SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A mancha de poluição no rio Tietê cresceu 31% e chegou a 160 km de extensão. É o segundo ano consecutivo de aumento. De 2021 a 2022, a mancha passou de 85 km para 122 km. Em dois anos, portanto, ela quase dobrou de tamanho.
Na mancha poluída do Tietê, 127 km do rio têm qualidade ruim, e 33 km, péssima.
Ao mesmo tempo, a qualidade de água considerada como boa chegou a 119 km.
O dado, apresentado nesta terça-feira (19), é resultado do projeto de monitoramento Observando os Rios, organizado pela entidade SOS Mata Atlântica, com parceria, desde 2015, com a empresa Ypê.
O trabalho completa, em 2023, 30 anos de existência e conta com acompanhamento e coletas mensais feitos por voluntários. Ao todo, são 59 os pontos de coleta, dos quais 33 no próprio Tietê e o restante em outros rios que fazem parte de sua grande bacia.
Ao todo, o projeto monitora 576 km do Tietê, desde a nascente, em Salesópolis (SP), até Barra Bonita (SP), a jusante da eclusa. O Observando os Rios, além dos dados das coletas, baseia-se em análises de uma equipe técnica do SOS Mata Atlântica e em informações da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo).
A mancha de poluição, de forma geral, é traduzida como a extensão do rio sem oxigênio dissolvido na água. Nessas condições, a água não pode ser usada por humanos, mas há possibilidade de uso para navegação, por exemplo.
Segundo Gustavo Veronesi, coordenador do Observando os Rios, diferentemente de anos anteriores, desta vez as causas do aumento não são tão claras ou diretas.
Em outros momentos, era possível associar o crescimento da mancha, por exemplo, à abertura da barragem em Pirapora do Bom Jesus (SP), que consequentemente levava mais água contaminada ao restante do rio.
Veronesi aposta em poluição difusa como uma das possibilidades, além de fatores climáticos, como períodos grandes sem precipitação e, em seguida, chuvas torrenciais que acabam carregando poluição para os corpos d’água.
O déficit de saneamento, apesar de avanços recentes no estado de São Paulo, ainda é uma preocupação, diz o especialista.
“Eu repito como um mantra: é um descuido e polui muito rápido. Despoluir é muito demorado. É muito demorado a gente reparar uma melhora significativa no rio, mas é muito rápido reparar uma piora. Então o saneamento tem que ser um processo”, afirma Veronesi. “É preciso uma integração de áreas para que possamos de fato melhorar..”
O mantra ressoa em pontos de coleta que antes eram considerados exemplos concretos de melhoria na qualidade da água, como o lago do parque Ibirapuera, na cidade de São Paulo, alimentado pelo córrego do Sapateiro, parte da bacia do Pinheiros. De qualidade boa anteriormente, ambos voltaram para o nível regular, sem explicação direta.
De nome sugestivo, o riacho Água Podre, no Butantã, em São Paulo, é mais um exemplo negativo: saiu do regular para o ruim.
Durante o evento de lançamento dos dados, em São Paulo, Andrea Ferreira, responsável na Sabesp pelo Projeto Tietê, também apontou a poluição difusa e o regime de chuvas como potenciais explicações para a mancha. “E a gente tem essa curva também de crescimento de ocupação irregular”, completou Ferreira.
A representante da Sabesp, em seguida, apresentou os esforços que têm sido feitos para ampliação da coleta de esgoto e, consequentemente, a diminuição do descarte direto no rio e em afluentes. Segundo ela, que há décadas trabalha na despoluição do Tietê, trata-se de um projeto de Estado, indo além de planejamentos ou mudanças de governo.
“O projeto vira uma causa para quem está trabalhando. E quando o Gustavo [Veronesi, da SOS Mata Atlântica] falou comigo que a mancha aumentou, você não imagina o sentimento. ‘Poxa a gente trabalhou e trabalha tanto e a mancha aumentou'”, contou Ferreira.
A especialista da Sabesp também comentou sobre o aprendizado que tiveram com a bacia do rio Pinheiros -falando especificamente sobre o projeto Novo Pinheiros, sobre pagamento por resultado e por conexões de esgoto feitas, e da vertente socioambiental da iniciativa- e como isso pode ajudar nos esforços do Tietê.
Veronesi também destaca a importância da continuidade das obras de saneamento e cita um lado “copo cheio” do resultado: ao mesmo tempo em que houve aumento da mancha, houve também aumento dos trechos com água boa.
“Apesar de todo o esforço ainda precisamos avançar”, afirma Veronesi, também citando a possibilidade de uso da metodologia adotada no Pinheiros. “É uma demanda da sociedade, que começou com 1,2 milhão de assinaturas pela despoluição do Tietê [entregues, no início da década de 1990 para o então governador Luiz Antônio Fleury Filho].”
Neste ano, a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciou que seriam investidos R$ 5,6 bilhões até 2026 para dar continuidade à limpeza do rio. O Projeto Tietê, da Sabesp, começou em 1992.
A reportagem procurou a Cetesb para comentar os resultados. Em resposta, a Semil (Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística) reafirmou o trabalho que vem fazendo para reduzir a mancha de poluição no rio.
A Semil citou o processo de ampliação, em 1,5 milhão, dos domicílios com coleta e tratamento de esgoto pela Sabesp até 2026, na região do Alto Tietê, retirada de sedimentos e o monitoramento trimestral da qualidade de água.
A secretaria cita ainda o lançamento de um site (IntegraTietê) nesta sexta-feira (22) -o Dia do Tietê-, no qual será possível acompanhar os dados de monitoramento do rio. Segundo a nota enviada à reportagem, o monitoramento será baseado em 12 pontos de medição, com plano para expansão para 30 no ano que vem.
PHILLIPPE WATANABE / Folhapress