Ribeirão Preto sai na frente no combate ao racismo nas escolas

Imagem ilustrativa | Foto: Rede social

A rede municipal de educação de Ribeirão Preto, em trabalho de combate ao racismo e à discriminação racial no cotidiano escolar da cidade, inaugurou o primeiro Centro de Referência em Educação para as Relações Étnico-Raciais da América Latina.

Localizado no Campos Elíseos,  bairro da região norte do município, o Centro, inaugurado em janeiro, é responsável por apoiar ações da rede municipal no desenvolvimento de práticas de conscientização em razão da discriminação étnico-racial.

A partir de sua criação, instituiu-se no currículo o ensino de História e da Cultura afro-brasileira, africana e indígena e das demais etnias que formam a população ribeirão-pretana.

O Centro também colabora com a adequação dos Projetos Políticos Pedagógicos das unidades escolares e garante a formação continuada de docentes, gestores, equipes técnicas e demais profissionais da rede municipal de ensino.

Cenário nacional

No Brasil, o ensino fundamental público brasileiro registrou uma melhora nos indicadores de aprendizado nos últimos anos, mas, em contrapartida, o movimento veio acompanhado de uma piora nas desigualdades entre alunos negros e brancos, com agravamentos regionais.

Baseado em resultados do Saeb, a avaliação federal da educação básica, um estudo do Insper mostra que, apesar da leve melhora no desempenho geral dos estudantes, meninas e meninos pretos estão em desvantagem ainda mais aguda.

Os dados levam em conta os resultados das provas de português e matemática feitas por alunos ao fim dos anos iniciais (1º ao 5º ano) e dos anos finais (6º ao 9º) do ensino fundamental. Analisou-se resultados entre 2007 e 2019, período anterior à pandemia.

Em matemática, por exemplo, os meninos brancos tinham, em 2007, uma vantagem de 9,1 pontos sobre as meninas negras (que considera quem se autodeclarou preta ou parda). Esse hiato foi para 13 pontos em 2017.

No 9º ano, essa diferença era de 21,3 pontos em 2007 e foi para 23,4, em 2017, segundo dados do estudo, que realizou ponderações estatísticas nos resultados do Saeb para efetuar comparações seguras.

Estudantes pretos têm ficado ainda mais para trás na comparação com brancos e pardos. Ao fim do ensino fundamental, no 9º ano, a média dos meninos pretos ficavam 16,6 pontos abaixo das meninas pardas em 2007. Essa distância chegou a 20,5 pontos em 2017 –ao comparar com meninas brancas, o abismo passou de 28 para 32,4 pontos.

Já em matemática, são as meninas pretas que têm as maiores desvantagens. Em 2007, a média delas era 14,6 pontos menor que a dos meninos pardos e 25,9 abaixo da nota de meninos brancos. Dez anos depois, os resultados do Saeb mostram uma distância das meninas pretas de 20,3 para meninos pardos e 30,2 pontos para brancos.

O pesquisador Michael França, autor do estudo ao lado de Gerrio Barbosa e Alysson Portella, diz que os resultados são um reflexo das desigualdades sociais e da discriminação.

“As políticas educacionais não podem olhar só para as médias de desempenho, porque isso é deixar pessoas para trás. A sociedade precisa convergir para políticas que olhem para a equidade, para o combate da distância dos piores para os melhores”, diz ele, que coordena o Núcleo de Estudos Raciais do Insper.

França afirma que as evidências mostram que escolas com alunos mais pobres e com maior predominância de negros contam com maiores deficiências pedagógicas. Também há indicações que professores reforçam estereótipos raciais, sempre em desvantagem para negros.

Os achados deste estudo indicam parte dos problemas das desigualdades raciais na educação. Não refletem desigualdades entre alunos da mesma escola, por exemplo. Além disso, abandono e evasão escolar são problemas que também afetam crianças e adolescentes negros com mais força.

Zara Figueiredo, secretária de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação, afirma que o Brasil nunca teve princípios de ações afirmativas para busca da igualdade na educação básica. A forma como se distribui os bens sociais e pedagógicos na educação básica é essencial nesse ponto, diz ela.

“A sociedade se escandalizou com episódios como o de racismo vivido pelo jogador Vinicius Junior, mas por que ninguém se escandaliza com esses dados que mostram que meninos negros têm anos de aprendizado de diferença?”, diz ela. “Naturalizamos essa faceta do racismo.”

Desafios

À frente da subpasta do MEC recriada pelo governo Lula (PT) para ter foco nessas questões, Figueiredo diz que o desafio de focar no combate às desigualdades passa pelas regras de direcionamento de recursos, desenho das avaliações (para que expresse os hiatos), gestão de alocação de docentes em escolas prioritárias e também formação.

A secretária tem tido assento em reuniões de diferentes áreas do MEC para que as ações se estruturem em torno desses princípios. A pasta deve criar, por exemplo, linhas de equidade para os principais mecanismos de transferências federais para redes de ensino.

“As escolas e redes vão precisar apresentar ações de gestão para lidar com as desigualdades”, diz ela.

O MEC e a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) recriaram na última semana o Programa de Desenvolvimento Acadêmico Abdias Nascimento. O projeto inclui R$ 600 milhões para ações afirmativas na pós-graduação e na formação de professores para a educação básica.

Há foco em formações para estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas, alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades. São previstos fomento a projetos com as temáticas de promoção da igualdade racial, combate ao racismo, difusão do conhecimento da história e cultura afro-brasileira e indígena, educação intercultural, acessibilidade e inclusão.

**Colaboração de Paulo Saldaña / Folhapress

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