No sétimo mês de mandato, com reforma da previdência em trâmite no Congresso, acenos de mais restrições trabalhistas por parte do governo, questionamentos completamente fora dos protocolos políticos como os direcionados ao Inpe, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, somam-se a afirmações contra a Ancine, a Agência Nacional do Cinema, mantendo viva a velha narrativa que demoniza a cultura e fez parte da agenda da eleição.
O problema é que a disputa ideológica que pauta a batalha de narrativas que o país vive hoje torna o debate cego e deveras prejudicial para os brasileiros. O argumento costumeiro dos produtores, artistas e outros engajados nas causas culturais é verdadeiro. Cultura é base educacional, fortalece as raízes de um povo e prepara os cidadãos para um convívio social saudável. Afasta pessoas em situações de vulnerabilidade dos malefícios da criminalidade e possibilita até, para alguns, caminhos profissionais, ou seja, a cultura é capaz de suprir carências causadas justamente pela ineficiência dos governos na educação.
Quando o governo acena com o enfraquecimento da educação e da cultura, o sinal é claro, quem pode pagar que consuma! Acontece que um país continental e extremamente desigual como o Brasil precisa do Estado para corrigir falhas na formação de seu povo que culminam em sobrecarga do sistema de saúde, dos sistemas judiciário e penitenciário por aumento da criminalidade e todo a ordem de problemas os quais convivemos diariamente.
É indiscutível que durante o governo do PT os movimentos sociais foram cooptados pela esquerda através dos editais e seus recursos financeiros direcionados sempre para o velho coronelato da cultura nacional. Temos até estudos acadêmicos sobre esse processo. A cadeia produtiva da cultura não cresceu com isso. Muitos artistas inovadores, em começo de carreira, com produtos pouco comerciais, não viram a cor do incentivo enquanto os mesmos de sempre ficaram com as benesses do extinto MinC e isso nem pode ser generalizado.
Muitos projetos bons floresceram, mas existe, sim, a necessidade de corrigir a rota. Problema identificado, a solução é o corte? Claro que não! Fosse sério o propósito, a medida seria reestruturar e capacitar os agentes culturais públicos. Pois bem, se esses não são argumentos suficientes, vamos para a parte que toca de verdade o sentimento das pessoas: dinheiro.
País que investe em cultura gera renda! Ao contrário das informações desencontradas que pintam a cultura como gasto, cultura é investimento. “- Ah, mas grandes potências econômicas e culturais não tem Ministério da Cultura”. Errado! Não é bem por aí. Em locais como França, Itália, Espanha e Reino Unido, a pasta existe fundida a outras como Comunicação, Educação e Turismo, e os orçamentos são bem maiores que os nossos.
A nossa média de 2bi anuais na área não chega nem perto da média de mais de 30bi dos franceses por exemplo. Se os EUA são referência de mercado para nós, vamos lá. Sem incentivos estatais, Holywood e toda a cultura americana não teria invadido o planeta, não estaríamos de calça jeans tomando coca-cola, sonhando com carros importados e colando na parede posters de super-heróis americanos, que nunca salvaram o Brasil de nenhum ataque alienígena sequer! Os EUA vendem tudo o que produzem para o mundo todo e arrombam a porta dos consumidores por meio de sua cultura.
Um exemplo claro, passado por nosso conterrâneo, o diretor José Padilha, de Tropa de Elite, Narcos e outros: a produção de Robocop, dirigida por ele em 2014, contou com um orçamento de 120 milhões de dólares. Desses, 35 milhões vieram de incentivos fiscais. TRINTA E CINCO MILHÕES DE DÓLARES PARA PRODUZIR ROBOCOP. Só para deixar claro, mais que 80 por cento do total do incentivo do mercado brasileiro naquele ano. Posto isso, pessoal, qualquer discurso contrário ao investimento em cultura é contrário aos interesses nacionais. Ponto.
P.S. Se a intenção é melhorar a economia para nós cidadãos, sugiro que deem uma olhada no lucro dos bancos, com alta de 22% no primeiro trimestre deste ano. Quem mais aqui está crescendo 22%?