SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O empréstimo consignado para cidadãos que recebem BPC (Benefício de Prestação Continuada) só será liberado pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) quando o STF (Supremo Tribunal Federal) julgar o tema, segundo comunicado do instituto.
“Como a discussão está em andamento no Judiciário, qualquer decisão do Instituto Nacional do Seguro Social só será tomada após o trânsito em julgado naquela esfera de poder”, diz o texto.
Isso significa que a modalidade só será regulamentada e oferecida após o fim do processo, sem que haja mais nenhuma possibilidade de recurso, o que pode levar alguns anos.
Para a advogada Adriane Bramante, presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), a medida é acertada, por se tratar de uma população economicamente vulnerável. “Acho adequado o INSS só cumprir [a oferta do consignado do BPC] quando o STF se manifestar”, afirma.
Em sua opinião, o crédito para esses cidadãos pode comprometer ainda mais renda de quem já está em situação econômica de miserabilidade. “Não acho adequado consignado para BPC. As pessoas que fazem jus a este benefício assistencial comprovam situação de miserabilidade. Se tiverem empréstimo, terão a renda mensal ainda mais reduzida, comprometendo sua subsistência.”
A educadora financeira Cíntia Senna, da Dsop, avalia que o INSS teve prudência, por se tratar da liberação de crédito para um público que necessita de educação financeira. Segundo ela, o problema não está só em receber o BPC, que pode ser cortado. Até mesmo aposentados, com benefícios pagos por toda a vida, e que recebem 13º ficam expostos à inadimplência.
“Se a gente for observar, o INSS está se respaldando em primeiro lugar só liberar com uma autorização. Num futuro próximo, se houver alguma problemática, o INSS já vai ter tomado essa decisão de não ter liberado sem a deliberação de um órgão superior.”
Outra questão apontada por Senna é o fato de que quem tem crédito consignado pode ser vítima de fraudes. “Você vai trazer às vezes mais de trabalho e dificuldade do que facilidade, então é tem de ter muito, muito cuidado”, afirma.
Bramante pondera ser preciso encontrar uma solução de crédito para essas pessoas, que estão, muitas vezes, à margem do sistema financeiro.
“Por outro lado, são pessoas que dificilmente conseguem crédito em banco para arrumar um telhado que está quebrado ou comprar algo essencial que precise, e o empréstimo acaba ajudando”, diz.
O crédito consignado é um empréstimo descontado diretamente do benefício como aposentadoria e/ou pensão do INSS, ou do salário de servidores e trabalhadores da iniciativa privada.
No caso do BPC, por não haver autorização em lei a autorização foi aprovada e publicada, mas está sendo questionada no STF não é possível fazer o empréstimo, já que não há a possibilidade de descontos na folha de pagamentos.
Em geral, por ter esse desconto na fonte, com risco zero de não pagamento da dívida, os juros são os mais baixos do mercado.
No caso do INSS, a taxa é controlada pelo CNPS (Conselho Nacional de Previdência Social), que, no dia 17, limitou a 1,91% os juros cobrados no empréstimo.
A lei que libera o consignado para os beneficiários do BPC foi aprovada em junho. A liberação foi inserida na medida provisória do Bolsa Família. Segundo a lei, quem tem BPC poderá comprometer até 35% do benefício com o consignado. O valor do benefício é de um salário mínimo, que está em 1.320 em 2023, com isso, o desconto máximo seria de até R$ 462 mensais.
O BPC é pago a idosos e pessoas com deficiência inscritos no CadÚnico (Cadastro Único) que fazem parte de família de baixa renda. Para isso, a renda per capita (por pessoa da família) deve ser de até um quarto do salário mínimo, o que dá R$ 330 neste ano.
Não é necessário ter contribuído com a Previdência, ou seja, não há exigência de tempo mínimo.
O benefício é pago a pessoa idosa, com idade a partir de 65 anos e a pessoa com deficiência, de qualquer idade, desde que passe por perícia e comprove deficiência física, mental, intelectual ou sensorial, dificultando o dia a dia do cidadão.
COMO ESTÁ O PROCESSO NO STF?
A ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 7.223 foi proposta pelo PDT (Partido Democrático Trabalhista) em agosto de 2022 contra a lei do governo Jair Bolsonaro que autorizou empréstimo para esse público e para quem recebia Auxílio Brasil, hoje Bolsa Família.
A ação quer limitar empréstimos para o público vulnerável e também questiona a elevação do limite de comprometimento da renda de empregados celetistas e de beneficiários do INSS, que havia passado de de 35% para até 45%.
A relatoria ficou com o ministro Kássio Nunes Marques, que, antes da eleições presidenciais, julgou constitucional a crédito.
Na época, repasses a mais beneficiários do auxílio e liberação recorde de consignado pela Caixa foi vista como medida para interferir no resultado das eleições, já que Bolsonaro buscava ser reeleito.
O processo foi interrompido após pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes e está parado, aguardando julgamento.
CRISTIANE GERCINA / Folhapress