Americanas quer ressarcimento de ex-diretores, mas pode poupar acionistas

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Americanas pretende buscar na Justiça uma reparação pela fraude em seus balanços a ser paga por todos que forem considerados culpados após as investigações. A medida pode incluir membros do conselho de administração e até mesmo acionistas, caso provado envolvimento no caso.

Os acionistas de referência da companhia são os empresários Beto Sicupira, Jorge Paulo Lemann e Marcel Telles. Deles, somente Sicupira faz parte do conselho de administração.

O processo de ressarcimento virá em um segundo momento. Antes disso, a Americanas atua no caso em duas frentes. A primeira é a investigação interna para apurar devidamente o que aconteceu e repassar as informações às autoridades. A segunda é refazer os balanços dos dois últimos anos.

Somente após encerradas as duas frentes e as investigações do MPF (Ministério Público Federal) e da PF (Polícia Federal), a Americanas entrará com as ações.

Apesar de um eventual conhecimento prévio por parte dos acionistas sobre as fraudes não ser ainda completamente descartado por pessoas que analisam o tema hoje, as informações tornadas públicas até agora nas investigações não provam o envolvimento deles.

Nesta semana, o ex-CEO da Americanas Sergio Rial, que revelou os problemas contábeis da empresa logo após assumir o cargo, chegou a dizer à CPI não ter visto “nenhum indício, nem antes, nem durante, nem depois” da participação dos acionistas.

Na visão de pessoas ligadas à companhia, as informações que circulam, por ora, apontam para envolvimento dos antigos diretores da empresa. Em junho, quando a empresa passou a classificar publicamente as inconsistências contábeis de fraude, desligou mais de 30 pessoas possivelmente envolvidas na situação e determinou que não pagaria mais a defesa de executivos em processos relativos à fraude.

De todos os desligados, somente dois recorreram na Justiça contra a interrupção dos pagamentos e obtiveram liminares favoráveis: o ex-diretor-presidente da Americanas Miguel Gutierrez e a ex-comandante da B2W Anna Saicali.

Nos dois casos, a empresa vem depositando em juízo os recursos solicitados por ambos para sua defesa judicial. Ambos podem usar o dinheiro caso ofereçam garantias, o que não aconteceu ainda pelo menos no caso de Saicali.

Procuradas, as defesas dos dois executivos informaram que a arbitragem para o pagamento dos advogados está em segredo de Justiça.

Saicali transferiu cotas de uma empresa para o nome do filho 20 dias antes de a Americanas revelar o que na época era chamado de inconsistência contábil, conforme revelou a Folha. De acordo com o advogado da ex-executiva, ela não tinha como finalidade proteger o patrimônio de eventuais medidas decorrentes das investigações.

O objetivo, segundo a sua defesa, era o “de planejamento sucessório motivado por questões de saúde”.

Gutierrez e Saicalli ainda não foram ouvidos pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Câmara dos Deputados que investiga o caso.

O ex-CEO da Americanas chegou a ser convocado para uma sessão, mas não compareceu após apresentar um atestado informando que estava na Espanha e sem a possibilidade de voltar ao Brasil até 25 de agosto devido a uma crise renal. Agora ele vai ter um retorno com o médico para saber se será liberado para viajar de avião.

Gutierrez negocia com a CPI sua participação. O ex-executivo gostaria de depor por videoconferência, o que é descartado pelos deputados que compõem a comissão.

Diante do impasse, o prazo final da comissão se aproxima. Para evitar que a CPI acabe sem ouvir Gutierrez, os parlamentares que compõem a CPI devem pedir um prolongamento dos trabalhos por 15 dias, o que jogaria seu encerramento para o fim de setembro.

Para que a CPI seja prorrogada, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), deve concordar com o pedido.

Os trabalhos de investigação se debruçam sobre duas principais vertentes da fraude. Uma delas era ligada a empréstimos bancários informados incorretamente no balanço da companhia, o que mascarava o tamanho da dívida da varejista.

Outra era a criação sem lastro, no balanço, de valores que teriam sido recebidos por ações promocionais e de marketing -o que é conhecido como VPC (verba de propaganda cooperada) no jargão do setor.

A empresa ainda analisa a magnitude do problema, o que envolve descobrir quando ele começou. Mas há a visão de que a fraude se prolongou por tempo suficiente para prejudicar inclusive a competitividade da companhia na sua principal atividade, o varejo.

Isso porque, com a obtenção de lucros fictícios, a partir da fraude, a empresa se via menos impelida a negociar margens melhores com seus fornecedores. Nesse sentido, a Americanas já identificou situações em que produtos foram comprados por valores maiores do que deveriam.

LUCAS MARCHESINI, FÁBIO PUPO E JULIANNA SOFIA / Folhapress

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