Rio mira segurança no centro e tenta acelerar plano de atrair moradores à região

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O antigo hotel Nice, na rua Riachuelo, no centro do Rio de Janeiro, está com a fachada encoberta por andaimes e telas. Na entrada, balões coloridos tentam atrair compradores para o residencial.

Na avenida Presidente Vargas, a 2 km de distância do hotel, uma retroescavadeira trabalha em um terreno que já foi usado como estacionamento e corretora imobiliária. Ali também é construído um edifício residencial.

A missão de reabitar o centro avança em ritmo mais lento do que a prefeitura esperava, mas lojistas, moradores e empresários afirmam que, no setor de comércio e serviços, esta é a fase mais otimista desde o início da pandemia. A avaliação é de que a crise que esvaziou as ruas e fechou lojas, algumas centenárias, passou.

Plínio Froes, sócio do grupo Scenarium, que comanda empreendimentos na rua do Lavradio, como o casarão de shows Rio Scenarium e a cachaçaria Mangue Seco, conta que quase precisou fechar as portas.

“Entramos em recuperação judicial e ficamos endividados para pagar nossos funcionários. Após a pandemia, nossas casas voltaram lentamente e hoje estamos a pleno vapor”, diz Froes. No fim do ano passado, na mesma calçada, ele abriu o Dolores Club, casa de jazz e bossa nova.

“Essa região da cidade está pujante, cheia de vitalidade. A ideia é tornar o centro uma zona sul estendida”, afirma Alberto Szafran, subprefeito do centro.

Ele afirma que ainda há áreas esvaziadas e que precisam de ordenamento. Festas que aconteciam semanalmente no arco do Teles, travessa com casarões centenários na praça 15, por exemplo, foram proibidas. Segundo o subprefeito, o entorno amanhecia sujo e danificado.

Perto da Cinelândia, o Passeio Público, parque inaugurado no século 18 e projetado por Mestre Valentim, recebe poucos visitantes e trabalhadores. A retirada do gradil chegou a ser cogitada para dar mais movimento, mas a estrutura é tombada pelo patrimônio histórico.

Vizinho ao parque, o bairro da Glória está em fase melhor. Em decreto deste ano, a prefeitura transferiu o bairro da zona sul para a subprefeitura do centro, reformou praças e autorizou mais eventos de rua, como feiras livres e gastronômicas e rodas de samba.

“O problema do centro é o esvaziamento. Onde há áreas bem ocupadas, as taxas de violência não são grandes. Queremos reabitar a região, reabrir as lojas e ter um fluxo de trânsito de pessoas caminhando, usufruindo”, afirma Szafran.

Dados do ISP (Instituto de Segurança Pública) indicam queda em parte das estatísticas de roubos e furtos no centro do Rio. O órgão reúne informações dos registros de ocorrência nas delegacias.

O total de furtos registrados na 4ª DP (Centro) de janeiro a julho de 2023 caiu 9,8% na comparação com o mesmo período do ano passado. O registro de roubos teve queda de 23% na mesma delegacia.

Na 5ª DP (Mem de Sá), que atua em áreas com vida noturna agitada, como a Lapa, a queda foi de 24% no total de roubos. A média de furtos, contudo, se manteve a mesma na comparação.

Os casos podem ser maiores, já que nem toda vítima de furto registra boletim de ocorrência. Mas todos os crimes de rua diminuíram se comparados a 2019, último ano antes da pandemia de Covid-19.

A guarda municipal, controlada pela Seop (Secretaria de Ordem Pública), aumentou o efetivo no centro após mudança na lei que dita os horários dos agentes. Antes, a escala era de 12 horas de trabalho por 60 horas de folga (que, agora, passou para 36 horas).

Sócio de uma sapataria próxima ao largo São Francisco de Paula, Benedito Pereira diz manter o comércio com esforço diante da concorrência.

“Estamos abertos a duras penas. Vejo, sim, o centro mais movimentado. Mas o comércio ilegal e a venda online são nossos rivais. Pago funcionários, imposto e aluguel caro. Dois quarteirões à frente, pessoas vendem produtos parecidos com os meus, mas falsificados, pela metade do preço”, afirma.

Os furtos e as cenas de uso de drogas, especialmente crack, são outros problemas sob o guarda-chuva da Seop. A pasta afirma ter apreendido mais de 1.300 materiais para consumo de drogas neste ano, além de cerca de 2.000 facas desde junho do ano passado.

“Quando retiramos esse material, contribuímos para a redução dos índices de crimes. Também temos um setor de inteligência para mapear áreas. Já desmobilizamos cenas de uso de crack na rua Couto Magalhães, em Benfica, e na rua Augusto Severo, entre a Glória e a Lapa”, afirma o secretário Brenno Carnevale.

Apesar de não ter aumentado o efetivo de garis, a Comlurb, responsável pela limpeza urbana da cidade, afirma ter promovido mudanças no planejamento de limpeza do centro. Vans motobomba e varredeiras de médio e grande porte foram incluídas na rotina, e ruas e calçadas passaram a ser lavadas mais frequentemente, com água de reúso e detergente líquido.

Segundo a companhia, o IPL (Índice de Percepção de Limpeza) do centro passou de 81,4 em 2022 para 82,7 em 2023.

OCUPAÇÃO PARA MORADIA AINDA É DESAFIO

A moradia no centro da cidade ainda é um desafio que a gestão Eduardo Paes (PSD) tenta emplacar. O Reviver, idealizado para transformar imóveis comerciais ou vazios em residenciais, completou dois anos em julho. O programa emitiu 29 licenças de construção em dois anos, que totalizaram 2.422 unidades de moradia.

Em julho, o Executivo enviou um projeto de lei à Câmara do Rio que estimula a ida de investidores para a área central. A votação do texto em segunda discussão estava prevista para quinta (31), mas foi adiada.

Funciona como bônus: a cada 1.000 metros quadrados criados no centro, a construtora terá 1.000 metros quadrados de potencial construtivo em outro bairro da zona sul, como Copacabana e Ipanema, ou da zona norte, como a Tijuca.

O percentual pode chegar a 150% em caso de moradias populares. Na primeira versão, o Reviver Centro concedia bônus menores, de 40%.

O secretário municipal de Desenvolvimento Econômico e Social, Chicão Bulhões, avalia que o Reviver “ainda está tímido” e que o estímulo de distribuir o potencial construtivo para a zona sul pode acelerar a chegada de mais residenciais.

“Quando você dá a licença, a incorporadora não necessariamente vai construir imediatamente. Ela espera o melhor momento de mercado. O ideal é que as construtoras viessem e já começassem as obras. Então, estamos criando mais incentivos. A gente tem pressa”, diz Bulhões.

A estratégia é questionada por urbanistas e moradores da zona sul. Eles avaliam que os bairros elencados como disponíveis já são populosos e têm pouco espaço para crescer ainda mais.

Todas as autorizações de potencial construtivo emitidas pelo Reviver foram para os bairros de Ipanema e Copacabana. Não houve emissões para bairros da zona norte.

Tarcyla Fidalgo, pesquisadora do Observatório das Metrópoles da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), afirma que o programa não tem estimulado a construção de habitações populares.

“O potencial construtivo não está necessariamente associado à construção de habitação de interesse social. Nada impede que uma construtora faça um retrofit de um prédio no centro, para construir um residencial de alta renda, que é o que temos visto desde que o Reviver foi lançado”, diz.

YURI EIRAS / Folhapress

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