Compra da Braskem pode ser afetada por ciclo de baixa da indústria química

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As indústrias químicas globais entram agora em um ciclo de baixa, com pressão nas margens das companhias do setor, o que pode afetar as ofertas e o processo de compra da empresa petroquímica Braskem, segundo analistas.

A cada três anos, em média, o setor químico muda de ciclo, o que está ligado ao investimento para expansão das plantas das indústrias. Quando essas fábricas começam a operar, aumenta de uma só vez a oferta de produtos no mercado, o que derruba os preços e reduz o lucro das companhias. O setor está atravessando justamente esse período.

“As capacidades produtivas da indústria química são sempre colocadas acima do mercado existente. Então, quando há investimentos, eles são feitos em grande escala, planejados para 10 a 15 anos. Só que essa capacidade entra no mercado de uma vez só”, afirma André Passos Cordeiro, presidente-executivo da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química).

Por outro lado, o setor enfrenta um aumento de preços dos insumos, que são derivados do petróleo, elevando os custos para essas empresas. As indústrias químicas têm um ciclo descasado com outro, o de óleo e gás, que é essencial para a produtividade dessas companhias.

“Os preços dos insumos não acompanham os ciclos da indústria química. Porque o setor de óleo e gás tem outra dinâmica. E agora esses insumos estão com preço elevado. O barril do petróleo está valendo US$ 80. Só que o barril já esteve historicamente na casa dos US$ 30 a US$ 40”, diz Cordeiro.

Segundo o presidente da Abiquim, a guerra na Ucrânia, que causou um choque nos preços de commodities e fez disparar o barril de petróleo, é um agravante para o atual ciclo de baixa do setor químico.

Para o analista e especialista em óleo e gás Mateus Pazin Haag, da Guide Investimentos, esse cenário é positivo para as companhias que têm ofertas de compra da Braskem, pois o interesse aumenta quando as empresas estão mais baratas.

Haag acredita que uma queda grande nas margens da Braskem pode, inclusive, elevar o número de ofertas de compra.

Um especialista em fusões e aquisições, que preferiu não se identificar por estar envolvido com uma das partes do negócio, diz que esse cenário de baixa das indústrias pode ser uma oportunidade para os interessados na Braskem.

O que analistas dizem é que o comportamento de preços das indústrias químicas já é algo esperado pelo mercado, então, em parte já está embutido no valor atual dos papéis da companhia.

No ano, a ação preferencial classe A da Braskem avança 7%, valendo cerca de R$ 25, mas recua mais de 25% em 12 meses. Os papéis ordinários sobem quase 4% neste ano, a R$ 26, mas também caem 25% no acumulado de 12 meses.

Mesmo com o mercado tendo já precificado esse ciclo de baixa, como as ofertas pela Braskem que estão em jogo foram feitas com base na avaliação da empresa durante o período de alta do fluxo de caixa, se a companhia for muito afetada pela baixa do setor, isso pode ser objeto de negociação após todas as partes entrarem em acordo sobre a compra da companhia.

“O mercado muda muito durante a negociação. Ainda tem diligência para ocorrer, tem contrato final para ser negociado. Então, até ser assinado o contrato vinculante definitivo, a operação pode voltar para trás. E dependendo de como o contrato foi assinado, a operação ainda pode ser revista”, diz o analista Ivan Barboza, sócio fundador da Ártica Investimentos e especialista em fusões e aquisições.

Acontece que existe uma cláusula nesses contratos de aquisição prevendo uma mudança material adversa. Essa cláusula é aberta e depende de sua construção. Mas pode ser decidido que uma alteração muito grande de mercado é considerada uma mudança material adversa. Dependendo dos termos assinados, portanto, a operação pode abrir de novo mesmo após o contrato assinado.

“A gente brinca que, um M&A [sigla em inglês para fusões e aquisições] só fecha quando o dinheiro cai na conta. Só aí que é praticamente irreversível”, diz Barboza.

ENTENDA O IMBRÓGLIO DA VENDA DA BRASKEM

A Braskem hoje é controlada pela Novonor —antiga Odebrecht—, que detém 38,3% do capital total da empresa, e pela Petrobras, que possui 36,1% da companhia

A Novonor, afetada pelos desfechos da Operação Lava Jato, está em processo de recuperação judicial desde julho de 2020 —o pedido de recuperação contemplava uma dívida de R$ 51 bilhões de créditos concursais na época.

No ano passado, a companhia deu as ações que detém na Braskem como garantia de empréstimos bancários que totalizam R$ 14 bilhões.

A venda da Braskem, portanto, envolve interesses de três partes —da própria petroquímica, dos credores da Novonor e da Petrobras.

Esta última, por sua vez, pode exercer o seu direito de preferência e cobrir as ofertas pela Braskem ou vender sua fatia pelo mesmo preço aceito pela Novonor. Até agora, J&F, Unipar e o fundo árabe Apollo, juntamente com a petroleira estatal de Abu Dhabi, Adnoc, ofereceram propostas de compra da petroquímica.

A Petrobras ainda não se manifestou sobre as ofertas apresentadas. Na semana passada, em evento com jornalistas, o presidente das estatal, Jean Paul Prates, disse que esse silêncio faz parte da estratégia da companhia. Em comunicados ao mercado, a petroleira vem dizendo que ainda não tem uma posição sobre um eventual desinvestimento ou aumento de capital na Braskem.

Para a diretoria da Petrobras, o imbróglio está longe de ser resolvido. “Os bancos não se pronunciaram, nem os credores, nem a Novonor se pronunciou”, disse o diretor Financeiro da estatal, Sérgio Caetano Leite, a jornalistas.

STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress

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