(FOLHAPRESS) – O chamado true crime tornou-se rapidamente um dos gêneros mais populares das plataformas de streaming. São produções relativamente baratas, em forma de filme ou minissérie documental, que revisitam crimes do passado -alguns deles, sem solução até hoje.
O “true crime” não tem grandes ambições artísticas. De modo geral, são reportagens aprofundadas, que trazem depoimentos de vítimas, testemunhas, parentes e especialistas, e desencavam novas evidências surgidas ao longo dos anos. Mas não é obrigatório chegar a uma conclusão.
O gênero fez sucesso no Brasil, país onde não faltam crimes escabrosos, e aparece em séries sobre os casos de Daniella Perez, Suzane von Richthofen, Isabella Nardoni, Flordelis e alguns outros.
Em meio a tanta oferta, há uma minissérie que estreou sem fanfarra na HBO Max: “A Última Rodada: Um Assassino Serial na NY Queer”. O título original, “Last Call”, se refere ao momento da alta madrugada em que o barman avisa que, por causa de leis vigentes em vários estados americanos, os clientes só têm mais uma chance de pedir drinques. Por atacar suas vítimas no final da noite, o serial killer em questão foi apelidado na imprensa de “assassino do ‘last call'”.
Dirigida por Anthony Caronna, que também co-escreveu os roteiros baseados no livro de Elon Green, a série tem quatro episódios com cerca de uma hora de duração, cada um deles batizado com o nome de uma vítima do criminoso em questão.
Todos foram mortos no começo dos anos 1990. Dois eram homens de meia-idade, gays não assumidos, sendo que um deles era casado com uma mulher e tinha uma filha, e aproveitava suas idas a Nova York para dar umas escapadas. O terceiro era um garoto de programa de origem latina. O quarto, um frequentador assíduo de um bar no Greenwich Village, reduto boêmio da cidade.
A série faz o dever de casa. Retraça os últimos passos desses infelizes, conversa com parentes e amigos, dá voz aos detetives que cuidaram dos casos. Os quatro homens foram encontrados esquartejados, com partes de seus corpos escondidas em sacos de lixo espalhados por Nova York e Nova Jersey. A comunidade gay, já abalada pelo auge da crise da Aids, se mobilizou, imprimiu folhetos e fez campanha alertando sobre o perigo à espreita.
Só que a polícia não fez o mesmo esforço. Apesar das pistas abundantes e de um certo padrão no modus operandi do assassino, as investigações não foram longe. O chefe da polícia de Nova York na época era um notório homofóbico, e seus chefiados ainda tratavam gays, trans e travestis com brutalidade. Ataques violentos a homossexuais eram comuns nas ruas do Village, e quase ninguém ia preso por eles.
Aos poucos, começa a ficar claro que a identidade do assassino não importa tanto. Ele sem dúvida é culpado por seus atos e deve pagar por eles, mas há um culpado ainda maior, que permitiu que tantos crimes fossem cometidos e ficassem impunes: a homofobia.
O criminoso finalmente é identificado e preso no quarto episódio. Suas impressões digitais estavam nos sacos de lixo. As ferramentas com que ele desmembrava os cadáveres foram encontradas em sua casa. O mais chocante de tudo é que ele já havia sido preso duas vezes antes, e julgado, por ter matado outros dois homossexuais.
Ele foi absolvido em ambos os casos, pois a defesa alegou o infame “pânico gay”. Ao ser abordado por um homem gay, o acusado entrou em pânico e defendeu sua masculinidade matando o “agressor”.
O desfecho da terceira prisão não é feliz para o assassino. Os tempos já estavam mudando e, condenado em 2005, ele está preso até hoje, cumprindo duas penas consecutivas de prisão perpétua.
Mas a conclusão de “Última Rodada” não é otimista. A produção lembra que crimes contra a comunidade LGBTQIA+ continuam a crescer no mundo inteiro, principalmente contra mulheres trans negras, porque muitos homofóbicos seguem acreditando que um gay ou trans assassinado teve apenas o que merecia.
A ÚLTIMA RODADA: UM ASSASSINO SERIAL NA NY QUEER
Avaliação Bom
Onde Disponível na HBO Max
Classificação 16 anos
Produção Estados Unidos, 2023
Direção Anthony Caronna
TONY GOES / Folhapress