma tarefa difícil.
A partir do momento em que necessidades como alimentação, moradia e educação estão garantidas, porém, ganhar mais dinheiro não significa mais felicidade. É aí que está a importância de cultivar bons relacionamentos, desde os amorosos até aqueles mais superficiais com os seus colegas de trabalho.
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P. – Quais as principais diferenças entre a forma como o estudo funciona hoje e quando ele começou, em 1938?
RW – Nós ainda perguntamos às pessoas sobre suas vidas, o que mudou. A diferença está na maneira como fazemos isso. Hoje, nós colhemos sangue, mapeamos DNA e fazemos exames de imagem dos cérebros dos participantes, por exemplo.
P. – O que você teria feito diferente se tivesse participado dos primeiros anos?
RW – Bom, eu teria incluído mulheres e mais diversidade desde o começo. Nós incluímos as mulheres depois, mas eu teria feito isso desde os primeiros momentos.
Boston, em 1938, era uma cidade quase que totalmente branca, então isso também é um fator. Mas seria bom ter mais diversidade [racial e de gênero] desde o início.
P. – Quais as principais diferenças entre as gerações envolvidas no estudo?
RW – Há mais coisas em comum do que diferenças, na verdade.
As pessoas da primeira geração do estudo cresceram em um contexto de guerra mundial, com muito sofrimento ao redor. Talvez as da segunda geração tenham tido uma infância mais tranquila, com menos depressão, pois o mundo estava mais calmo. Hoje, voltamos a viver situações mais conturbadas novamente.
P. – Qual a descoberta mais interessante?
RW – Para mim, é realmente a ligação dos relacionamentos com a saúde. O fato de que boas relações não te fazem apenas mais feliz, mas também mais saudável.
P. – E isso tem a ver com o estresse, certo?
RW – Sim. E bons relacionamentos também te fazem lidar melhor com situações estressantes.
P. – O que principalmente define uma vida feliz, segundo o estudo, é ter bons relacionamentos. O que classifica um relacionamento como positivo?
RW – Um bom relacionamento é recíproco, existe uma dinâmica de dar e receber. É uma relação onde existe apoio, troca e espaço para crescer e mudar também. As pessoas mudam, e numa boa relação existe acolhimento para essas novas versões.
P. – Ter pouco dinheiro tem influência na felicidade das pessoas?
RW – Sim. A pobreza tem um impacto negativo na felicidade das pessoas.
É comprovado que, enquanto você está se preocupando em se alimentar e satisfazer as suas necessidades básicas, isso influencia na sua saúde mental e sensação de felicidade. Contudo, a partir do momento em que as suas necessidades básicas estão garantidas, então não. Mais dinheiro não significa mais felicidade.
P. – Estamos reconhecendo agora que a família também ser sinônimo de relacionamentos tóxicos. Você tem conselhos sobre como lidar com isso?
RW – O ideal sempre é tentar melhorar essa relação de alguma forma, porque as relações familiares realmente podem ser algo muito forte e único. Então, tentar entender o que não está funcionando e dialogar para construir uma relação melhor é a melhor opção.
Se realmente não estiver funcionando e aquela relação for algo que te faz verdadeiramente mal, então em alguns casos realmente temos que nos afastar daquela pessoa.
P. – Normalmente, quando falamos sobre relacionamentos, as pessoas acreditam que as relações românticas são as mais importantes. Isso é verdade?
RW – Não necessariamente. Amigos, colegas de trabalho e família são igualmente importantes.
Na maior parte dos casos, pessoas que têm uma rede mais ampla e diversificada de relacionamentos são mais felizes. Você tem uma rede de segurança. É muito difícil que uma única pessoa possa te dar tudo que você precisa.
Há casos de pessoas que são muito felizes com o seu relacionamento romântico e não sentem essa necessidade, mas não são a maioria.
P. – Relações superficiais também são importantes?
RW – São relações muito importantes. Conhecidos, pessoas do trabalho.
Inclusive, é demonstrado que ter amigos no trabalho é muito importante e nos faz pessoas mais felizes. Nós trabalhamos melhor quando temos amigos no ambiente de trabalho. Apenas tomar um café e ter uma conversa agradável pode ser algo muito positivo.
P. – Quais os arrependimentos mais comuns dos participantes do estudo?
RW – O que os homens no estudo mais citam como arrependimento é terem passado muito tempo no trabalho e pouco com as pessoas que amam.
Muitas mulheres citam que gostariam de não ter se preocupado tanto com o que as pessoas estavam pensando.
P. – Você acha que isso pode mudar nas novas gerações?
RW – Acho que, com as redes sociais, isso é muito pior. As pessoas estão cada vez mais preocupadas com a sua imagem e com o que os outros estão pensando delas.
P. – É possível usar as redes sociais de maneira positiva?
RW – Nós podemos usar as redes sociais ativamente para nos conectar com as pessoas, e a partir daí encontrar com elas e ter relacionamentos na vida real.
Mas apenas ficar rolando o feed do Instagram, assistindo ao que os outros estão fazendo, não vai ser algo positivo a sua saúde mental.
GABRIELLA SALES / Folhapress