SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma operação especial para o combate ao trabalho escravo resgatou em agosto no Brasil 532 trabalhadores em condições análogas à escravidão, segundo os órgãos de fiscalização. A terceira edição da chamada Operação Resgate foi a maior já realizada pelo órgãos envolvidos na fiscalização de condições de trabalho precárias e tráfico de pessoal.
Em 2022, foram resgatados 338 pessoas em situação de escravidão contemporânea, de acordo com os investigadores.
Ao todo, durante o último mês, foram realizadas 22 inspeções em 22 estados e no Distrito Federal. Participaram das ações 70 equipes formadas por integrantes do Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal, Defensoria Pública da União, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal.
O resultado da operação foi divulgado nesta terça (5) e, segundo os órgãos envolvidos, um dos casos que mais chamou atenção das equipes foi o resgate de 97 trabalhadores da colheita de alho no município Rio Paranaíba, em Minas Gerais.
Na força de trabalho estavam seis adolescentes, dos quais uma jovem grávida. Na área em que trabalhavam não havia banheiros suficientes ou cadeiras, segundo os órgãos de fiscalização. Também faltava onde aquecer comida e nenhum dos empregados tinha registro formal em carteira assinada ou recebeu equipamento de proteção individual (EPI), de acordo com os fiscais.
A operação também localizou dez pessoas em trabalho doméstico análogo ao de escravo. Eram três homens e sete mulheres. Durante a força-tarefa, foi resgatada a trabalhadora mais velha em situação de escravidão, uma mulher de 90 anos, que trabalhava há 16 numa residência no Rio de Janeiro.
As equipes também encontraram 26 crianças e adolescentes submetidos a trabalho infantil e, segundo a Procuradoria-Geral do Trabalho, ao menos 74, entre os 532 resgatados, foram também vítimas de tráficos de pessoas.
Até o momento, os trabalhadores localizados pela força-tarefa receberam cerca de R$ 3 milhões em verbas rescisórias. Outros R$ 2 milhões foram pagos em danos morais coletivos. Em geral, os acordos para o pagamento de direitos trabalhistas são fechados no mesmo dia em que são realizadas as operações de fiscalização.
Os valores cobrados dos empregadores poderão subir porque alguns ainda estão em negociação ou serão levados à Justiça. Após a realização das operações, cabe ao Ministério Público Federal a apresentação de denúncia pelo crime de escravidão, previsto no Código Penal.
Segundo o procurador Italvar Medina, vice-coordenador de Erradicação do Trabalho Escravo do MPT, entre os trabalhadores resgatados estavam 17 imigrantes. Eram 13 bolivianos e quatro paraguaios.
O estado de Minas Gerais foi aquele com o maior número de resgates (204), seguido por Goiás (126), São Paulo (54), Piauí (42) e Maranhão (42). Nos últimos anos, Minas tem aparecido na liderança de casos de trabalho análogo à escravidão, mas, segundo profissionais que atuam no combate, o resultado é influenciado pelo maior número de auditores fiscais.
O déficit de servidores do Ministério do Trabalho e Emprego é com frequência apontado como uma fragilidade da fiscalização, que inclui, além de trabalho escravo, todo tipo de violação à legislação trabalhista, como recolhimento de FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), condições de saúde e segurança nas empresas e o combate à informalidade e ao trabalho infantil.
Em junho, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos autorizou a realização de concurso para diversas áreas, das quais 900 para a função de auditor fiscal do trabalho.
Segundo o relatório da Operação Resgate, as atividades econômicas com maior número de resgatados são cultivo de café, alho, cebola, batata, carnaúba e ovos, na zona rural, e restaurantes, costura, serviços domésticos, construção civil e clínicas de recuperação (quando há falsa oferta de tratamento em troca de trabalho), entre as urbanas.
FERNANDA BRIGATTI / Folhapress