SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) contratou por mais de R$ 30,8 milhões uma plataforma de educação para fornecer videoaulas e jogos digitais sem licitação.
A contratação foi feita pela Secretaria de Educação, comandada por Renato Feder, e foi a estratégia usada para cumprir a promessa do governador de incluir aulas de programação no currículo de todas as escolas de ensino médio de São Paulo.
O contrato sem licitação foi firmado no início de agosto com a empresa Alura.
Em nota, a secretaria disse que a legislação nacional permite a dispensa de licitação quando “inexiste competição entre empresas diante de aspectos técnicos exclusivos oferecidos pelo fornecedor em questão”.
A secretaria não informou quais aspectos técnicos exclusivos são oferecidos pela Alura. A Folha de S.Paulo também pediu acesso ao contrato e ao processo de inexigibilidade de licitação, mas a pasta não forneceu. A empresa afirmou que o processo de contratação seguiu o que é previsto pela lei.
Em pouco mais de um mês, essa é a segunda vez que a secretaria contrata plataformas educacionais sem licitação. Na primeira vez, a pasta comandada por Feder decidiu comprar 200 milhões de livros digitais de uma empresa chamada Bookwire, mas desistiu do contrato após repercussão negativa envolvendo a escolha de materiais didáticos.
Questionada, a secretaria disse que apenas essas duas empresas firmaram contratos com dispensa de licitação. Segundo a pasta, a rescisão com a Bookwire não provocou “danos ao erário”.
Especialistas em direito público dizem que, apesar da legislação permitir a contratação com dispensa de licitação, o alto valor do contrato feito pela Secretaria de Educação acende um alerta.
“Tem se recorrido à dispensa de licitação com recorrência na contratação de serviços de tecnologia, principalmente na área educacional, sob o argumento de que é preciso customizar as ferramentas para o setor público. Não sabemos se é o caso desse contrato, mas seria importante ter mais transparência sobre o processo de decisão”, diz André Rosilho, professor de direito público da FGV.
Alessandro Soares, professor de direito administrativo do Mackenzie, também avalia que uma contratação sem licitação em um montante tão alto precisa de boa sustentação. “É preciso comprovar que o produto comprado é tão exclusivo, tão sui generis, que não é oferecido por outra empresa. Uma contratação de mais de R$ 30 milhões, sem licitação, precisa ser transparente.”
A Alura foi contratada para fornecer jogos digitais, videoaulas, conteúdos e atividades em programação de computadores. O contrato, com vigência de 18 meses, prevê que a secretaria terá direito a cerca de 2,5 milhões de acessos à plataforma.
Nas últimas semanas, professores de todas as escolas estaduais paulistas têm sido convocados para cursos de formação para aprender a usar a plataforma com os alunos. Segundo a Alura, o programa prevê que os estudantes recebam acompanhamento dos docentes em sala de aula.
A empresa explicou que o contrato prevê o fornecimento de uma ferramenta que dá suporte à implementação do currículo de tecnologia no estado.
Fundada em 2004 pelos irmãos Paulo e Guilherme Silveira, a Alura é conhecida como uma escola do segmento tech e tem no seu portfólio cursos produzidos em colaboração com youtubers, podcasters e blogueiros. A empresa tem um faturamento anual de mais de R$ 400 milhões.
A Alura também foi contratada para fornecer as ferramentas digitais para as escolas estaduais do Paraná, em 2020, quando Feder era secretário do estado. No fim de 2022, um aplicativo da empresa foi instalado nos celulares de professores e estudantes da rede paranaense sem autorização.
Na ocasião, a Secretaria de Educação do Paraná reconheceu que houve uma “instalação massiva” do aplicativo nos celulares dos professores, mas disse que não “houve comprometimento de dados ou de segurança” dos usuários.
Feder, que é empresário da área de tecnologia, tem tido a sua gestão à frente da Educação paulista marcada por polêmicas por tentar implementar uma série de ferramentas digitais nas escolas. Ele já quis substituir livros didáticos físicos por um material digital, mas teve que recuar após repercussão negativa e ações judiciais.
Em agosto, o Ministério Público decidiu abrir inquéritos para investigar decisões de Renato Feder.
O primeiro deles, em 3 de agosto, foi para apurar a decisão do secretário de abrir mão do material didático do PNLD (Programa Nacional do Livro Didático). Medida da qual o governo paulista depois recuou.
Em 5 de agosto, o a Promotoria também abriu um inquérito para investigar um possível conflito de interesses de Feder por fiscalizar contratos da secretaria com a empresa da qual é acionista, a Multilaser.
ISABELA PALHARES / Folhapress