Diagnóstico e tratamento de TDAH são falhos para pessoas acima de 50 anos, mostra estudo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Adultos com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, o TDAH, encontram dificuldades para receber um diagnóstico adequado e, também, acompanhamento e tratamento. A conclusão é de um novo estudo publicado nesta quarta-feira (20).

Por ser uma condição com uma prevalência maior em crianças e adolescentes (cerca de 5%, contra 2,5% em adultos), muitos pacientes mais velhos que procuram atendimento com sintomas típicos de TDAH acabam recebendo diagnóstico para outras condições mentais, como estresse, ansiedade e depressão, ou não recebem diagnóstico nenhum.

Há, ainda, falta de informações sobre os efeitos combinados de medicamentos utilizados normalmente para o tratamento de TDAH, como os psicoestimulantes (conhecidos pelos nomes comerciais Ritalina e Venvanse), e outros remédios usados para doenças crônicas, como diabetes e hipertensão, comuns em adultos mais velhos.

O estudo foi conduzido pelos pesquisadores Maja Dobrosavljevic e Henrik Larsson, da Faculdade de Medicina e Saúde da Universidade Orebro, em Orebro (Suécia), e do Instituto Karolinska, em Estocolmo, e Samuele Cortese, do departamento de Psiquiatria Adolescente e Infantil da Universidade de Southampton, no Reino Unido. O artigo foi publicado na revista especializada Expert Review of Neurotherapeutics.

Para avaliar quais seriam as diretrizes terapêuticas em adultos mais velhos com TDAH, os cientistas buscaram mais de cem artigos publicados na base de periódicos médicos PubMed que continham os termos “transtorno de déficit de atenção/hiperatividade” e “adultos mais velhos” desde a origem da base de dados até 1º de maio de 2023.

Depois, analisaram separadamente cada artigo encontrado em busca de dados sobre diagnóstico, prevalência, rastreamento populacional, eficácia e segurança de tratamentos para adultos mais velhos, de acordo com as diretrizes nacionais e internacionais para a condição. Encontraram 44 pesquisas com esse recorte específico de idade.

Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), da Associação Americana de Psiquiatria, e a classificação internacional de doenças (CID) da OMS (Organização Mundial da Saúde), o TDAH se classifica como um transtorno de neurodesenvolvimento, caracterizado pela manifestação persistente de desatenção e/ou hiperatividade, interferindo no funcionamento ou desenvolvimento, podendo haver o predomínio de impulsividade ou desatenção, com diferentes subtipos.

O diagnóstico em adultos é dado quando há pelo menos seis ou mais sinais ou sintomas de desatenção e/ou hiperatividade a partir dos 12 anos, ainda de acordo com a diretriz internacional. Os sintomas mais comuns são impulsividade, hiperatividade e dificuldade em focar ou dar atenção a uma atividade.

De acordo com a pesquisa sueca, a maioria dos pacientes com diagnóstico de TDAH durante a infância ou adolescência não são acompanhados até uma idade mais velha, o que pode prejudicar a detecção dos sintomas do transtorno em pessoas entre 50 e 55 anos.

Outros distúrbios mentais, como depressão, transtorno bipolar, transtorno dissociativo de identidade, declínio cognitivo moderado, sintomas associados à menopausa em mulheres e distúrbios do sono, têm manifestações clínicas similares ao TDAH, e podem prejudicar o diagnóstico correto.

“Nosso estudo conclui que são necessárias abordagens melhores para o rastreio e diagnóstico de TDAH em pessoas com 50 a 55 anos”, afirma a pesquisadora Maja Dobrosavljevic, primeira autora do estudo. “Conforme adquirimos conhecimento dos desafios enfrentados por adultos mais velhos vivendo com TDAH, uma abordagem adaptada e mais compreensiva é crucial para o bem-estar dos pacientes.”

Mais preocupante ainda foi o dado encontrado de que apenas 0,9% dos indivíduos com 50 anos ou mais com diagnóstico de TDAH são tratados adequadamente para o transtorno, menos da metade do total de adultos com prevalência nessa faixa etária (0,23%).

Além disso, o uso prolongado de terapias, que não envolvem apenas os medicamentos psicoestimulantes, mas também psicoterapia e atividades psicoeducativas podem afetar a manifestação dos sintomas ao longo do tempo.

“Os dados da nossa pesquisa mostram como nenhum estudo até o momento acompanhou indivíduos mais velhos por um período de tempo prolongado. As pesquisas focaram, por outro lado, avaliações chamadas de retrospectivas de acordo com as manifestações do transtorno na fase infantil, e isso pode ser afetado até mesmo pelo esquecimento dos sinais manifestados quando criança”, explica Larsson, do Instituto Karolinska.

Os cientistas concluem com um apelo para que mais estudos clínicos, randomizados, controlados por placebo sejam feitos incluindo também pessoas com 50 anos ou mais com TDAH, até mesmo para avaliar possíveis riscos cardiovasculares nessa faixa etária pelo uso prolongado de medicamentos.

Nos últimos anos, cresceu o número de adultos jovens que fazem uso de medicamentos estimulantes para TDAH, não necessariamente apresentando diagnóstico do transtorno. A busca por uma alta performance no trabalho e conseguir focar diversas atividades ao mesmo tempo é uma das explicações para o crescimento de vendas desses medicamentos.

Paralelamente, tem aumentado também os novos diagnósticos em pessoas de 30 a 40 anos, especialmente mulheres, do transtorno. De acordo com o CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças) americano, na infância é maior a prevalência de TDAH em meninos do que meninas, mas cada vez mais mulheres jovens têm apresentado o diagnóstico já na fase adulta, muitas vezes por uma manifestação atípica do sintoma de desatenção nelas.

Embora esses novos diagnósticos estejam crescendo, não há necessariamente um aumento na prevalência geral da doença na fase adulta, explica Mario Louzã, coordenador do Ambulatório de TDAH Adultos do IPq (Instituto de Psiquiatria) da USP. “O que tem crescido, na verdade, é que se tornou uma doença mais perceptível.”

Louzã e colegas do HC (Hospital das Clínicas) da USP fizeram um estudo com pessoas com mais de 65 anos com TDAH e viram que os sintomas relatados por esses pacientes eram os mesmos dos jovens. “Basicamente, as queixas de pessoas da terceira idade eram similares às dos adultos jovens, mas como muitos já têm uma menor pressão, menos demandas de trabalho, sentem menos os efeitos”, explica.

De acordo com ele, o maior conhecimento sobre o transtorno neurobiológico e a conscientização sobre a saúde mental também contribuem para o aumento dos diagnósticos. “As pessoas estão buscando mais informação, procurando entender os sintomas, e por isso mais conscientes de que aquilo que sentiam pode ser uma condição mental.”

ANA BOTTALLO / Folhapress

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