SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma ação civil pública contesta a legalidade de mais de 200 concursos abertos pela USP (Universidade de São Paulo) para contratação de professores por não cumprirem a política de ação afirmativa para pretos, pardos e indígenas (PPI) estabelecida há três meses pela própria instituição paulista de ensino superior.
A Resolução 8.434, que criou uma política válida para todos os concursos da universidade com o objetivo de aumentar a presença de pessoas PPI, entrou em vigor em 24 de maio. Mas o texto traz uma ressalva: a política não valeria para processos seletivos cujo edital de convocação já estivesse publicado naquela data.
A ação do Núcleo de Defesa da Diversidade e Igualdade Racial da Defensoria Pública de São Paulo questiona a legalidade dessa ressalva, mas teve pedido liminar de tutela de urgência indeferido para a suspensão dos concursos. A ação segue para julgamento, ainda sem data prevista.
A USP informou, por meio de nota, que “a cota para PPI não foi aplicada aos referidos concursos em função da decisão dos órgãos deliberativos da USP, apoiada na questão da autonomia universitária”.
Segundo a nota, “buscou-se privilegiar a necessidade acadêmica urgente e o não atraso desses concursos já lançados”, e a republicação dos editais poderia acarretar, em alguns casos, em atrasos no preenchimento das vagas.
A ação se dá num momento em que a USP promove centenas de concursos para reposição de docentes depois que as contratações foram suspensas, em 2014, por causa de desequilíbrios nas contas da universidade. São 876 vagas distribuídas para todas as unidades e divididas em três fases: 50% das vagas em concursos entre 2022 e 2023, 25% em 2024 e 25% em 2025.
A nova política afirmativa da USP foi instituída depois de uma ação anterior, de março deste ano, também de autoria do núcleo da Defensoria Pública. A ação questionou a ausência de reserva de vagas ou de pontuação diferenciada previstas em lei federal e que tiveram sua constitucionalidade reconhecida pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Na ocasião, a juíza Luiza Barros Rozas Verotti, da 13ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça, suspendeu, liminarmente, as inscrições abertas na USP para três vagas: procurador, analista administrativo e médico veterinário. Um acordo foi firmado entre a USP e a Defensoria para destravar os concursos, e em 24 de maio foi publicada a Resolução 8.434.
Naquela data, segundo a USP, havia 261 concursos em andamento, entre aqueles com inscrições abertas (131) e outros com inscrições encerradas, mas processo seletivo ainda pendente (130).
A ação da Defensoria paulista afirma que todos esses concursos poderiam ser adaptados para cumprirem as novas regras da ação afirmativa. Segundo o texto, a ressalva prejudica a meta da resolução de elevar a porcentagem de pretos, pardos e indígenas na USP até atingir os “parâmetros análogos aos da participação desses grupos na população total do Estado de São Paulo”.
Hoje, 2,2% dos professores da USP se autodeclaram pretos ou pardos, enquanto, na população paulista, o índice de quem se autodeclara preta ou parda é de 34,63%, segundo o Censo de 2010 (o mais recente com esse dado para SP).
A resolução prevê um modelo de reserva de 20% de vagas para concursos com três ou mais posições abertas e um modelo de pontuação diferenciada para candidatos PPI nos casos de concursos para uma ou duas posições. A nova política também prevê comissões julgadoras racialmente mais diversas para todos os concursos, com ao menos um integrante autodeclarado preto, pardo ou indígena.
Em sua decisão liminar, o juiz José Eduardo Cordeiro Rocha, da 14ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça, afirmou faltarem informações sobre a viabilidade da implementação das novas regras a esses processos seletivos e avaliou que a suspensão dos concursos até o julgamento da ação poderia “impactar sensivelmente as atividades de ensino, pesquisa e extensão universitária”.
FERNANDA MENA / Folhapress