Morre João Donato, que uniu bossa nova e música latina e revolucionou a MPB

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Morreu nesta segunda-feira (17) João Donato, um dos maiores nomes da história da música popular brasileira, aos 88 anos. Ele será velado na terça-feira (18) no Theatro Municipal do Rio de Janeiro e cremado no Memorial do Carmo, no Caju, bairro da região central da cidade.

Donato estava internado com pneumonia na Casa de Saúde São José, no bairro do Humaitá, e chegou a ser intubado há duas semanas. Ele deixa a mulher, Ivone Belém, e seus três filhos, Jodel, Joana e Donatinho.

Compositor de reconhecimento internacional, Donato é amplamente considerado um pianista brilhante. Com um estilo inconfundível de atacar as notas, fundiu as premissas estéticas da bossa nova a ritmos caribenhos, promovendo um diálogo entre a música brasileira e as tradições rítmicas do continente americano.

Num primeiro momento, suas composições até parecem simples. Escondem, no entanto, a ampla variedade de ritmos e a riqueza harmônica. Símbolo de seu procedimento criativo e um dos maiores sucessos da carreira, “A Rã” foi gravada pela primeira vez como “The Frog”, no disco “A Bad Donato”, de 1970.

Três anos mais tarde, a música, já em português, apareceu no disco clássico “Quem é Quem” e ganhou letra de Caetano Veloso e interpretação de Gal Costa no álbum “Cantar”, de 1974. No mesmo trabalho, Gal gravou também “Flor de Maracujá”, popularizando a composição de Donato com seu irmão caçula, Lysias Enio.

Em “Quem é Quem”, Donato já apresentava uma linguagem particular. Ao modo de João Gilberto, cantava baixinho, louvando em suas composições a natureza, o bem-estar, o aqui e o agora. Era feliz por viver nos trópicos e não perdia tempo com lamúrias, como diz em “Chorou, Chorou”. No disco, ainda ouvimos a interpretação clássica de “Mentiras” na voz de Nana Caymmi.

Antes, ele já havia lançado quatro discos -“Chá Dançante”, de 1956, “Muito à Vontade”, de 1962, “The New Sound Of Brazil” e “A Bossa Muito Moderna”, ambos de 1965. Em “The New Sound Of Brazil”, Donato gravou “Amazon”, um de seus maiores sucessos, que mais tarde ganharia o nome em português de “Amazonas” no álbum “Quem é Quem”.

Em 1975, o artista apresentaria “Bananeira” e “Emoriô” no disco “Lugar Comum”. As duas composições primavam pelo suingue latino, as melodias repetitivas e as letras que seguiam estritamente a cadência rítmica.

Donato também fez parcerias com Gilberto Gil nas músicas “A Paz” e “Lugar Comum”, com Caetano em “Surpresa” e com Chico Buarque em “Cadê Você?”.

Nascido em Rio Branco, no Acre, Donato conviveu com a música desde pequeno. Seu pai, um major da aeronáutica, tocava bandolim nas horas vagas. Sua mãe gostava de cantar, e a irmã mais velha sonhava em ser pianista. Aos 5 anos, Donato recebeu um acordeão de presente. Três anos depois, compôs sua primeira música, a valsa “Nini”.

Em 1945, a família se transferiu para o Rio de Janeiro, onde Donato passou a frequentar os bailes colegiais da Tijuca. Na época, tentou se tornar conhecido no programa de Ary Barroso, mas nem sequer foi escutado. Aos 17, Donato namorou Dolores Duran, que era mais velha. A diferença de idade causou polêmica, e o artista decidiu romper o relacionamento.

Donato se aproximou da bossa nova, participando dos fãs clubes Frank Sinatra-Dick Farney e Lúcio Alves-Dick Haynes. Com João Gilberto, compôs “Minha Saudade”, que seria incluída nas primeiras apresentações da bossa nova.

Em 1959, o violonista Nanai o convidou para uma turnê nos Estados Unidos. A banda era formada por músicos que acompanhavam Carmen Miranda em suas apresentações. Fez shows durante quatro semanas em cidades como Nevada e Lake Tahoe. Depois, ficou sozinho e sem dinheiro em Los Angeles, chegando a ser expulso do apartamento onde morava.

O baterista cubano Armando Pereza o ajudou com as dificuldades financeiras. Eles se reuniram a grandes nomes da música latina, como Johnny Martinez e Mongo Santamaria. Foi então que Donato se encantou pela musicalidade latina, sobretudo pelo mambo e pelo chá-chá-chá. Resolveu então unir os ritmos do caribe à música brasileira.

Em 1962, Donato voltou ao Brasil, mas o sucesso era tamanho, que ficou pouco tempo por aqui. Ele fez turnês pelo mundo, tocando com Chet Baker, Tito Puente e Rosinha Valença. Passou a ser idolatrado até mesmo no Japão. A partir de 1963, voltou a morar nos Estados Unidos, onde permaneceu por uma década.

Depois de um tempo afastado dos estúdios, Donato voltou a gravar. Em 2017, lançou, com o filho Donatinho, o disco “Sintetizamor”. Em parceria com Jards Macalé, criou em 2021 o álbum “Síntese do Lance”. No ano passado, lançou “Serotonina”, em que estabeleceu parcerias com músicos da nova geração, como as cantoras Céu e Anastácia.

Redação / Folhapress

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