SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O desenvolvimento do avião, que teve a participação do brasileiro Alberto Santos Dumont, deu origem a uma indústria bilionária, que deve lucrar US$ 9,8 bilhões em 2023, segundo estimativa da Iata (Associação Internacional de Transporte Aéreo).
No entanto, o setor segue concentrado no Hemisfério Norte. A América do Norte e a Europa, onde a renda é mais alta, responderam por quase 60% do mercado da aviação comercial em 2022. A América Latina respondeu por 6,4%, e a África, por 2,1%, segundo dados da entidade.
Nesta quinta (20), o nascimento de Santos Dumont completa 150 anos. Considerado o pai da aviação pelos brasileiros, ele fez o primeiro voo para uma grande público em Paris, em 1906, com seu 14 Bis.
Na época, vários inventores pelo mundo tentavam criar aparelhos mais pesados do que o ar e capazes de voar. Em 1903, os irmãos Wright inventaram um modelo que decolou com ajuda de uma catapulta.
A façanha, realizada em uma praia na Carolina do Norte, nos EUA, foi vista por poucas pessoas porque os Wright queriam guardar segredo e tentar criar um negócio a partir de sua invenção. Eles fizeram testes com vários modelos nos anos seguintes. Em 1908, fecharam o primeiro contrato para vender um avião ao Exército dos EUA e criaram uma empresa para fazer voos de exibição.
Até hoje, a aviação militar e a civil se desenvolvem lado a lado. “As grandes fabricantes ainda constroem aeronaves militares com base em tecnologia que pode ter vindo da aviação civil, e vice-versa”, comenta Markus Ruediger, diretor de comunicação da Iata.
A primeira linha aérea regular começaria a operar na Flórida, entre St. Petersburg e Tampa, em 1914, mas funcionou por apenas quatro meses e usava hidroaviões. Cada voo levava apenas um passageiro, que teria de pagar US$ 5 (que hoje equivaleriam a mais de US$ 100) pela viagem.
Meses depois destes voos na Flórida, começou a Primeira Guerra Mundial, que deu impulso à fabricação de aviões. Inicialmente, eles eram usados para espionar o inimigo e depois para ataques e combates. Ao final do conflito, em 1918, modelos usados na guerra para fins de transporte e que sobraram foram vendidos pelos governos para empresários, que começaram a criar linhas aéreas.
No entanto, as empresas pioneiras tinham dificuldades financeiras por falta de passageiros. A solução veio com a ajuda de governos, como o dos Estados Unidos, que contrataram as aéreas para transportar correspondência. Isso gerou uma receita garantida e estável, que permitiu a expansão dos serviços.
Nos anos 1920, vieram avanços como motores mais potentes e fuselagens mais elaboradas, feitas de alumínio em vez de madeira. Foi também a era das aventuras aéreas, como as primeiras travessias do Atlântico.
Em 1922, Gago Coutinho e Sacadura Cabral viajaram de Lisboa ao Rio de Janeiro, em uma longa jornada de 79 dias, que incluiu várias paradas, problemas e trocas de aeronave. Cinco anos depois, em 1927, foi mais fácil: Charles Lindbergh viajou sozinho de Nova York a Paris, em 33 horas e meia sem escalas.
Também em 1927, começaram a operar as primeiras companhias do Brasil, a Condor e a Varig, com voos no Sul do país. Dois anos depois, já haveria um trajeto Nova York-Rio-Buenos Aires, com muitas escalas pelo caminho, para reabastecimento, como era necessário na época.
Na década de 1930, mais novidades: os aviões passaram a usar mais a tecnologia do rádio para se comunicarem entre si e com os controles aéreos, o que facilitou a navegação e aumentou a segurança. Surgem também modelos maiores, como o Douglas DC-3, capaz de levar 21 passageiros e que se tornou o avião comercial mais comum na época.
Durante a Segunda Guerra, a produção de aviões disparou e os modelos foram ficando mais rápidos e capazes de levar mais carga e passageiros. Ao final do conflito, houve um novo boom da aviação civil.
Na década seguinte, as companhias passaram a adotar aviões com motores a jato, que geram mais força para mover o veículo e menor consumo de combustível. Isso levou à criação de voos mais longos e com menos escalas, e aeronaves cada vez maiores.
Para atrair mais passageiros, as empresas buscaram aumentar os serviços a bordo, como servir refeições e bebidas, para dar à aviação uma aura de glamour.
A chegada de aviões maiores permitiu às empresas levarem mais viajantes e, assim, tornar as passagens mais acessíveis. Em 1964, a Boeing lançou o 737, o modelo mais bem-sucedido da aviação comercial e ainda em produção. Ele é capaz de levar mais de 200 passageiros. Poucos anos depois, a empresa americana lançaria o 747, conhecido como Jumbo, capaz de levar mais de 400 viajantes e de cruzar continentes.
“Uma das mudanças que mais expandiram o mercado foi o 747, que permitiu às aéreas reduzir custos e abrir novos mercados, como o transatlântico, para muito mais pessoas”, diz Ruediger.
Nas últimas décadas do século 20, os aviões comerciais receberam mais sistemas de automatização e motores mais econômicos, muito desejados pelas empresas para gerar economia com combustível.
Com o avanço, aviões mais modernos, como o 777, são capazes de cruzar continentes operam só com dois motores, em vez de quatro, como o 747. “Outra tendência é que aviões mais estreitos, de um corredor só, consigam fazer voos cada vez mais longos”, aponta Ruediger.
Neste começo de século 21, houve também o avanço de empresas de baixo custo, em regiões como Europa e América do Norte, conforme houve desregulamentação dos mercados e avanço da tecnologia, como a possibilidade de comprar bilhetes diretamente pela internet e poder exibi-los no celular.
“Há 30 anos, era preciso comprar passagens com agentes de viagem, os sistemas de computador para as reservas eram limitados, isso aumentava os custos”, diz Ruediger. “A aviação já foi algo para poucos, mas houve uma democratização. Mesmo na América Latina, muito mais pessoas voam hoje do que há 30 anos, porque a tecnologia reduziu o custo de transporte por passageiro.”
RAFAEL BALAGO / Folhapress