Moraes rebate Gleisi e critica ‘agressões infundadas’ contra Justiça Eleitoral

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Alexandre de Moraes, rebateu nesta quinta (21) as críticas da presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann, à Justiça Eleitoral.

Em nota oficial, o magistrado afirmou, sem citar diretamente o nome da parlamentar, que as manifestações são “errôneas e falsas” e que a Justiça Eleitoral continuará a “combater aqueles que são contrários aos ideais constitucionais” e as “forças que não acreditam no Estado democrático de Direito”.

Gleisi havia criticado a atuação do TSE (veja vídeo) em sessão de votação da PEC da Anistia nesta quarta-feira (20), afirmando que o tribunal tem aplicado multas inexequíveis aos partidos, ameaçando a democracia, e chegou a classificar como “absurda” a existência de cortes especializadas em eleições.

“Lamentavelmente, a própria existência da Justiça Eleitoral foi contestada por presidente de partido político, fruto do total desconhecimento sobre sua importância, estrutura, organização e funcionamento”, escreveu Moraes na nota desta quinta-feira.

O ministro disse que o TSE “repudia afirmações errôneas e falsas realizadas no intuito de tentar impedir ou diminuir o necessário controle dos gastos de recursos públicos realizados pelos partidos políticos, em especial aqueles constitucional e legalmente destinados às candidaturas de mulheres e negros”.

Moraes teve uma atuação dura nas eleições do ano passado contra os ataques de Jair Bolsonaro (PL) às urnas eletrônicas e ao sistema eleitoral. Por isso, teve o desempenho exaltado, inclusive, pelo atual presidente Lula (PT).

Agora, no entanto, entrou em embate com a aliada do chefe do Executivo.

“A vocação pela democracia e a coragem de combater aqueles que são contrários aos ideais constitucionais e aos valores republicanos de respeito à vontade popular permanecem nesses 91 anos de existência da Justiça Eleitoral, como demonstrado nas eleições de 2022”, escreveu.

E prosseguiu: “Somos a única democracia do mundo que apura e divulga os resultados eleitorais no mesmo dia, com agilidade, segurança, competência e transparência. Isso é motivo de orgulho nacional e não para agressões infundadas”.

A Câmara dos Deputados está para votar uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que promove a maior anistia da história a partidos políticos, em especial aqueles que descumpriram o repasse mínimo de verbas para mulheres e negros.

Apesar de pedir alterações no relatório do deputado Antonio Carlos Rodrigues (PL-SP), Gleisi se uniu durante a sessão a uma tese defendida por bolsonaristas, a de colocar um fim na Justiça Eleitoral.

“Um dos únicos lugares que tem Justiça Eleitoral no mundo é no Brasil. O que já é um absurdo. E custa três vezes o que custa o financiamento de campanha para a disputa eleitoral. Tem alguma coisa errada nisso, talvez a gente devesse começar aí para ver o que a gente pode mudar”, disse a petista durante a sessão.

Assista à fala da deputada:

O orçamento da Justiça Eleitoral aprovado para 2023 foi de R$ 10,7 bilhões. O dinheiro do fundo partidário destinado às legendas é de pouco mais de R$ 1 bilhão. Essa verba aos partidos, porém, é turbinada a cada dois anos pelo fundo eleitoral, que em 2022 distribuiu R$ 5 bilhões.

“A Justiça Eleitoral não tem como única função a fiscalização da utilização de dinheiro público pelos partidos políticos, competindo-lhe, principalmente, o cadastramento –inclusive biométrico– e constantes atualizações de nossos 156 milhões eleitoras e eleitores, a organização e realização das eleições e o

processo e julgamento de todas as causas eleitorais”, disse ainda o presidente do TSE.

Antes da manifestação do presidente da corte, Gleisi havia postado nesta quinta, em suas redes sociais, nova manifestação em que reiterava o que havia dito na véspera.

“Por mais relevante que seja o papel da Justiça Eleitoral, seu funcionamento está sujeito ao escrutínio da sociedade”, disse em sua postagem. “A estrutura que fiscaliza os partidos custa nove vezes mais do que os fundos fiscalizados. Será por isso que aplicam multas tão extravagantes?”, acrescentou a petista, que repudiou o que classificou como tentativa de igualá-la “aos que atacam a democracia e têm medo de eleições”.

Integrantes do PL de Bolsonaro já cogitaram apresentar uma PEC extinguindo a Justiça Eleitoral. Nesta quinta, o deputado Filipe Barros (PL-PR) disse que a proposta está pronta desde o ano passado, mas que decidiu não protocolá-la por temor de que isso parecesse uma ameaça ao TSE.

“Acho que isso é um debate técnico que tem que avançar. Eu sou 100% favorável à extinção das justiças especializadas, como a Justiça Eleitoral e a Justiça do Trabalho, e a transformação de tudo em Justiça Federal. Isso é um debate que tem que ser feito em algum momento.”

A deputada Bia Kicis (PL-DF) afirmou, por meio de sua assessoria, que a Justiça Eleitoral concentra diversas funções e exerce o papel de executor, fiscalizador e julgador das eleições.

“Não há paralelo nas democracias ocidentais. Isso suscita o debate político próprio do Parlamento. É preciso procurar evoluir para um sistema mais democrático onde não haja o excesso de concentração de atribuições no mesmo Poder.”

Especialistas ouvidos pela reportagem defenderam a existência e atuação da Justiça Eleitoral.

“O modelo brasileiro é efetivamente singular na perspectiva comparada, mas é possível dizer que se trata de uma inovação em geral bem-sucedida”, diz Marcelo Issa, diretor-executivo do movimento Transparência Partidária.

De acordo com ele, o modelo brasileiro tem produzido mais vantagens que prejuízos, dando encaminhamento satisfatório a desafios que fragilizam o processo eleitoral e produzem situações de insegurança e conflito mesmo em países mais desenvolvidos.

“A Justiça Eleitoral desempenha um papel fundamental na preservação da democracia brasileira. A sua defesa não pode ser restrita aos momentos de risco à democracia ou quando ela pune adversários políticos. Os partidos são realmente essenciais para o funcionamentos do sistema político, mas precisam ser responsabilizados quando cometem irregularidades”, afirma Guilherme France, da Transparência Internacional.

MATHEUS TEIXEIRA, RANIER BRAGON E JOÃO GABRIEL / Folhapress

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