SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Tá quase fechado, tá faltando pouco. Podemos dizer que [somos] noivos já?”, pergunta o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), sobre o apoio à tentativa de reeleição de Ricardo Nunes (MDB) em São Paulo em 2024. O prefeito paulistano, ao lado, sorri e não diz o tão esperado sim.
Bolsonaro costuma aplicar metáforas com termos de relacionamentos amorosos para seus arranjos políticos. No caso de Nunes, o flerte já vem acontecendo há meses, com direito a encontros, almoços e fotografias.
A oficialização do relacionamento, porém, não parece ter prazo para acontecer.
O principal ponto que tem barrado o “casamento’ é a escolha do vice da chapa. Achar um nome passa pela dificuldade de conciliar alguém que seja aceito por Nunes, Bolsonaro, os chamados bolsonaristas raiz e o partido do ex-presidente, o PL.
Por ora, todos parecem concordar ao menos que a união é o caminho mais fácil para impedir a vitória do deputado federal Guilherme Boulos (PSOL) na cidade de São Paulo.
O consenso é que a direita tem um desafio para vencer na cidade, onde em 2022 a maioria votou nos petistas Lula para presidente e Fernando Haddad para governador.
Com base na avaliação de que sozinha a direita não avançaria, bolsonaristas raiz deixaram isolado o ex-ministro Ricardo Salles, que pretendia ser candidato a prefeito. Por isso, decidiu-se que o apoio a Nunes seria a melhor solução.
Do lado do prefeito, a avaliação é a de que ele pode ficar fora do segundo turno, caso Bolsonaro resolva lançar um aliado mais próximo na campanha.
Por isso, a contragosto de muitos ao seu redor, ele precisa inviabilizar essa possibilidade e, ao mesmo tempo, manter distância regulamentar para não herdar a rejeição do ex-presidente.
Aliados de Bolsonaro, que não esqueceram que Nunes não o apoiou publicamente no segundo turno, estão cientes disso. Como compensação, querem emplacar como vice alguém que de fato seja adepto do ideário bolsonarista.
Até agora, Fabio Wajngarten largou na frente como representante dos bolsonaristas raiz. O ex-chefe da Secom se encaixaria na categoria de alguém que “bebe tubaína” com o ex-presidente, nos termos que o próprio Bolsonaro costuma usar.
Como pontos a favor, ele ainda tem trânsito com veículos de comunicação e expertise em marketing. Mas, além de ser aprovado por Nunes, o nome de Wajngarten precisaria da anuência do PL, visto como o dono por direito da vaga. E isso não seria tão simples.
No PL, há oposição por uma ala da direção ao nome de Wajngarten, que lembra que ele não faz nem parte da sigla.
Entre esse grupo, também há a percepção de que o ex-chefe da Secom é radical demais e poderia afugentar eleitores de centro de Nunes gente, por exemplo, como a que elegeu Bruno Covas (PSDB) como cabeça de chapa nas últimas eleições.
A vaga de vice também é cobiçada por outros partidos aliados, mas o apoio deles a Nunes dificilmente seria afetado caso o PL herde o posto afinal, o partido de Valdemar Costa Neto é o dono do maior tempo de TV e conta com Bolsonaro.
Nas palavras de um político aliado de Nunes, as lideranças não vão “queimar nota de R$ 50”.
Isso não quer dizer que não haja algum descontentamento no Republicanos, na União Brasil e no agora quase nanico PSDB, três partidos que demonstraram interesse no posto.
Uma amostra disso é a tentativa do deputado federal Kim Kataguiri, da União Brasil, de viabilizar seu nome como pré-candidato a prefeito. Mas a iniciativa é vista apenas como mais uma performance do MBL, que no futuro será barrada pelo presidente da Câmara de SP, Milton Leite, um dos principais dirigentes da sigla.
O imbróglio pode não terminar tão cedo. O próprio Bolsonaro indicou que o anúncio do vice seria postergado ao máximo, uma vez que passaria a ser alvo de ataques assim que surgisse.
“Vamos supor que a gente feche um acordo. Obrigatoriamente não tem que ser não tem que ser meu vice. Esse vice tem que servir a São Paulo, pode ser de outro partido até. Está acertado também com o presidente do PL essa outra questão”, disse. “A gente não pode impor um vice para um candidato.”
As falas ocorreram após um almoço na última semana, quando Bolsonaro foi convidado por Nunes. O prefeito, em tom de brincadeira, disse que “tinha tubaína”. Entrando na brincadeira, o ex-presidente respondeu que o emedebista estava aprendendo a tratá-lo bem.
A entrevista à imprensa ao fim do encontro demonstrou mais intimidade que no encontro anterior, quando ambos participaram de um almoço em uma mansão no Morumbi (zona oeste de SP), no fim do mês passado.
Na ocasião, Nunes disse que a aliança seria ótima, mas que não tinha proximidade com Bolsonaro.
O tom reticente entre ambos não se repete entre os aliados, a começar pelo presidente do partido de Bolsonaro, Valdemar Costa Neto. O PL já tem cargos no governo Nunes e pretende crescer em influência.
Em um dos encontros entre prefeito e ex-presidente, o presidente do PL disse que “se nós brincarmos aqui nós vamos ter o Boulos de prefeito e na próxima eleição”. Ele também disse que Bolsonaro “entendeu perfeitamente” a necessidade de união e que achava que o nome dele na capital seria o de Nunes.
O entusiasmo pela união se repete na esfera municipal. O presidente da sigla na capital paulisa, Isac Félix, disse à reportagem que o partido vai estudar um nome. A decisão, diz, passa também por lideranças da sigla como Valdemar e o deputado federal Antonio Carlos Rodrigues.
No entorno do principal oponente de Nunes, Guilherme Boulos, as bodas entre o prefeito e o ex-presidente são comemoradas.
Para aliados do deputado, o cenário de polarização em um momento que Lula está em ascensão contra um Bolsonaro está em baixa é o ideal. A aposta é que com a melhoria da economia e avanço de investigações envolvendo o ex-presidente tornem custoso demais para Nunes a aliança.
ARTUR RODRIGUES / Folhapress