BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central anunciou nesta quarta-feira (2) o primeiro corte de juros no governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com a redução da taxa básica (Selic) em 0,5 ponto percentual, de 13,75% para 13,25% ao ano. Houve divergências entre os diretores sobre o tamanho da redução e o placar final ficou apertado (5 votos a 4).
Alvo de críticas recorrentes de Lula, o presidente do BC, Roberto Campo Neto, deu o voto final e decisivo pela redução. A parte minoritária dos diretores votou na reunião por um corte menor, de 0,25 ponto percentual.
O chefe da autoridade monetária se juntou aos primeiros diretores indicados pelo petista Gabriel Galípolo (Política Monetária) e Ailton Aquino (Fiscalização), além de Carolina Barros (Administração) e de Otávio Damaso (Regulação).
Os votos divergentes foram de Diogo Guillen (Política Econômica), Maurício Moura (Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta), Fernanda Guardado (Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos) e Renato Dias Gomes (Organização do Sistema Financeiro e Resolução).
O colegiado do BC também antecipou que prevê um novo corte de 0,5 ponto percentual no próximo encontro, nos dias 19 e 20 de setembro, e de mesma magnitude nas reuniões seguintes.
“Em se confirmando o cenário esperado, os membros do comitê, unanimemente, anteveem redução de mesma magnitude nas próximas reuniões e avaliam que esse é o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário”, disse o BC, em comunicado.
O comitê afirmou ter avaliado a alternativa de fazer um corte mais conservador no primeiro movimento, de 0,25 ponto percentual, mas considerou ser “apropriado” adotar uma redução de 0,50 ponto percentual nesta reunião.
“O comitê avalia que a melhora do quadro inflacionário, refletindo em parte os impactos defasados da política monetária, aliada à queda das expectativas de inflação para prazos mais longos, após decisão recente do Conselho Monetário Nacional sobre a meta para a inflação, permitiram acumular a confiança necessária para iniciar um ciclo gradual de flexibilização monetária”, disse o BC.
No cenário de referência do Copom, as projeções de inflação para este ano melhoraram, caindo de 5% para 4,9% e, para 2024, se mantiveram em 3,4%. Para 2025, a estimativa é de 3%
Com essa decisão, o BC abre o ciclo de flexibilização monetária três anos depois do último movimento de queda da taxa básica. Em agosto de 2020, a Selic foi levada ao piso histórico de 2% em meio à pandemia de Covid-19.
A Selic ficou um ano parada no patamar de 13,75%, apesar da pressão do governo Lula e das críticas de empresários, depois de o BC ter promovido o mais longo choque de juros da história do Copom. Foram 12 aumentos consecutivos entre março de 2021 e agosto do ano passado, com elevação de 11,75 pontos percentuais.
A autoridade monetária brasileira, que saiu na frente de outros BCs no ciclo de alta de juros, toma agora a dianteira na América Latina ao lado do Chile no processo de afrouxamento.
O tamanho do corte feito pelo Copom não veio em linha com a expectativa majoritária do mercado financeiro, mas era considerado por parte dos economistas como uma possibilidade.
Levantamento feito pela Bloomberg mostrou que a maioria dos analistas esperava uma queda de 0,25 ponto percentual, a 13,50% ao ano, enquanto uma parcela menor projetava uma redução de 0,5 ponto percentual.
O movimento feito pelo colegiado correspondeu pela primeira vez aos apelos do governo Lula, que vinha pressionando o BC por um corte de 0,5 ponto percentual da Selic.
Horas antes da decisão do Copom, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse que havia “um espaço importante” para queda de juros. Já o presidente Lula atacou novamente Roberto Campos Neto, chamando o chefe do BC de “rapaz” que “não entende de Brasil”.
Desde o último encontro, em junho, houve uma melhora tanto no ambiente econômico doméstico, com desaceleração da inflação corrente e apreciação do câmbio, quanto nas expectativas dos agentes do mercado financeiro.
O índice oficial de inflação do Brasil (IPCA) atualizado será conhecido apenas no dia 11 de agosto. De acordo com o último dado disponibilizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a alta acumulada em 12 meses desacelerou para 3,16% até junho.
O IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15), que sinaliza uma tendência para os preços, teve queda de 0,07% em julho, com recuo dos preços de energia elétrica e alimentos.
Quanto à percepção dos economistas, o boletim Focus mostra que a projeção para o IPCA deste ano foi revisada de 5,12% para 4,84% desde a reunião anterior do Copom até a última segunda-feira (31).
Para o ano que vem, a expectativa caiu de 4% para 3,89%. A estimativa dos analistas para 2025 baixou de 3,8% para 3,5% ainda acima do centro da meta (3%).
A revisão positiva nas projeções para prazos mais longos foi impulsionada pela definição do CMN (Conselho Monetário Nacional) pela manutenção da meta de inflação de 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos, no modelo de alvo contínuo a partir de 2025.
Em seu balanço de riscos para a inflação, o BC continuou com a avaliação de que permanecem fatores em ambas as direções. Entre os motivos que puxariam os preços para cima, menciona a persistência das pressões inflacionárias globais e uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada.
Na direção contrária, o comitê mencionou a desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada, em particular em função de condições adversas no sistema financeiro global e os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado.
O BC tirou a menção sobre “alguma incerteza residual sobre o desenho final do arcabouço fiscal” e os impactos da nova regra “sobre as expectativas para as trajetórias da dívida pública e da inflação, e sobre os ativos de risco”.
O desenho definitivo da nova regra para controle das contas públicas, entretanto, continua sendo dúvida. Com as mudanças promovidas pelo Senado, o texto voltou para a Câmara dos Deputados, que terá a palavra final sobre o arcabouço. Como mostrou a Folha, a retomada da discussão deve ficar para a próxima semana.
Segundo o comitê, a intensidade total do ciclo de flexibilização de juros dependerá de diferentes variáveis.
Ele cita “evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto [margem que a atividade tem para crescer até atingir sua capacidade máxima] e do balanço de riscos.”
NATHALIA GARCIA / Folhapress