SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciou na tarde desta quinta-feira (31) que afastou do cargo os professores que seriam responsáveis pela elaboração do material didático distribuído com erros a escolas.
As aulas digitais, que foram disponibilizadas para os professores em abril, traziam informações como a de que a Lei Áurea, de 1888, foi assinada por d. Pedro 2º e que a capital paulista tem praia.
A Secretaria de Educação, comandada por Renato Feder, não disse quantos docentes foram penalizados pelos erros. A pasta afirmou apenas que “afastou os servidores responsáveis pelos graves erros didáticos no material digital”.
Também informou que os erros já foram corrigidos e que vai “reforçar a equipe de revisão para que haja aprimoramentos constantes nos recursos didáticos, sempre em total harmonia com o Currículo Paulista”.
Maria Izabel Noronha, presidente da Apeoesp (principal sindicato dos professores da rede estadual), disse que a entidade vai denunciar o caso ao Ministério Público por entender que os docentes estão sendo penalizados por uma atribuição que não é deles.
“O secretário decidiu que iria produzir esse material e usá-lo no lugar de livros de verdade. Ele, o secretário, é que responsável por esses erros. Ele decidiu fazer o material de forma apressada e com profissionais que não têm essa experiência nem atribuição”, disse.
Conforme mostrou a Folha de S.Paulo, Feder apostou na produção de um material didático próprio e digital e abriu mão de receber os livros didáticos da União. Diante de forte repercussão negativa, porém, o governo recuou.
No entanto, o material digital da secretaria continua sendo enviado às escolas. Os professores têm recebido a orientação de que são obrigados a usá-lo em sala de aula, transmitindo o conteúdo por uma televisão.
Os conteúdos incorretos que levaram a secretaria a afastar os professores estavam em materiais da disciplina de história. Em uma das aulas, havia a informação de que foi d. Pedro 2º quem assinou a Lei Áurea. O material não fazia menção à princesa Isabel, que foi quem de fato a assinou.
Em outra aula, havia a informação de que “Jânio Quadros, em 1961, quando era prefeito de São Paulo, emitiu um decreto vetando o uso de biquínis nas praias da cidade”. A gestão de Quadros na capital paulista foi até 1959.
Segundo a secretaria, o material foi feito por uma equipe de cem educadores, alguns são professores da rede. A pasta nunca informou como foi feita a seleção desses profissionais que iriam produzir o material didático. Tampouco disse se eles receberam algum tipo de treinamento.
Desde que o material passou a ser distribuído, professores e especialistas têm constatado uma série de erros nas aulas. Ainda assim, a secretaria insiste que o material é de qualidade e deve ser usado.
Conforme mostrou a Folha de S.Paulo, há uma série de erros gramaticais, conceituais e metodológicos em todo o material produzido pela secretaria de Renato Feder. Segundo análise feita por pesquisadores da Repu (Rede Escola Pública e Universidade), caso o material fosse submetido ao processo de avaliação de qualidade usado pelo MEC na escolha dos livros didáticos, ele seria reprovado.
Os pesquisadores encontraram erros em todas as disciplinas e em todas as etapas de ensino.
Os especialistas, autores de livros didáticos e editoras da área já haviam apontado que o material produzido por Feder não segue os padrões mínimos de qualidade.
O material de Feder foi produzido em poucos meses e é revisado pela mesma equipe. O processo de elaboração não seguia nenhum protocolo usado em editais para aquisição de livros didáticos.
No PNLD (Programa Nacional do Livro Didático), por exemplo, foram criados vários instrumentos para garantir a qualidade do material que chega até as escolas. Antes dos livros serem apresentados para escolha dos professores, eles passam por um processo de avaliação por especialistas (contratados em processos seletivos) nas áreas do conhecimento das obras avaliadas.
A avaliação pedagógica dos livros é coordenada pelo MEC e conta com comissões técnicas integradas por especialistas das diferentes áreas do conhecimento, escolhidos a partir de indicações de entidades representativas dos entes federados, universidades e instituições científicas.
Após a avaliação, as comissões técnicas decidem pela aprovação, aprovação condicionada à correção de falhas pontuais ou reprovação das obras. Segundo o decreto que rege o PNLD, “erros conceituais, erros gramaticais recorrentes, necessidade de revisão global do material, necessidade de correção de unidades ou capítulos” são consideradas falhas que levam à reprovação do livro.
Ao contrário do processo de revisão de qualidade do MEC, que conta com a avaliação de especialistas independentes e que não participaram do processo de elaboração, os materiais produzidos pela secretaria de SP são revisados pela mesma equipe que os produz.
ISABELA PALHARES / Folhapress