Surfistas brasileiros perdem casa em incêndio no Havaí: ‘parecia guerra’

SANTOS, SP (UOL/FOLHAPRESS) – Incêndios florestais de enorme proporção mataram pelo menos 36 pessoas na ilha de Maui, no Havaí (EUA). Alguns moradores precisaram entrar no mar para se proteger do fogo.

A reportagem conversou com Pedro Robalinho e Yuri Soledade, surfistas brasileiros que moram em Maui há anos e vivenciaram bem de perto o drama na ilha havaiana.

O QUE ACONTECEU

Pedro Robalinho mora em Lahaina desde 2016 e teve sua casa destruída pelo fogo. Ele perdeu dois carros e cerca de 50 pranchas, além de roupas e um HD cheio de imagens e vídeos de surfe.

Ele, a mulher e as duas filhas, de 9 e 12 anos, precisaram evacuar a casa e encararam um enorme trânsito para deixar o local. Agora eles estão na casa de amigos, em outra região da ilha.

Eles chegaram a temer a morte e tiveram de deixar muita coisa para trás. “A coisa foi se estendendo e vimos uma fumaça preta vindo do centro em direção onde a gente mora. Ali foi o choque. Eu olhei pra minha mulher e falei: ‘Caramba, a gente vai ter que meter o pé agora. Se essa fumaça chegar na gente, a gente morre asfixiado’. Era muito fogo”.

“Consegui só pegar minha mochila com um iPad novo, meu celular, documentos e um pouco de dinheiro… Poucas coisas. Não deu muito tempo. A gente jogou o que deu no carro e saímos fora. E já estava muito trânsito pra sair dali. Me passou até o Titanic na cabeça. Não adianta querer voltar para buscar alguma coisa e adiar a sua fuga, e até acontecer uma desgraça. Nessa hora você nem pensa. Só quer sair dali e salvar a sua família”, disse Robalinho.

Yuri Soledade mora perto de Lahaina e perdeu um dos restaurantes de sua rede no Havaí. Ele foi até o local de barco e pôde presenciar o enorme prejuízo.

Yuri e a família passam bem e ele já conseguiu falar com a maioria dos funcionários dos restaurantes. “O restaurante foi queimado até o chão. Tive que ir de barco para poder chegar lá e acompanhar a procura de algumas pessoas que estão desaparecidas. Já recebi notícia da maioria dos meus funcionários e só estão faltando algumas pessoas”.

“Foi muito duro ver tudo isso. Algumas pessoas morreram dentro do carro e encontrei pessoas totalmente desesperadas, parecendo que estavam numa guerra e que a bomba atômica destruiu tudo”, afirmou Yuri.

COMO O INCÊNDIO COMEÇOU

Os incêndios florestais ganharam força diante da vegetação seca e da baixa umidade —segundo o Serviço Nacional de Meteorologia dos EUA— e foram alimentados pelos fortes ventos do furacão Dora.

Os incêndios começaram na terça-feira (8), o que deixou em perigo residências, empresas e serviços públicos, assim como mais de 35 mil pessoas na ilha de Maui, onde fica Lahaina, informou a Agência de Gestão de Emergências do Havaí.

As chamas queimaram mais de 800 hectares, segundo a agência. Lahaina, cidade de quase 12 mil habitantes no noroeste de Maui, foi a mais afetada. Estradas e escolas foram fechadas por causa do incêndio.

“A gente estava tendo um verão muito seco, então estava bastante propenso aos fogos. O fogo começou em várias regiões e, como temos uma certa limitação de equipes de bombeiros e equipamentos, eles estavam cuidando do fogo em outras áreas. Quando começou em Lahaina, não havia um preparo. O fogo veio e o vento contribuiu para que o incêndio se espalhasse muito rápido. Em questão de poucas horas destruiu tudo”, diz Yuri.

QUEM É PEDRO ROBALINHO

Carioca, Pedro Robalinho tem 47 anos e frequenta o Havaí desde 2003. Ele mudou de vez para Maui em 2016 e vive com a mulher Rafaela Bentes, de 37 anos, e os filhos, Mila, de 9, e Alana, de 12.

Treinou nomes de peso do surfe tanto no cenário nacional quanto internacional, como Léo Neves, Rodrigo Dornelles, Pedro Henrique e Silvana Lima, vice-campeã mundial. Hoje treina Imaikalani deVault, uma das maiores revelações do surfe no Havaí e que fez parte da elite do circuito mundial de 2022.

É professor de Educação Física e criador do CADES, o Centro de Aprendizagem e Desenvolvimento do Surf.

QUEM É YURI SOLEDADE

É um dos Mad Dogs, trio de surfistas baianos que estendeu os limites do surfe no Havaí ao começar a surfar a onda de Jaws, uma das maiores do mundo, na remada, sem o auxílio de equipamentos. Danilo Couto e Márcio Freire —que perdeu a vida no começo do ano surfando as ondas gigante de Nazaré, em Portugal— completam o trio.

Mora em Maui há quase 30 anos e tem uma rede de restaurantes no Havaí, o Paia Fish Market. São quatro unidades em Maui e duas em Oahu.

Começou a pegar onda aos 10 anos, em Olivença, na Bahia, e é uma das maiores referências do surfe mundial de ondas gigantes.

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O QUE MAIS ELES DISSERAM

PEDRO ROBALINHO

Autoridades erraram?

“Aqui é muito comum ter um sistema de aviso muito bom, mas, dessa vez, por algum motivo, acho que as autoridades não conseguiram compreender o tamanho do risco, e as coisas foram acontecendo de uma maneira que trouxe risco nesse nível e causou essa catástrofe sem precedentes em Maui. O incêndio foi muito brabo. Foram muitos focos distintos na ilha toda”.

Incêndio inesperado.

“Não imaginava quando o dia começou que isso podia acontecer. A gente passou por muitos vendavais, eu até já tinha tirado o meu carro pra evitar que a árvore caísse em cima. O vento estava muito violento mesmo. Foi ficando assustador”.

Impossível ter sobrado alguma coisa

“Já vi umas fotos aéreas do lugar e é praticamente impossível ter sobrado alguma coisa. Perdi em torno de 50 pranchas, várias daquelas de dar aula para iniciante. Dois carros queimados, toda roupa, a casa toda…”

Cidade em choque

“Está todo mundo muito em choque. A cidade vai demorar um tempão para se reconstruir. Venho aqui desde 2003, moro desde 2016. Dói o coração, é a nossa cidade que queimou. É virar essa página aí e tornar a comunidade ainda mais forte e mais unida”.

Hora de ser forte

“É olhar pra frente e não se apegar muito às coisas materiais. As coisas da vida são a amizade, os amores, são muito mais importantes. Tá difícil falar de tudo, mas essa é a hora de ser forte”.

YURI SOLEDADE

Cultura havaiana destruída

“A cidade foi totalmente destruída e várias coisas históricas que faziam parte da cultura do estado havaiano queimaram. Foi superdifícil ver tudo aquilo, os carros queimados…”

MARCELLO DE VICO / Folhapress

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