SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Estandes produtores e importadores de óleos de cânabis para fins medicinais dividiram os corredores da primeira edição da ExpoCannabis Brasil, que aconteceu neste final de semana em São Paulo, com estufas metalizadas para cultivo doméstico, bancos internacionais de sementes, roupas feitas de fibra de cânhamo, cervejas temperadas com terpenos (óleos aromáticos) da maconha, e acessórios para o consumo da planta.
A feira, que acontece há dez anos no Uruguai país onde o uso medicinal e adulto da planta é legalizado, reuniu mais de 130 empresas do mercado de cânabis e 20 mil visitantes em três dias na capital paulista.
Tamanho interesse e diversidade colocou lado a lado grandes empresas do setor da maconha medicinal, que investem milhões em testes clínicos de seus produtos no país, com marcas de seda e de produtos ligados ao consumo adulto da cânabis, das quais algumas empresas do campo terapêutico gostariam de se distanciar num momento de mudanças regulatórias para o setor no Brasil.
Na última semana, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) concedeu salvo-conduto para que pacientes não sofram sanções criminais pelo autocultivo de cânabis para extração de óleo com finalidade medicinal.
No mesmo dia, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), apresentou uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) para criminalizar posse e porte de qualquer droga e anunciou uma ressalva para o uso de substâncias com finalidade medicinal.
Além disso, em julho passado a Anvisa emitiu nota proibindo a importação de flores de cânabis para fins terapêuticos, o que gerou corre-corre entre usuários da planta vaporizada.
Entre avanços e retrocessos, empresários do setor avaliaram que o mercado de cânabis no Brasil precisa de mais e melhores regulações para que o país não fique para trás num mercado em expansão pelo mundo. Hoje, o uso medicinal da Cannabis é legal em quase 50 países, enquanto o uso adulto é legalizado e regulado no Canadá, Uruguai, Tailândia e em partes dos EUA.
“Acompanhamos das mudanças no Brasil porque a expectativa é de que a regulação, mais cedo ou mais tarde, acontecerá”, avalia Luiz Borsato, gerente de operações da Milgrows, loja de sementes de maconha, cuja atividade não é ainda regulamentada por aqui.
“O salvo-conduto para autocultivo é um privilégio de poucos, e não existe nenhuma regra para a aquisição de sementes no país”, afirma. “Eu venho do agronegócio e acho que todo o mercado de maconha é agro. Então, a regulação das sementes deveria ser feita, não pela Anvisa, que não tem competência para tratar do tema, mas pelo ministério da Agricultura.”
“O Brasil tem potencial enorme neste setor, como acontece com todo agronegócio. Só que os maiores produtores de sementes de cânabis do mundo estão aqui hoje, mas a Embrapa não está”, critica.
Com corredores lotados de investidores, pacientes, empresários, advogados, curiosos e ativistas pró-cânabis, a feira reuniu também a câmara de comércio de cânhamo industrial do Paraguai e aceleradoras de projetos ligados a maconha do Uruguaia.
O movimento entusiasmou Daiane Zappe, gerente de negócios da Revivid no Brasil, empresa que produz óleos de canabidiol (CBD).
“Estamos há dez anos aguardando a regulação e parece que o tempo não passa. Avançamos, mas ainda temos um longo caminho. E quem tem dor não tem tempo para esperar. Uma criança que convulsiona também não pode esperar”, afirma ela, com conhecimento de causa.
Zappe foi uma das primeiras brasileiras a conseguir autorização judicial, em 2014, para importar um medicamento feito com maconha para o filho que sofria com mais de cem convulsões por dia.
Para ela, a regulação da maconha medicinal anunciada pelo presidente do Senado pode ser um primeiro passo.
“Os debates médicos e científicos no Brasil estão muito avançados. Sabemos que as pessoas são a favor do uso terapêutico, mas não do uso adulto, e isso, a meu ver, é porque falta informação”, avalia. “O mercado brasileiro já está pronto para o uso terapêutico e industrial, só precisa de regulação. Ela precisa acontecer.”
Segundo a organização da ExpoCannabis Brasil, o valor de mercado da maconha pode atingir o total de R$ 26 bilhões no quarto ano após a regulamentação dos três usos da planta: medicinal, adulto e industrial. Deste total, R$ 8 bilhões poderiam ser recolhidos em impostos pelo governo.
Hoje, a Anvisa emite autorizações para a importação em caráter excepcional de produtos à base de cânabis para fins medicinais, e não há legislação nacional sobre o tema.
FERNANDA MENA / Folhapress