Daniela Carneiro passou de ativo a problema até ser demitida por Lula

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Indicada na última leva de nomes do primeiro escalão do governo Lula, a ministra Daniela Carneiro (Turismo) se transformou rapidamente de um ativo a um problema para o petista.

Nesta quinta-feira (6), o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, confirmou que ela deixará o cargo e que a União Brasil indicou o deputado Celso Sabino (PA) para o posto.

Vista como uma porta de entrada para o eleitorado marcadamente evangélico da Baixada Fluminense, em três dias de governo Daniela se transformou na pivô da primeira crise do terceiro mandato do petista. Na ocasião, o jornal Folha de S.Paulo revelou o vínculo do grupo político da ministra com milicianos.

A escolha de Lula foi feita após o empenho da deputada e de seu marido, o prefeito de Belford Roxo, Waguinho (Republicanos), em sua campanha no segundo turno.

O apoio não rendeu frutos eleitorais imediatos, já que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ampliou a vantagem sobre o petista na cidade. Mas Lula decidiu retribuir o esforço do casal, uma das poucas lideranças da Baixada Fluminense a apoiar abertamente o petista num estado governado pelo até então bolsonarista Cláudio Castro (PL).

O PT estava de olho na aproximação de uma região que o partido já dominou nas eleições anteriores, de Lula e Dilma Rousseff, perdido em 2018 quando Bolsonaro conseguir atrair o eleitorado evangélico.

A nomeação também foi uma forma de contemplar a União Brasil e ampliar a presença feminina na montagem dos ministérios. Após entrar em crise com o partido e pedir a desfiliação, Daniela perdeu a sustentação política que a mantinha no Turismo.

O potencial político se transformou em crise quando a Folha de S.paulo revelou o vínculo político de ao menos quatro anos de Waguinho e Daniela com o ex-PM Juracy Alves Prudêncio, conhecido como Jura, condenado e preso sob acusação de chefiar uma milícia na Baixada Fluminense.

O cenário se agravou após reportagens seguintes de diversos veículos apontarem a ligação com outros acusados de integrar grupos criminosos. Alguns deles estavam nomeados como secretários de Waguinho em Belford Roxo.

Em nota, a ex-ministra disse que o apoio político não significava compactuar com eventuais crimes cometidos por aliados.

“A ministra do Turismo, Daniela Carneiro, durante sua campanha, em 2018, recebeu apoio em diversos municípios. Ela ressalta que o apoio político não significa que ela compactue com qualquer apoiador que porventura tenha cometido algum ato ilícito. Daniela Carneiro salienta que compete à Justiça julgar quem comete possíveis crimes”, afirmava o texto enviado por sua assessoria de imprensa.

A nomeação para um cargo na prefeitura, a recepção como anfitrião num palanque comprovada com vídeo, e os relatos de ação armada dentro da Prefeitura de Waguinho não foram suficientes para abalar a gratidão do presidente.

Apesar dos vínculos evidentes, o governo se empenhou em tentar minimizá-los. Lula chegou a dizer que a ligação entre a ex-ministra e milicianos se resumia a fotos de campanha. “Por enquanto eu acho que não é maior do que isso. Se aparecer evidência que seja [maior do que uma foto], sairá do governo”, disse o presidente em fevereiro.

Formada em pedagogia, Daniela foi professora de ensino fundamental na rede pública do Rio de Janeiro e secretária de Assistência Social em Belford Roxo. Foi eleita deputada federal pela primeira vez em 2018, pelo MDB, com sua base política fortemente atrelada ao marido. Seu nome de urna foi “Daniela do Waguinho”.

Ela ganhou projeção ao se tornar a deputada mais votada na eleição do ano passado, com 213,7 mil votos. Daniela superou o general Eduardo Pazuello (PL-RJ), ex-ministro da Saúde de Bolsonaro, em pouco mais de 8.000 votos.

Como a Folha de S.Paulo mostrou em outubro, a campanha na cidade foi marcada pelo ambiente hostil, que teve seu auge num confronto no bairro Roseiral, no qual homens armados, entre eles um segurança de Waguinho, expulsaram militantes de uma candidata do local.

A campanha contou ainda com o apoio explícito de três oficiais da ativa da Polícia Militar, o que é proibido pelas regras da corporação.

Eles participaram de um ato de campanha da futura ministra em Rocha Miranda, zona norte da capital. Um dos oficiais é a tenente-coronel Daniele Neder, comandante do 39º Batalhão da PM, sediado em Belford Roxo.

Waguinho negou, em nota, ter cerceado a campanha de adversários. Daniela não retornou aos contatos feitos por meio de sua assessoria na ocasião da reportagem.

Os indícios de curral eleitoral armado não foram suficientes para inibir a busca por seu apoio. Os vínculos com a milícia também não bastaram para retirá-la do cargo. Foi preciso a necessidade de uma recomposição política a fim de obter base no Congresso para que Daniela deixasse o comando do Turismo no governo federal.

O casal deixará o governo, mas garante não abandonar o apoio a Lula. O petista sinalizou abrir espaço para o grupo de Waguinho na rede de Saúde do governo federal no Rio de Janeiro.

ITALO NOGUEIRA / Folhapress

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