Artista angolano se afasta de estereótipos ligados à África em exposição

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um homem empurra uma lata de lixo, que contém armas de fogo e a bandeira do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), partido que comanda o país africano desde a independência, em 1975. É uma pintura da série Soldados Urbanos, que integra a exposição do angolano Paulo Chavonga no Museu da Imigração.

Levar esse trabalho ao público é uma das formas usadas pelo artista de 26 anos para questionar o governo de seu país, que, segundo ele, usa as memórias dos conflitos que se estenderam de 1975 a 2002 como maneira de amedrontar a população.

“Quando nós íamos para as ruas para protestar contra o governo, algum representante do MPLA aparecia na TV para dizer que nós queríamos guerra. Não, o que queremos é uma democracia sem armas”, diz Chavonga, que trocou Benguela, uma das cinco maiores cidades angolanas, por São Paulo em 2018.

Relatório da consultoria Economist Inteligence Unit, divulgado em fevereiro deste ano, classifica o país africano como um regime autoritário.

Mas são muitas as formas de ver Angola, e Chavonga cultiva uma incomum capacidade de observação e criação desde criança. Apresentou sua primeira exposição individual aos 17 anos na sua cidade natal (“sempre fui muito atrevido”) e logo depois se destacou na Mostra de Jovens Criadores da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), que passou por Moçambique e Portugal.

Em sua vida paulistana, já expôs no Centro Cultural São Paulo e em unidades do Sesc.

Entre os acrílicos sobre tela da mostra no Museu da Imigração, encontramos desigualdade social e violência, ambas, porém, distantes de uma abordagem caricatural. Mas não só.

Há retratos de figuras históricas admiradas pelo artista, como Jinga, a guerreira que, no século 17, comandou a defesa de reinos localizados no território onde atualmente está Angola. Surgem ainda crianças se divertindo em espaços públicos e mães de família trabalhando. Tudo numa paleta vivíssima de cores.

Em meio a 60 obras, do lirismo das brincadeiras da infância ao incômodo causado pelos fuzis, Chavonga pinta uma Angola real e multifacetada. Ele rejeita com veemência uma arte baseada em avaliações preconcebidas. “A ausência de informações sobre a história da África é uma armadilha porque reforça os estereótipos que contribuem para a manutenção do racismo estrutural no Brasil.”

A vida paulistana tem sido relevante para Chavonga amadurecer suas opções como artista, mas ele se opõe à ideia corrente que indica o Brasil como um ponto de partida para imigrantes como ele.

“Nessa exposição, quis trazer toda a minha história justamente para mostrar que ela não começa no Brasil. Trago minhas memórias, dos meus pais, meus avós. Além disso, antes de ser um imigrante, sou um artista”, diz.

Com curadoria de Luciara Ribeiro, a mostra também exibe uma instalação que reproduz uma banca de venda de tecidos na praça da República, em São Paulo, um comércio dinâmico conduzido por angolanos, como Chavonga, senegaleses, congoleses, guineenses…

Ao lado da instalação, a pintura do rosto de um menino angolano toma uma das paredes. Tem olhos de mistério e curiosidade, como os olhos de Chavonga, o garoto “atrevido” de Benguela.

PAULO CHAVONGA

Quando De ter. a sáb., de 9h às 18h; dom., das 10h às 18h

Onde Museu da Imigração – rua Visconde de Parnaíba, 1.316, Mooca

Preço R$ 10 (entrada gratuita aos sábados).

NAIEF HADDAD / Folhapress

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