BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente Lula (PT) se irritou com o fato de a ruidosa operação da Polícia Federal que mirou o esquema de venda e recompra de joias do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ter ofuscado na última sexta-feira (11) a festa de lançamento do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
Apesar de o ministro Flávio Dino (Justiça) não ter gestão sobre as operações da PF, ele virou alvo direto de críticas durante a cerimônia, em particular de Lula, que demonstrou irritação.
Dino não estava na solenidade no Rio e qualquer ação dele para desviar a operação da PF do lançamento do PAC seria uma interferência direta na Polícia Federal, o que seria ilegal.
Lula reagiu em suas redes sociais meia hora após a publicação desta reportagem: “Não estou nada irritado com @FlavioDino. Pelo contrário, ele tem feito um excelente trabalho. Seria o que eu teria dito para a @folha se ela tivesse me perguntado sobre o assunto.”
Segundo presentes ao evento do PAC, colegas de ministério chegaram a reclamar de Dino, a ponto de associar a ação da PF a um suposto descontentamento do titular da Justiça com a ausência, no PAC, do Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania).
Na manhã daquele dia, a PF cumpriu mandados de busca e apreensão que miraram o entorno de Bolsonaro no caso das joias enviadas ao ex-presidente por autoridades sauditas. A ação foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).
A operação aconteceu cerca de três horas antes do lançamento do Novo PAC, dominando o noticiário. A coincidência da data colocou em segundo plano a solenidade do Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
Entre os alvos da PF estavam o general da reserva do Exército Mauro Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, e Frederick Wassef, advogado de Bolsonaro o que monopolizou também as redes sociais.
Segundo aliados, Lula manifestou sua contrariedade no momento. Mas não tocou no assunto em uma conversa que manteve com o ministro da Justiça no início desta semana.
A operação da PF naquele mesmo momento não foi o único alvo de descontentamento do presidente, que se queixou publicamente do tamanho dos discursos dos que o antecederam.
Lula iniciou sua fala afirmando que apresentaria um decreto determinando que o presidente seja o primeiro a discursar durante as cerimônias oficiais.
O mandatário também deixou clara sua irritação com as vaias de petistas durante discursos de demais autoridades. O comportamento de seus apoiadores turvou a festa.
A presença de militantes levados a convite da Secretaria-Geral da Presidência também teria contrariado o perfil idealizado para a solenidade, desenhado para contar com a participação de empresários, governadores, parlamentares e autoridades locais.
Secretário-geral da Presidência, Márcio Macedo atribui a crítica a fogo amigo. Ele diz ser natural a presença de representantes dos movimentos sociais na solenidade, lembrando que também fazem parte da execução do PAC.
“Compreendo as manifestações. Mas concordo com a avaliação do presidente. Todos ali eram nossos convidados e deveriam ser tratados com cordialidade”, disse Macedo.
Embora reconhecendo que a ação da PF tenha rivalizado com o lançamento do Novo PAC, a secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior, ressaltou o sucesso da solenidade. Ela disse que a estratégia de divulgação não se resumia à agenda nacional.
Apontada como uma das responsáveis pelo PAC, a ex-ministra lembrou que o lançamento repercutiu, regionalmente, com anúncio de investimentos locais. Belchior disse ainda que a solenidade também ocupou espaço no noticiário local.
Sobre a coincidência da data da operação, ela disse que o fato de o governo não ser informado previamente das ações policiais deve ser recebido como uma boa notícia. “Devemos saudar que a democracia esteja sendo respeitada no Brasil”, disse ela.
No lançamento, Lula fez acenos a políticos de diversos partidos, pediu mais dinheiro para ampliar o programa e falou sobre a volta de um Estado empresarial e indutor do crescimento.
Os investimentos totais, considerando o Orçamento da União, dinheiro das estatais e recursos privados, estão estimados em R$ 1,7 trilhão, sendo R$ 1,4 trilhão até o fim do mandato de Lula e outros R$ 300 bilhões após 2026.
“Se tiver novos projetos e alguém estiver disposto a ajudar, esse R$ 1,7 trilhão pode crescer para R$ 2 trilhões ou mais. E, se o [ministro Fernando] Haddad [Fazenda], abrir um pouco a mão, pode até ter um pouco mais de dinheiro para a gente fazer mais coisas neste país”, afirmou.
CATIA SEABRA E MARCELO ROCHA / Folhapress