SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em meio a um momento delicado de alto endividamento do agora Grupo Casas Bahia (antiga Via Varejo), o mercado está apostando em peso na forte queda das ações da companhia. O grupo é dono da Casas Bahia, do Ponto e do Extra.com.
Segundo dados da Economatica levantados e compilados pelo TC Matrix, no dia 4 de setembro o total de ações alugadas da empresa atingiu o maior patamar desde que a companhia trocou o código do papel negociado na Bolsa, em 2021, de VVAR3 para VIIA3.
Na última terça-feira (12), o Grupo Casas Bahia comunicou ao mercado que trocará também o código de negociação na Bolsa para BHIA3, junto com a mudança de nome da empresa.
No mercado financeiro, investidores que apostam na queda de uma ação alugam o papel por um tempo, acreditando que ele vai se desvalorizar nesse período.
Esse investidor, chamado de “tomador”, vende no mercado as ações que alugou e, se sua previsão se confirmar e o preço delas cair, eles as recompram mais barato para devolvê-las a quem as havia alugado e lucram com a diferença de preço.
Para valer a pena, o lucro do “tomador” com essa venda por um preço maior e recompra por um preço menor precisa superar a taxa que ele paga pelo aluguel dos papeis.
Quanto maior o tombo no preço esperado pelo “tomador”, mais propenso ele fica em pagar uma taxa mais alta.
No caso da Via, em uma semana suas ações passaram da terceira posição para a primeira entre aquelas com maior porcentagem de aluguel, mesmo com uma taxa elevadíssima.
Na semana passada, de todas as empresas com capital negociado em Bolsa, a Via tinha a maior taxa média de aluguel entre os principais contratos negociados em Bolsa, a 72,8% ao ano, enquanto a Mobly, que está em segundo lugar, tem taxa de 64,8%, seguida por Marfrig em terceiro, a 48%. Na última terça (12), essa taxa média da Via subiu para 96,19% segundo dados da Economatica compilados pelo TC Matrix.
“Para compensar o aluguel com essa taxa, a ação tem que cair muito. Ou seja, o mercado está desconfiado da situação financeira da empresa e está apostando em uma forte queda do papel”, diz o analista-chefe do TC Matrix, Carlos André Vieira.
Na segunda-feira passada (4), o valor total movimentado com o aluguel da ação do Grupo Casas Bahia somou R$ 593,6 bilhões. Foram 367 bilhões de papéis alugados nessa data, com o valor de R$ 1,26 por ação. Um dia depois desse recorde, em 5 de setembro, a companhia anunciou uma oferta subsequente de ações primária, conhecida no mercado financeiro como follow-on, para levantar cerca de R$ 1 bilhão.
Mas, conforme a Folha apurou, a demanda pela oferta já excede em R$ 600 milhões essa estimativa inicial de captação com a oferta de ações.
Segundo a empresa, os recursos líquidos captados serão utilizados para melhorar a estrutura de capital da companhia, que enfrenta sérios problemas de endividamento.
A agência de classificação de risco S&P Global comunicou nesta quarta-feira (13) que rebaixou a nota de crédito da 20ª emissão dos CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários) do Grupo Casas Bahia, de brAA- para brA- .
Segundo comunicado da companhia, o rebaixamento em três ou mais níveis possibilita o vencimento antecipado dos títulos. Em até dois dias úteis, portanto, uma assembleia especial de titulares dos CRIs deverá ser convocada, com ao menos 15 dias de antecedência, para decidir a questão.
Para Vieira, esse rebaixamento pode aumentar as posições vendidas na ação. Mas como a alta demanda pelo follow-on é uma notícia positiva para a empresa, no líquido, os aluguéis do papel devem se manter em um patamar parecido com o atual.
As ações da Via operam com forte volatilidade no pregão desta quarta. Perto das 13h45, o papel caía 0,85% na Bolsa, a R$ 1,16. No ano, a ação se desvaloriza mais de 50%.
Procurada, a empresa disse que não pode se manifestar por estar em período de silêncio.
ENDIVIDAMENTO DA VIA
Além da situação macroeconômica que penaliza as varejistas no geral, com juros ainda em nível elevado e o alto endividamento das famílias inibindo o consumo, a Via está em uma posição mais delicada, segundo analistas.
“A empresa está em uma situação pior em relação à Magazine Luiza, por exemplo. Ela tem um endividamento mais elevado e um custo de dívida maior. Além disso, a Via tem um desafio maior pela frente, porque hoje os números operacionais dela são mais deteriorados”, comenta o analista Phil Soares, chefe de análise de ações da Órama.
O analista Lucas Rietjens, da Guide Investimentos, também ressalta que a Via vem reportando índices de cobertura de juros abaixo de 1, o que indica que o resultado operacional da empresa não tem sido suficiente para pagar os juros da dívida.
De maio a junho deste ano, a Via registrou lucro operacional ajustado antes dos descontos com juros, impostos, depreciação e amortização de R$ 469 milhões. Enquanto isso, a companha reportou R$ 882 milhões apenas com despesas financeiras.
Com relação ao endividamento total, no segundo trimestre, a Via reportou em seu release de resultados R$ 3,7 bilhões de endividamento bruto, além de R$ 1,5 bilhão com risco sacado, que é uma operação que antecipa os recebíveis dos fornecedores com a intermediação de instituições financeiras.
Mas nas notas explicativas do balanço a empresa demonstra R$ 8,7 bilhões de empréstimos e financiamentos, sendo R$ 5 bilhões de repasse para instituições financeiras referentes a operações com crediário.
Crediário é uma opção que a empresa oferece de parcelamento de compra sem a necessidade de o cliente utilizar cartão de crédito. Para sustentar a operação, a companhia toma empréstimo junto a instituições financeiras. Segundo o balanço da Via, esse financiamento aconteceu com uma taxa média de 17,56% ao ano em 30 de junho de 2023.
Além disso, ainda nas notas explicativas, a companhia reporta R$ 3,7 bilhões em passivo com arrendamento mercantil, que seria um contrato de locação de um ativo por um período determinado.
No balanço patrimonial da companhia, até o dia 30 de junho deste ano, consta um total de passivo circulante, ou seja, as obrigações de curto prazo, de R$ 17,8 bilhões. Já o total de ativos circulantes, ou seja, bens e direitos que podem se transformar em dinheiro no curto prazo, somam R$ 14,1 bilhões.
STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress